
Lorde nunca foi só mais uma voz no pop — e em Virgin, lançado nesta sexta-feira (27), ela prova que maturidade e autenticidade ainda são armas potentes em meio à pasteurização da indústria. O novo álbum é um mergulho íntimo, visceral e muitas vezes desconfortável na trajetória da neozelandesa de 28 anos, que transforma confissões pessoais em arte de impacto.
Dez anos após o estouro com o anticapitalista “Royals”, que a lançou aos holofotes aos 16, Ella Yelich-O’Connor volta com o disco mais pessoal de sua carreira. E isso não é força de expressão: Virgin é quase uma autobiografia emocional com trilha sonora eletrônica, onde traumas, desejos e memórias ganham corpo — e batida.
A capa do álbum já entrega o tom: uma radiografia pélvica com um DIU. A mensagem é clara e direta como o próprio disco: Lorde está pronta para se mostrar por inteiro, até os ossos. Mas o conteúdo vai além da estética provocadora. Em faixas como “Broken Glass”, ela relata abertamente sua batalha com transtornos alimentares: “Passei o verão fazendo contas, perder peso exigiu tudo que eu tinha”. Já em “Hammer”, explora o desejo com um lirismo cru: “Não sei se é por causa do amor ou da ovulação”. E “Clearblue” é um retrato sonoro do pânico diante de um teste de gravidez.
Ao longo das faixas, Virgin soa como uma conversa real, sem filtros. Diferente dos desabafos “instagramáveis” de Solar Power (2021), agora Lorde troca a pose ensaiada pela vulnerabilidade sincera. As letras, por vezes duras, expõem não só questões íntimas, mas também angústias coletivas — da pressão estética à herança emocional entre gerações. Em “Favourite Daughter”, por exemplo, ela reflete sobre como suas conquistas podem ser, na verdade, tentativas inconscientes de agradar a própria mãe.
Musicalmente, o disco revisita o pop eletrônico denso de Melodrama (2017), mas com mais textura e nuance. A produção — ainda assinada por Jack Antonoff — aposta em arranjos menos polidos e mais atmosféricos, como na envolvente “Shapeshifter”, onde batidas secas vão ganhando camadas melódicas conforme a narrativa amorosa se desenrola. A voz de Lorde, ora sussurrada, ora aguda, acompanha a intensidade emocional das faixas, entregando uma performance vulnerável e hipnótica.
Virgin talvez não tenha hits prontos para o TikTok — e nem parece querer. É um disco que exige escuta atenta, digerido aos poucos. Não revoluciona o pop, mas reafirma algo mais raro: a coragem de uma artista que se recusa a se esconder atrás da persona que criou.
Lorde revela bastidores íntimos e curiosidades do álbum “Virgin”
Nesta segunda-feira (30), a cantora Lorde usou sua conta no Instagram para compartilhar curiosidades sobre a produção de seu quarto álbum de estúdio, “Virgin”. Lançado na última sexta-feira (27), o disco tem sido amplamente aclamado pela crítica. Atualmente, “Virgin” possui nota 84 no agregador de críticas Metacritic, com 15 avaliações contabilizadas até o momento.
A série de confissões começou com Lorde comentando sobre a faixa de encerramento do álbum. Em sua publicação, ela revelou que “David” foi a primeira música a começar a ser produzida e a penúltima a ser finalizada. A canção aborda o encerramento de relacionamentos e traz um tom melancólico que ressoa com o clima do disco.
Em seguida, a artista comentou sobre o processo de criação das últimas músicas do projeto. Ela revelou que “ClearBlue” foi a última faixa a entrar em produção, enquanto “Broken Glass” foi a última a ser finalizada.
Lorde também compartilhou qual canção mais mexeu com suas emoções durante o processo criativo. Segundo ela, “Favorite Daughter” foi a faixa mais dolorosa de compor, produzir e cantar:
“Foi um processo difícil em todos os sentidos — desde a escrita até a gravação. Foi doloroso mesmo.”
A cantora ainda comentou sobre os cortes feitos de última hora e instigou os fãs ao revelar a existência de faixas não lançadas, que podem ser disponibilizadas futuramente:
“Cortamos uma música de última hora porque achei que ela diluía a visão! Era uma das minhas favoritas, que escrevi com a Fabi. Tem algumas B-sides muito boas dando sopa, na real.”
Outro ponto abordado por Lorde foi o uso do sample da faixa “Morning Love”, do cantor Dexter Dapp, presente na música “Current Affairs”. Segundo ela, essa ideia já existia há anos e se encaixou perfeitamente no conceito da canção:
“Tinha sonhos de samplear Morning Love há tipo 8 anos. Ela é tão sexy e nebulosa pra mim, e eu amava o contraste com a guitarra super orgânica e frágil. Por acaso, estava na mesma tonalidade exata — era pra ser.”
A artista também comentou sobre seu processo criativo noturno, revelando que sofreu com insônia durante o desenvolvimento do álbum:
“Tive uma insônia constante, constante, fazendo esse álbum. Escrevi a maioria das letras de Favorite Daughter, o primeiro verso de Current Affairs, ClearBlue e o segundo verso de David logo antes do amanhecer.”
Para encerrar a série de revelações, Lorde destacou seus momentos sonoros favoritos do disco e traçou um paralelo com “Pure Heroine”, seu álbum de estreia:
“Meu som favorito no álbum é empate entre o tremolo rasgado + o vocal gelado no final de David e o começo de Hammer. As pessoas sempre achavam que o começo e o fim conectados de Pure Heroine tinham sido intencionais; não foram — mas começar e terminar Virgin na fonte foi <3.”