É preciso acabar com as imoralidades no setor público e dar a ele condições de voltar a gerir seu pessoal. É o que defende a economista Ana Carla Abrão, sócia da área de Finanças, Risco e Políticas Públicas da consultoria em gestão da Oliver Wyman e referência em reforma administrativa. Em uma webinar que contou com a participação de Wagner Lenhart, secretário nacional de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia, Abrão foi enfática ao criticar a ineficiência da máquina pública e defender o fim de privilégios para servidores.
"A nossa máquina pública, hoje, é um grande mecanismo de reforço das desigualdades sociais e precisa ser reformada do ponto de vista do seu modelo operacional, que está antigo, exaurido, antiquado. É preciso uma reformulação estrutural", disse ela. A webinar intitulada 'O que esperar da reforma administrativa?' foi promovida pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e abordou as principais discussões sobre o assunto que tem provocado reações em sindicatos de servidores por todo o país.
Para a economista, além de os serviços públicos serem de má qualidade, os servidores não contam com insumos que garantam um ambiente de trabalho produtivo. "Os recursos que são crescentes e destinados ao financiamento dessa máquina não estão chegando para capacitar o servidor, valorizá-lo, ou mesmo remunerar os bons servidores. Não conseguimos sequer demitir os nossos servidores, nem mesmo por falta grave", disparou.
Ela falou também sobre a necessidade de criar instrumentos de avaliação do desempenho do funcionalismo público de forma moderna, impessoal e colegiada, permitindo aos servidores o direito de ampla defesa. Para a economista, outro ponto importante — que consta na proposta apresentada pelo governo — é o fim do que ela considera como sendo privilégios: férias de 60 dias, promoções e progressões automáticas e aposentadorias por punição, além de licenças remuneradas para disputa de cargo eletivo.
"A gente não pode ter mais 600 pessoas sendo promovidas, como a gente viu na AGU. Fora outras situações que a gente nem viu". E prosseguiu: "Temos que acabar com essas imoralidades, que não são direitos adquiridos, são privilégios. Ainda mais em um país tão injusto como o nosso. Não dá para ter um conjunto de cidadãos brasileiros completamente diferentes tendo ganho real de salários. Precisamos parar com essa discrepância, com esse mercado de trabalho em que o setor público e privado são completamente distintos", disparou.
Ana Carla criticou ainda os empecilhos para demitir funcionários públicos que cometem faltas graves. "Quando passei no concurso para o Banco Central, as pessoas diziam que eu estava com a vida ganha, só não podia matar alguém. Eu dizia: 'pode até matar que você vai continuar empregado', porque o processo disciplinar administrativo hoje, no Brasil, é uma vergonha, depõe contra o servidor, mas está aí. Não consigo ver outra forma de avançarmos que não uma forma de um processo de centralização", disse, ao se referir à reforma.
Redução gradativa
Já o secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia, Wagner Lenhart, acredita que a reforma administrativa é fundamental para promover uma melhoria dos serviços públicos e defende que a estabilidade em alguns cargos é "dramática". "Precisamos de uma reposição da força de trabalho, mas não temos dinheiro para isso. Outra questão é que quando autorizamos um concurso público, autorizamos que o governo assuma um compromisso de 60 anos com o servidor. Isso é dramático, porque a gente não sabe se algumas funções existirão daqui a cinco anos", explica.
Ele justificou dizendo que existem algumas atividades que não demandam proteção ou estabilidade. Mas a proposta não é igualar o setor público à iniciativa privada, uma vez que, segundo sua avaliação, é preciso haver um "salvaguardas" para os servidores. "Não é uma extinção da estabilidade, mas uma redução gradativa", afirmou.
Por fim, Lenhart destacou que a reforma administrativa deve vir acompanhada de outras mudanças e precisa ser um plano de país, e não de governo. "Tem que ser como em Portugal, que era conservador. Entrou um governo de esquerda e o processo de transformação da administração continuou. Isso não pode ser uma bandeira de partido, tem que ser uma busca de todos por um serviço público mais eficiente e que entrega mais resultados para a população", arrematou.
*Estagiário sob a supervisão de Andreia Castro
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