Descrita como uma epopeia, uma longa cena de Os farofeiros 2, a descida de gigantesco tobogã, demandou muitos efeitos especiais, emprego de dublê e foi praticamente "um filme dentro de outro", pelo que ressalta o diretor Roberto Santucci. "Quando eu pego os filmes que faço, meu trabalho é sempre deixá-los mais complexos, em termos de sofisticação e beleza. Pelo ritmo e pela lógica, a cena do tobogã traz humor cartunesco, absurdo e visual e que carrega menção ao estilo de O resgate do soldado Ryan", explica o diretor à frente da continuação para um dos grandes sucessos nacionais de 2018.
Novamente estrelado por Antônio Fragoso e Danielle Winits, que se embrenham por malfadada aventura de férias pela Bahia, o longa traz destaques para Cacau Protásio e Charles Paraventi, este na pele de Rocha, com destaque no trailer com a cena à la Borat do tobogã. "Se tenho alguma afinidade com o Rocha?! Ele está passando por uma crise existencial de meia-idade, aquela coisa da libido quase indo embora. Enfim, se eu passei, não me lembro (risos). Eu sou bem diferente do Rocha nesse sentido", diverte-se Paraventi.
A "maravilhosa" aceitação popular do filme deixa o comediante em situação cômoda. "O personagem faz uma viagem furada com os amigos; nem mais novo ou até mesmo depois de adulto, a gente parece que nunca aprende. Nisso é que acho que as pessoas vão se identificar muito com filme, é importante para o pessoal ir embarcar na viagem do cinema", comenta. Entre as referências para o personagem, Paraventi conta ter se inspirado em si próprio. "Já fui com uma mochila nas costas e um pacote de miojo do bolso a tantas viagens! Mesmo dessa forma, as viagens deram certo, na medida do possível. Para a gente é jovem tudo tá valendo", ri.
Entrevista // Roberto Santucci, diretor
Quando você recebe o roteiro, se esforça em contribuir, com avanços e sugestões?
O roteirista Paulo Cursino é realmente o maior da comédia para o cinema da atualidade. Fizemos juntos mais 20 produções e é muito confortável trabalhar com ele: o roteiro já chega muito pronto; repleto de boas piadas; são piadas que não ficam só no verbal — vêm piadas visuais, físicas. Meu trabalho é pegar tudo isso, e elevar a mais uma casinha, criando mais situações e mais sequências. Incluo cenas de dublês, grandes sequências visuais feitas para grande tela do cinema. A gente vai criando todo mundo, junto, eu a longa jornada no mangue tem várias situações que foram todas criadas por mim. Ficamos abertos: o pessoal da direção de arte tem uma ideia de algo engraçado, a criação de figurino segue essa linha. Todos contribuem, com improvisos. Tudo é unido, e é trabalhado na montagem. Depois, o filme é testado com o público para a gente ver o que é que tem graça que não tem. A gente traz de volta para o público, que não é o especializado, mas um público de mente fresca — aliás ninguém que trabalhe com o cinema — tem que ser gente normal. Você tem que trabalhar com uma equipe que é como um todo criativa, e ir colhendo essas coisas, e anexando.
Trazer o apelo de filme família reflete em policiamento no tom das piadas? Há humor ofensivo?
Nunca houve tanto policiamento com humor, vemos o humor sendo esvaziado, sendo capado — pessoas que trabalham com conteúdo, e aí vem de grandes empresas a bloggers, na internet, virou uma coisa: parece que as pessoas ganharam uma importância, se sentem realmente especiais e poderosas em dizer 'isso não pode' 'aquilo não pode', 'isso aqui eventualmente pode incomodar alguém'. O que a gente tem visto é muita censura mesmo. Então, muito pelo contrário, no filme, de piada, a gente procurou primeiro momento abrir ao máximo possível o leque sem tolher, tosar, antes de entender realmente o efeito da piada; onde ela vai. Logo, de cara, temos uma das maiores do filme: a do senhor que é o motorista do ônibus, e que tem uma
participação honrosa, ele ficou feliz da vida de estar lá, de volta, fazendo as pessoas rirem. Ele dedicou a vida dele a isso e é uma piada maravilhosa. No papel, houve gente falando: 'pô, pelo amor de Deus, tira isso — velhinho?!... Bota o cara menos velho...'. Se fossemos por esse caminho, ia perder muito da energia.
