Cinema

Filme 'Tenet', de Christopher Nolan, chega aos cinemas; confira crítica

Arena de pretensão e pomposidade, 'Tenet' perde o foco ao pouco investir nas cenas de experiência presente

Ricardo Daehn
postado em 29/10/2020 06:02
 (crédito: Warner/Divulgação)
(crédito: Warner/Divulgação)

Num filme do cineasta Christopher Nolan, não há meio-termo: é pegar ou largar. Tenet dispõe no palco de encenação a habilidade do diretor de complicar o trivial, de constituir cenas grandiosas, e de, subitamente, desalinhar tudo, perdendo o foco e o interesse. Tenet é daqueles filmes em que o espectador se debaterá, dada a supressão de lógica: um homem chamado Protagonista (John David Washington) se vê largado numa conjuntura que pode desencadear a Terceira Guerra e, tendo por artefato a intuição, vai se defendendo, e tentando salvar o mundo de explosão nuclear. Quem pode engatilhar a explosão é o russo Andrei Sator (Kenneth Branagh, que parece repetir o personagem de Operação Sombra: Jack Ryan).

As operações de espionagem em que Protagonista se vê ilhado são sabotadas por mentiras e pela imersão num conceito de inversão, que tensiona encadeamentos do passado e do futuro. Nolan deposita fichas no que o cinema tem de mágico: a manipulação do tempo; mas reveste a trama com teoria que reverbera tese hamletiana à la "o ovo ou a galinha". Ouvisse ele conselho do Chacrinha, não viria a se estrumbicar. Na moldura sonora, do espetaculoso Tenet está a trilha estilosa do sueco Ludwig Göransson, um estridente pupilo do compositor Hans Zimmer (colaborador habitual de Nolan).

 

Cena do filme 'Tenet', com John David Washington
Cena do filme 'Tenet', com John David Washington (foto: Warner Bros. Pictures/Divulgação)

 

Dono de respeitável filmografia, que inclui Interestellar e A origem, o britânico Christopher Nolan traz consigo a capacidade de impressionar, mesmo em fitas de escolhas duvidosas como Dunkirk (2017). Civilidade e agressão se contrapõem em Tenet. Na fricção, resultam grandiosas sequências, como a do bungee jumping (quando é firmada a parceria do herói com o personagem de Robert Pattinson) ou ainda a do rastro de barras de ouro deixado por um inesperado ataque a avião.

Arena de pretensão e pomposidade, Tenet perde o foco ao pouco investir nas cenas de experiência presente. O pesquisador da bomba atômica Robert Openhheimer pode até ser citado, junto a conceitos de entropia, mas a base do filme parece residir na falta de linearidade da trama (à la videoclipe, mancomunada à linguagem dos jogos virtuais da atualidade). Junto com o mix, ainda se observam obsessões do diretor com a franquia Batman que ele conduziu. Há muito envolvimento com máscaras, pesa o descontrole advindo da atmosfera fascista e a "vida na escuridão" (espécie de senha entre os atores dos campos de batalha encenados em Tenet). Há, tem até citação de lockdown.

Finalmente, vale ressaltar a trajetória de mulheres fortes na trama, entre as quais a outrora fragilizada Kat (Elizabeth Debicki, deslumbrante) e Priya (Dimple Kapadia), uma indiana de pulso. Entre muitas circunstâncias tateadas pelo espectador há a oportuna cena do terrorismo (num teatro que parece plasmar eventos reais ocorridos em Moscou, em 2002) em que, num concerto, metralhadoras vencem instrumentos musicais. Não é casual que a arte seja quase invalidada pela tirania; sob prisma brazuca.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação