Cena contemporânea

Grupo mexicano pensa o fazer teatral em trabalho exibido no Cena Contemporânea

'Cada vez que alguém diz isso não é teatro se apaga uma estrela', do grupo mexicano Lagartijas tiradas al Sol, encerra as atividades do primeiro módulo do Cena Contemporânea 2020

Roberta Pinheiro
postado em 11/12/2020 15:43 / atualizado em 11/12/2020 17:07
O trabalho, com duração de 15 minutos, reúne imagens e sons de aeronaves chegando e partindo de um aeroporto, com texto e narração de Gabino -  (crédito: Lázaro Gabino Rodríguez/Divulgação)
O trabalho, com duração de 15 minutos, reúne imagens e sons de aeronaves chegando e partindo de um aeroporto, com texto e narração de Gabino - (crédito: Lázaro Gabino Rodríguez/Divulgação)

"O teatro nos recorda o mais simples: uma vida é uma vida", escreve o ator mexicano Lázaro Gabino, um dos criadores do coletivo Lagartijas tiradas al Sol. De volta à programação da 21ª edição do Festival Internacional de Teatro de Brasília, o grupo apresenta o espetáculo Cada vez que alguém diz isso não é teatro se apaga uma estrela. A produção, feita especialmente para a etapa on-line do evento, reflete sobre a pandemia do novo coronavírus vista pelo teatro e do teatro repensado pela pandemia.

O trabalho, com duração de 15 minutos, reúne imagens e sons de aeronaves chegando e partindo de um aeroporto, com texto e narração de Gabino. Cada vez que alguém diz isso não é teatro se apaga uma estrela foi responsável por abrir a programação do Cena Contemporânea 2020 e agora também encerra as atividades do primeiro módulo do festival, com exibição nesta sexta-feira (11/12), às 21h30 no canal do Youtube do evento.

"Este projeto não é um espetáculo teatral, mas um espaço para pensar sobre o que fazemos", descreve Gabino em entrevista ao Correio. O trabalho revela que, durante o confinamento, o teatro se mostrou um lugar de reflexão sobre a pandemia, bem como o contexto produziu condições para se pensar o teatro. Entre o ir e vir de aeronaves, o grupo mexicano repensa os limites e o legado do fazer teatral. "O confinamento derivado da pandemia da covid-19 trouxe uma visão necessária e quase inevitável do que fazemos. Todos os teatros do mundo estavam fechados então não podíamos fazer teatro, mas podíamos pensar o teatro", acrescenta o ator.

Romper fronteiras

Cada vez que alguém diz isso não é teatro se apaga uma estrela traz a assinatura da companhia mexicana fundada em 2003 por Gabino e Luisa Pardo. Com o objetivo de desenvolver projetos que procuram vincular o trabalho e a vida e romper fronteiras, o grupo apresenta trabalhos questionadores e reflexivos sobre o presente, o passado e o futuro. Conscientes do papel do teatro, o coletivo, encabeçado por Gabino e Luisa, encara o fazer teatral como um estar no mundo e isso influencia em cada projeto, como o apresentado no Cena Contemporânea. "Nosso trabalho busca dar sentido, articular, deslocar e desvendar o que a prática cotidiana funde e esquece. Não tem nada a ver com entretenimento, é um espaço para pensar", definem no site da companhia.

Festival 

Com trabalhos que levam a assinatura da globalização e do diálogo entre as linguagens artísticas, o Cena explora outros formatos e homenageia a própria história nesta 21ª edição. Afinal, este ano são comemorados 25 anos desde a criação do festival a partir do Núcleo de Arte e Cultura (NAC), com a proposta de consolidar um processo de intercâmbio, possibilitando que Brasília entrasse em um circuito de espetáculos inovadores e de vanguarda.

Ao todo, são mais de 20 apresentações de obras híbridas e transmídias com exibição gratuita, em horários diversos, no site do festival e no canal do YouTube do Cena Contemporânea. Além disso, cada espetáculo pode ser visto por mais três dias depois da estreia, em qualquer horário, no canal Youtube do festival – com algumas exceções que são indicadas no site. A programação conta com projetos de diferentes estados brasileiros, como Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte, propostas de artistas e grupos do Distrito Federal, e obras internacionais da França, Espanha, Inglaterra, México, Estados Unidos, Moçambique e Alemanha.

Três perguntas para Lázaro Gabino

Como espaço para pensar, o que querem provocar com Cada vez que alguém diz isso não é teatro se apaga uma estrela?

O teatro é, tem sido e continuará sendo coisas distintas, em quase todas as sociedades o teatro tem um aspecto conservador. É uma arte que se ensina de geração em geração à qual, ao contrário do cinema e da literatura, não podemos ter acesso a obras de outros tempos, só podemos vivenciar o teatro do presente. Podemos ler textos do passado, mas isso não é o teatro. Esse lado conservador que o teatro costuma ter como disciplina é algo que deve ser combatido e é algo que deve ser assinalado nos momentos de crise do teatro e esse é um dos momentos críticos do teatro.

A pandemia voltou os olhos para a cultura como “válvula de escape", ao mesmo tempo que levou os criadores a se reinventarem e afastou o público do palco. Como você vê a relação entre a pandemia e a cultura?

A cultura é uma necessidade das pessoas: precisamos fazer coisas e ver o que outras pessoas fazem para sentir e pensar o mundo. Isso nunca irá embora. O que está em crise desde a pandemia é a institucionalização da cultura, a forma como as sociedades criaram diferentes modelos de gestão cultural. Isso vai mudar e depende de nós até onde se dará essa mudança: há governos que veem a pandemia como uma oportunidade de parar de investir dinheiro público em cultura, enquanto as iniciativas privadas não são mais lucrativas. Esta crise é um momento maravilhoso para nos perguntarmos que tipo de gestão cultural queremos.

Para a companhia, o que significa participar da 21ª edição do Cena?

Um grande prazer. É um festival que amamos muito e que vimos passar de uma situação de bonança a condições muito difíceis, como resultado das políticas governamentais. Estamos orgulhosos de participar deste festival, que é em si mesmo um ato de resistência.

 

Serviço

21ª edição Cena Contemporânea - Festival Internacional de Teatro de Brasília (módulo on-line)
Até 11 de dezembro. No www.cenacontemporanea.com.br e canal do YouTube do Cena.

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