Nova CPMF

Guedes não descarta criação de novo imposto para desonerar a folha

"Continua sobre a mesa", afirmou o ministro da Economia em videoconferência para integrantes do mercado financeiro. E disse que "não desiste facilmente" de suas ideias

Marina Barbosa
Rosana Hessel
postado em 16/10/2020 22:05 / atualizado em 16/10/2020 22:06
 (crédito: Evaristo sá/AFP)
(crédito: Evaristo sá/AFP)

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que não descarta a criação de um imposto digital para compensar a desoneração da folha de pagamentos. Segundo ele, a proposta "continua sobre a mesa". Desde que assumiu o cargo, ele pretende criar um tributo nos moldes da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que incidia sobre os saques das contas bancárias, inclusive, da poupança.

Essa nova CPMF seria sobre as transações financeiras pelos meios digitais, podendo ter incidência tanto no saque quanto nos depósitos.  “Está sobre a mesa. Eu não desisto facilmente das minhas ideias”, disse o ministro, na noite desta sexta-feira (16/10), em videoconferência organizada pela XP Investimentos.

Guedes aproveitou o evento para responder à crítica do ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, sobre o assunto. Em entrevista à agência Bloomberg, Fraga disse, na quinta, esperar que Guedes desista da criação de um novo imposto sobre transações financeiras parecido com a CPMF. “É uma obsessão; do ponto de vista macroeconômico, é um imposto péssimo”, afirmou.

O Posto Ipiranga do presidente Jair Bolsonaro retrucou que, quando Fraga era conselheiro do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o país aumentou a carga tributária substancialmente, criando PIS-Cofins e a CPMF. “O FHC foi o presidente que mais aumentou imposto no país”, criticou.

Guedes garantiu, por sua vez, que o governo não pretende aumentar a carga tributária no Brasil, mesmo com a nova CPMF. Segundo ele, a ideia é fazer uma substituição tributária, desonerando a folha. Ele ainda deu uma alfinetada na imprensa, dizendo que os jornalistas "são mal informados".

Uma das principais críticas de analistas ao novo imposto é que, assim como a CPFM, ele vai estimular as transações em espécie apesar de ter uma proposta de ser digital. E é um imposto regressivo para a economia, pois atinge uma base ampla e de forma desigual, sem diferenciar ricos e pobres.

Renda Brasil x Renda Cidadã

O ministro da Economia voltou a defender a integração e a revisão dos programas sociais já existentes como uma forma para financiar o "Renda Brasil". Apesar de o presidente Bolsonaro ter proibido o uso do nome para o novo programa social que deve substituir o Bolsa Família, Guedes não abandonou o verbete.

Ele, inclusive, não cita o termo Renda Cidadã usado pelo senador Marcio Bittar (MDB-AC), que se voluntariou para encontrar uma saída para o programa, mas acabou entrando em uma saia justa ao propor o adiamento do pagamento de precatórios — dívidas judiciais do governo —, o que desagradou o mercado e Guedes foi obrigado a descartar a ideia publicamente. Diante da dificuldade para encontrar recursos, Bittar adiou várias vezes a entrega da proposta e prometeu um relatório apenas depois das eleições municipais.

Durante a apresentação de 1 hora e meia aos convidados da XP, Guedes alegou que o novo programa social precisa ser criado com responsabilidade social. Caso contrário, segundo ele, seria melhor voltar para o Bolsa Família. "Existem 27 programas que podemos juntar e focar a política onde precisa, nos mais vulneráveis", afirmou o ministro, durante a videoconferência. "Tem um programa potente concentrado lá", disse.

Nesse sentido, Guedes voltou a defender propostas que já causaram incômodo no governo durante as discussões sobre a criação do Renda Brasil, como a revisão do abono salarial e das deduções de saúde do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). Para ele, fazer esses ajustes é uma forma de abrir espaço, no conjunto dos programas sociais do governo, para incluir mais pessoas na lista de beneficiários e criar o Renda Brasil.

"Nós queremos integrar os programas sociais. Se você reduz as deduções para a classe alta, você aumenta as transferências para a classe baixa", defendeu. E continuou: "Se não tiver um programa integrado como esse, tudo bem, provavelmente vamos voltar a números menores".

Diante dos recentes impasses sofre a fonte de recursos do novo programa, Guedes acredita que este seria o caminho viável para tirar esse plano do papel de forma responsável fiscalmente. Ele chegou a dizer, inclusive, que, se não for para ter responsabilidade com a situação fiscal do Brasil, seria melhor voltar para o atual Bolsa Família, mesmo após a descoberta de 38 milhões de invisíveis pelo auxílio emergencial. "Melhor do que fazer um programa insustentável", opinou.

O ministro ainda destacou que o financiamento do Renda Brasil precisa ser via corte de despesas para que o teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento das despesas à inflação do ano anterior — não seja rompido. Qualquer aumento de imposto não ajuda nesse sentido, porque a despesa nova continuará existindo e, para não estourar o limite, é preciso uma redução de um gasto já previsto no Orçamento. “O programa precisa ser criado dentro do teto”, frisou.

Reação do mercado

Com o mercado financeiro reagindo à incerteza sobre a trajetória da dívida pública a partir de 2021, Guedes tentou minimizar o aumento na desconfiança dos agentes financeiros de que o governo não tem um plano econômico para sair da recessão provocada pela pandemia. Ele reforçou que mantém firme a agenda de reformas e não pretende abandonar o teto de gastos e criticou quem defende mais estímulos fiscais.
"É imperdoável usar uma doença para pedir estímulos artificiais para a economia. É falso. É ruim. É um ato covarde. [...] Os investimentos estão saindo por causa disso", declarou.

Nesse sentido, o ministro reforçou que é contra a prorrogação dos auxílios emergenciais e do Orçamento de Guerra em 2021. Para ele, só a continuidade da pandemia de covid-19 deveria levar o governo a rever essa questão. Além de defender a manutenção do teto de gastos, ele reforçou a necessidade da desindexação, da desobrigação e da desvinculação do Orçamento — medidas que, para ele, podem acabar com as ameaças de "furar o teto". Ele não escondeu o incômodo com os integrantes do governo que pensam de forma diferente. "Eu sofri fogo amigo no governo pelas costas", disse.

Por outro lado, fez elogios ao Congresso Nacional e tentou reforçar o recente alinhamento com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Disse, inclusive, que o governo já tem votos no Congresso para aprovar pautas regulatórias como o novo marco do gás. Ele minimizou os recentes atritos entre ele e Maia e disse que era só “fumaça” e “fofocas”, como fez recentemente em uma outra videoconferência onde declarou ter mais convergências do que divergências com o democrata.

 

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