Visão do direito

O caos na prestação de serviços públicos e a inércia da administração

Via de regra, os contratos administrativos de concessão, geralmente extensos e complexos, são mais confusos do que claros

08/08/2013. Crédito: Janine Moraes/CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Luis Carlos Alcoforado, durante lançamento do livro Comentários ao Código Civil. -  (crédito: Janine Moraes/CB/D.A Press)
08/08/2013. Crédito: Janine Moraes/CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Luis Carlos Alcoforado, durante lançamento do livro Comentários ao Código Civil. - (crédito: Janine Moraes/CB/D.A Press)

Por Luis Carlos Alcoforado* — O estrangulamento da capacidade de investimento e o esgotamento do modelo estatal foram cruciais para a desestatização, privatização e concessão dos serviços públicos, então precariamente prestados, até mesmo pela falta de universalidade.

A opção foi correta, mas errada a construção do modelo. A lei de concessão e permissão dos serviços prestados públicos, tecnicamente, se reputa boa. Censurável é a cultura que permeia a Administração no sentido de agir com leniência no fazimento, execução e finalização dos contratos de concessão.

Tudo começa com a modelagem da licitação para a concessão dos serviços ao particular, a qual já nasce, não raro, com o vício da imparcialidade, pelo direcionamento do certame.

Os problemas avultam, mesmo, durante a execução do contrato de concessão do serviço público, por força das balizas legais e do relaxamento no que diz respeito à fiscalização quanto à correta implementação dos direitos e obrigações que tocam às partes.

Via de regra, os contratos administrativos de concessão, geralmente extensos e complexos, são mais confusos do que claros. Quase sempre exigem exegética refinada, para compreensão das cláusulas, sem que se assemelhem aos contratos americanos, repetitivos, mas, objetivamente, indubitáveis.

À falta de clareza de algumas regras, regurgitam conflitos entre o poder concedente e o concessionário.

Há um espírito de legislador na elaboração dos contratos, com muitas inovações de regras de difícil compreensão, porque são muito técnicas e pouco jurídicas.

E há quem tenha jactância no prolixo. A questão crucial, contudo, repousa na constatação ou conclusão segundo a qual o concessionário descumpre regras contratuais e dispositivos legais, sem a correta e devida intervenção da Administração, muito solícita e flácida na tomada de decisões e providências quanto à má prestação dos serviços, objeto do contrato de concessão.

Tomem-se emprestados os casos de prestação de serviços públicos concedidos nas áreas de fornecimento de energia elétrica e telefonia, focos principais dos queixumes e insatisfações dos usuários brasileiros.

Certamente, todos usuários dos serviços de telefonia e energia já sentiram a ausência de serviço adequado, como sendo aquele que satisfaz as condições de: a) regularidade; b) continuidade; c) eficiência; d) segurança; e) atualidade; f) generalidade; g) cortesia na sua prestação; e h) modicidade tarifária.

As agências reguladoras estão abarrotadas de reclamações dos utentes dos serviços públicos, sem que tenham agido com firmeza, sob o figurino da lei e do contrato. O caos se transformou numa redundância, haja vista que a qualidade dos serviços piora, malgrado a alegação de que as empresas concessionárias investem recursos necessários na execução do contrato.

Sofre o usuário, sem que constate que suas reclamações são atendidas, como se fosse indiferente ao sistema, cuja construção se fez para proteger o consumidor dos abusos das concessionárias e, também, da Administração, conivente com a falta de serviço público adequado.

Importa lembrar, ainda, que, quando demandadas, judicial ou extrajudicialmente, as concessionárias nunca reconhecem a falta de serviços públicos adequados e, também, lutam para negar os danos experimentados pelo consumidor, largado. Compete às agências atitude mais firme na defesa dos usuários nas hipóteses em que se verificar a inadequação da prestação dos serviços, com objetivo de: a) fiscalizar, tecnicamente, e zelar por sua qualidade; b) aplicar as penalidades devidas, previstas em lei e no contrato; c) intervir na prestação dos serviços; d) extinguir a concessão; e e) exigir o cumprimento das normas pertinentes.

Se a tolerância administrativa mudasse de nível, com mais rigor, em face às irregularidades cometidas, as concessionárias haveriam de ser mais tementes e responsáveis, com mais eficiência e respeito ao usuário.

*Luis é advogado 

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postado em 01/08/2024 04:00
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