ARTES CÊNICAS

Ator de múltiplos talentos, Sérgio Mamberti morre aos 82 anos

O intérprete do Dr. Victor, do Castelo Rá-Tim-Bum, e do mordomo Eugênio, em Vale-Tudo, morreu por falência múltipla de órgãos por uma infecção nos pulmões

Ricardo Daehn
postado em 04/09/2021 06:00
 (crédito: Raphael Dias/TV Globo)
(crédito: Raphael Dias/TV Globo)

A expressão diversa do currículo de Sérgio Mamberti, artista de tevê, teatro e cinema, dono de enorme engajamento cultural e político, revela a perda do Brasil, com a morte dele, aos 82 anos, na madrugada de ontem. Internado desde sábado, em hospital paulistano, Mamberti morreu por falência múltipla de órgãos, depois de comprometidas as funções renais e de apresentar infecção nos pulmões. Num país sob a direção do ex-presidente Lula, Sérgio, fundamentalmente um homem do teatro, galgou posições como secretário de música e artes cênicas, secretário da identidade e da diversidade cultural e presidente de Funarte, além de fomentador constante de políticas culturais. Depois de velado no Teatro Anchieta, Mamberti foi enterrado no Cemitério da Consolação, em que compareceram os filhos Carlos, Fabrício e Duda Mamberti.

Pelo grande público, ligado à memória da televisão, o ex-integrante do Grupo Decisão, nunca será esquecido por personagens carismáticos como o Dr. Victor, do premiado seriado infantil Castelo Rá-Tim-Bum, em meados dos anos 1990, ou mesmo como o mordomo cinéfilo Eugênio, visto em Vale tudo (1988). Além de destacado na novela de Gilberto Braga Brilhante (1981), mais recentemente, Sérgio Mamberti integrou os elencos de Flor do Caribe (na pele de um vilão) e Sol nascente (2016). Em streaming, viveu personagem da série 3%. Na carreira, também pesou uma passagem pela extinta TV Manchete, em que integrou elenco de produções de época, como Helena e Dona Beija, além da popular A história de Ana Raio e Zé Trovão. Ainda inédito, o longa O pastor e o guerrilheiro, filmado na capital, promete trazer performance de Sérgio Mamberti.

Irretocável

Num papel feito em Bodas de papel, longa-metragem de 2008, Mamberti impressionou o diretor e ex-secretário da Cultura de São Paulo André Sturm. “Convivi bastante com o Sérgio, tanto nas lutas da Cultura, de demandas, quanto no meu filme. A protagonista, na infância, tinha cenas de forte relação com o avô. Nas filmagens, ele estava sempre de bom humor, sorridente e carinhoso com as pessoas. Era de uma energia maravilhosa”, destaca Sturm. O papel, ainda que pequeno, cativou e trouxe reviravolta. “Foi tão impactante, que, na edição, optei por encerrar o filme com a cena do Sérgio, de tão maravilhosa e potente. Dele, guardo as melhores lembranças, uma pessoa positiva, dedicada à cultura e sempre generoso. Um artista extraordinário”, pontuou o diretor.

Nascido em Santos, foi nos anos de 1960 que Sérgio Mamberti se formou na EAD (Escola de Arte Dramática). Antes de abraçar ativamente um projeto nacional de cultura democrática para o país, se afirmou nos palcos em contribuições memoráveis junto a nomes como Bárbara Heliodora, Ruth Escobar e Antônio Abujamra (entre outras, foi dirigido por Abu, em Electra, de 1965). Nomes constantemente vistos como marginais, da estatura de Jean Genet e Plínio Marcos, nutriram as performances de Mamberti nos palcos. Com o irmão Claudio Mamberti, Sérgio propôs a reformatação do Teatro Vereda. Além de dirigir personalidades como Ítala Nandi e Raul Cortez, Mamberti fez história com obras de Molière (Tartufo, encenado ao lado de Paulo Autran) e Mauro Rasi (Pérola, um grande sucesso de público).

“Ele vivia de bom humor e fazia os amigos rirem, a cada cinco minutos. Tinha um coração e uma cabeça aberta, gostava de novidades, sempre atencioso com o que estava acontecendo no mundo”, conta o cineasta e ex-secretário do Audiovisual, Orlando Senna. Ele acredita que, de alguma forma imortal, como os artistas se apresentam, Sérgio fez e fará política e arte como se fosse a mesma coisa. “Era um militante tanto da política, no caso, do PT, como na sua arte de ator. Ele teve até uma candidatura forte ao posto de ministro da cultura. Agradeço muito, no início dos anos 1990, ele ter ido a Cuba, por insistência minha. Morava lá, e o recebi lá: mostrei Havana a ele, e o apresentei às pessoas de teatro”, recorda Orlando Senna.

Cinema

No cinema, pra além da diversão assegurada em filmes como O cavaleiro Didi e a princesa Lili (2006) e Xuxa abracadabra (2003), Mamberti teve uma produtividade crítica, junto a incursões no cinema de Sérgio Bianchi (em fitas como Jogo das decapitações, Romance e Maldita coincidência). Também progressistas foram as participações em produções como O corpo e O olho mágico do amor, dirigidos por José Antônio Garcia e estrelados por Carla Camurati. Na autobiografia Sérgio Mamberti: Senhor do meu tempo, o artista contou da relação amorosa de quase quatro décadas vivida com Ednardo Torquato.

“É duro resumir uma pessoa de ações tão múltiplas como o Mamberti em poucas frases. Mas, além de um ator muito especial e único, o Sérgio era um grande e equilibrado agregador na luta que a arte brasileira tem para ser reconhecida nesse país de memória tão curta. E, como se não bastasse isso, era santista”, observa o cineasta Guilherme de Almeida Prado, com filmografia imbricada na presença de Mamberti, à frente de filmes como A dama do Cine Shangai (1987) e Perfume de gardênia (1992). O politizado cinema de Lúcia Murat também contou com a participação de Mamberti, que já nos anos 60 brilhava em clássicos como O bandido da luz vermelha (de Rogério Sganzerla), e esteve nos longas Brava gente brasileira (2000) e Doces poderes (1997).

Pelas redes sociais

Marcelo Adnet
Vai fazer muita falta este grandissíssimo ator! Obrigado Sérgio Mamberti!

Ex-senador e vereador por São Paulo Eduardo Suplicy
Minha maior homenagem ao querido ator Sérgio Mamberti, que faleceu nesta madrugada, aos 82 anos, após longa internação no hospital. Meus sentimentos aos seus filhos Duda, Carlos, Fabrício, Daniele.

Corinthians
Fiel, hoje o Brasil se despede do ator Sérgio Mamberti, o querido dr Victor do Castelo Rá-Tim-Bum, aos 82 anos, após infecção pulmonar. Por todas as histórias que embalaram as infâncias, as TVs e os teatros deste país, nossa maior gratidão.

Elisa Lucinda
Meu querido Sérgio Mamberti partiu. Um ator, pensador genial. Ativista, criador, foi quem chamou de incendiária, lá no comecinho, minha poesia. E me abriu as portas do seu teatro em Sampa. Todo meu amor. Mamberti presente!

Leandra Leal
Que honra foi viver no mesmo tempo que Sérgio Mamberti! Ator apaixonado pela arte e que enxergava em seu ofício a potência de emocionar, instruir, conscientizar, politizar e encantar as pessoas. Seu legado será sempre um farol para os artistas brasileiros de todos os tempos.

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