Como se afina junto ao público?
A primeira versão do filme é muito longa, ela recorre a todas as piadas que foram criadas ali na hora ou escritas anteriormente, e aí a gente vê quais são as piadas que agradam e as que não agradam, e se, eventualmente, tem uma piada que pode ofender — temos, daí, a conversa do por quê... Gente levanta a mão se... Trabalhamos com grupos grandes. Se uma pessoa falar um negócio, repito para o grupo inteiro e afunilamos, numa identificação de problema. Obviamente, tem uma piada ofensiva ela vai surgir, a gente não faz uma vez nem duas, a gente vai fazer três. Ter muito cuidado com o humor é algo que a gente sempre teve. Nosso público é muito testado, daí não ter alguém para aparecer lá dizendo que é o especialista disso daquilo, que trabalha no departamento de ofendimento ou no departamento de achar graça — e que posta regra. Ninguém consegue fazer nos nossos filmes. Realmente a gente está num momento em que há quem busque censurar. Tem gente ganhando em cima: defensores disso que não pode, mas, o que a gente vê, é que certamente as pessoas não têm a melhor capacidade de fazer o que estão fazendo.
Particularmente, em resultados, que humor mais te faz rir?
Acho graça de pequenas reações de atores; sou fã dos comediantes que são grandes atores. Então, por exemplo, a Elisa Pinheiro traz uma sutileza, uma naturalidade ao fazer um humor incrível, aí vem o Charles Paraventi, o Mauricio Manfrinio, a Cacau Protásio, a Dani Winitis... Eles vão colocando pequenas coisas, e eu acabo rindo de detalhes no final das contas. O trabalho é muito intenso, então, só depois, com muita calma, no cinema, com o público rindo, a gente vai descobrindo de volta algumas coisas. É um trabalho muito recompensador e surpreendente, com os estouros de risada do público. É tudo muito árduo, mas muito prazeroso.
Dores bem mais profundas do que as físicas
Guardado o exagero da comparação com o clássico O poderoso chefão, Garra de ferro traz uma saga masculina similar, com o detalhe de ter sido amenizada, para não desgastar à exaustão o público. Num sistema patriarcal severo, instaurado pelo pai Jack Adkisson (que se rebatiza Fritz Von Erich, e é vivido, na telona, por Holt McCallany), quatro filhos buscam a permanente aprovação dele, enquanto criam oportunidades para se sobressaírem no ringe de luta livre, em espetáculo amplamente televisionado, no raiar dos anos de 1980, e encenado na arena Sportatorium (Dallas, Texas).
Longe de estragar a trama, é preciso dizer que, um a um, cada um dos rebentos se viu abatido pelo destino. Isso ao ponto de o diretor do filme Sean Durkin haver amenizado tudo. "Do ponto de vista humano, é difícil dizer, mas a narrativa (crua) traria uma repetição bastante dura de ser aceita", observou, em entrevista ao site Vulture. Treinados por Chavo Guerrero Jr., os atores Jeremy Allen White, Zac Efron, Harris Dickinson e Stanley Simons, pela ordem, interpretam Kerry, Kevin, David e Mike (o mais frágil e um pretenso candidato a astro de rock). "O que mais me importa que você (diretor) saiba e que esteja presente no filme o quanto meus irmãos e eu nos amamos" foi a observação do lutador remanescente Kevin (Efron, no filme), numa espécie de pedido incorporado ao projeto desenvolvido por Sean Durkin desde 2015.
Extremamente sufocados pelo estilo de vida imposto pelo pai, aficionado pela qualidade das lutas e ainda o criador do movimento de mãos que quase leva ao esmagamento da cabeça de adversários, no filme, cada um dos irmãos carrega sua pureza juvenil e uma carreira de traumas, a começar pelo impacto da morte do primeiro irmão, Jack Jr., afogado, em criança. O esforço do cineasta e o resultado nítido de integração do elenco, não à toa, têm rendido muitos prêmios relacionados à montagem e desempenho conjunto de elenco.
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