Segurança Pública

PL Antifacção: siga o dinheiro e endureça o cerco ao crime organizado

Projeto antifacção do governo Lula propõe confisco antecipado de bens e endurecimento das penas para sufocar o financiamento do crime organizado, enquanto oposição tenta enquadrar facções como organizações terroristas.

Imagine que um criminoso integrante de uma máfia de desvios tira do Estado bilhões que são integrados ao seu patrimônio pessoal — como imóveis, carros, lanchas, joias — adquiridos com o dinheiro que pertence aos cofres públicos. Esse criminoso morre e nunca será julgado. É extinta a sua punibilidade por motivos óbvios: ele não está mais aqui para responder pelos desvios. O que aconteceria hoje com o fruto desse esquema? Passaria como herança para os herdeiros do bandido. O Estado talvez nunca mais veria a cor do dinheiro.

Esse é um exemplo que ilustra, segundo o secretário nacional de Segurança Pública, Mario Luiz Sarrubbo, a dificuldade existente hoje para reaver o patrimônio que traficantes e outros tipos de bandidos acumulam com suas empreitadas no mundo do crime. Há casos de apreensão de bens que precisam ser devolvidos por questões processuais. A ação que originou o bloqueio do patrimônio é julgada nula e todos os bens, muitas vezes evidentes sinais de enriquecimento ilícito, são mantidos sob o poder do criminoso, que ainda sai impune.

É de olho nessa questão que o projeto de lei antifacção criminosa, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, trata da descapitalização das facções criminosas e do asfixiamento das fontes de financiamento desses grupos criminosos. O texto facilita o confisco dos bens e o bloqueio de recursos. O Estado poderá tomar esses bens, antes da condenação e conclusão do processo judicial, se o suspeito não conseguir comprovar a origem lícita. Caberá, assim, ao criminoso provar o lastro e não o contrário.

O juiz também passará a ter a prerrogativa de afastar gestores e nomear interventores em empresas usadas por facções para lavar dinheiro ou suspender imediatamente contratos com o Poder Público caso haja suspeitas de vinculações com negócios ilícitos. Sufocar as fontes de financiamento das facções criminosas é considerado estratégico pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Mas não é só isso. O projeto enviado ao Congresso atualiza a Lei de Organizações Criminosas (Lei nº 12.850/2013), com medidas que se tornaram urgentes e emergenciais para combater a criminalidade organizada. O texto cria a figura da "facção criminosa" — que ainda não existe na legislação brasileira. As penas serão de 8 a 15 anos de prisão se a atuação da organização buscar o controle de territórios ou atividades econômicas, com o uso de violência, coação ou ameaça. Homicídios cometidos por ordem ou em benefício de facções criminosas poderão levar a penas de 12 a 30 anos, passando a ser enquadrados como crimes hediondos.

Enquanto o governo defende a aprovação do projeto antifacção, assinado pelo presidente Lula, a oposição trabalha para pegar uma carona e converter também em lei o projeto de lei antiterrorismo, de autoria do deputado federal Danilo Forte (União-CE). Neste caso, o objetivo é enquadrar facções como Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV) como organizações terroristas, na lógica da equipe de segurança pública do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), que classificou os traficantes dos complexos do Alemão e da Penha, atingidos pela Operação Contenção, como "narcoterroristas". 

O governo Lula tenta barrar o projeto. "Somos contra esse projeto que equipara as facções criminosas ao terrorismo. Terrorismo tem objetivo político e ideológico, e o terrorismo, pela legislação internacional, dá guarida para que outros países possam fazer intervenção no nosso país", afirmou ontem a ministra Gleisi Hoffmann (PT-PR), de Relações Institucionais, em conversa com jornalistas. O receio do governo é um atentado contra a soberania nacional, uma vez que legislações de países como Estados Unidos estabelecem sanções e intervenções contra terroristas mesmo em territórios estrangeiros.

Autor do projeto, Danilo Forte rebate: "A lei precisa garantir que a polícia prenda e a Justiça não solte. O que estamos propondo é uma tipificação que permita ao Estado agir com o mesmo rigor que outros países utilizam contra o terrorismo".

Principais medidas do Projeto Antifacções Criminosas:

Tipificação do crime de "organização criminosa qualificada": para grupos que exercem domínio territorial ou controle de atividades econômicas, com penas que podem chegar a 30 anos. O aumento das punições também se aplica a casos que envolvem crianças, funcionários públicos, uso de armas ou explosivos.

Criação de mecanismos que aceleram e facilitam o bloqueio de contas e confisco de bens, além de permitir a intervenção judicial em empresas usadas para crimes.

Possibilidade de infiltração de policiais e colaboradores, e a criação de empresas fictícias para desarticular esquemas de lavagem de dinheiro.

Autorização de monitoramento de encontros entre presos e visitantes com captação de áudio e vídeo, desde que haja autorização judicial, e transferência de presos entre presídios sem ordem judicial.

Afastamento imediato, por decisão judicial, de agentes e servidores públicos suspeitos de envolvimento com facções criminosas.

Criação de Banco Nacional de Organizações Criminosas: para reunir e trocar informações de investigação entre estados e agências.

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