CONTAS PÚBLICAS

Precatórios: declarações de Guedes aumentam insegurança de investidores

As falas sobre as obrigações geradas a partir de decisões judiciais contra a União provocam ruídos no mercado

Rosana Hessel
Fernanda Fernandes
postado em 04/08/2021 06:00
 (crédito: Edu Andrade/Ascom/ME - 5/3/21)
(crédito: Edu Andrade/Ascom/ME - 5/3/21)

O ministro da Economia, Paulo Guedes, continua rasgando os manuais do liberalismo econômico que prometeu seguir quando decidiu ingressar no governo. Ao defender novamente um parcelamento no pagamento de precatórios — dívidas judiciais da União — como moeda de troca para criar o Bolsa Família turbinado, o novo programa social prometido pelo governo Jair Bolsonaro, o chefe da equipe econômica gerou ruídos no mercado, diante do risco de uma nova pedalada fiscal, ou, simplesmente, de um calote federal.

“Devo, não nego, pagarei assim que puder”, disse o ministro, durante debate com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, promovido pelo site Poder 360.

De acordo com Guedes, a justificativa para mão pagar estaria no alto valor da conta dos precatórios, R$ 90 bilhões. Segundo ele, no início da década passada, o valor variava entre R$ 10 bilhões e R$ 16 bilhões. O número saltou para R$ 40 bi nos últimos quatro anos. “Fizemos um cálculo bastante conservador e, mesmo assim, estimamos que pudesse chegar a R$ 57 bilhões, mas o número extrapolou qualquer possibilidade de reservas e provisões do governo”, disse.

A explicação não convenceu o especialista em contas públicas Felipe Salto, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (AFI), ligada ao Senado Federal Para Salto, faltou cautela e mapeamento de risco do governo em relação a essa despesa. “Os precatórios não começaram a aumentar ontem. Não é propriamente uma surpresa”, destacou. “Despesa determinada pela Justiça se paga. Mexer em regra fiscal ao sabor da conjuntura é temerário.”

O governo tenta ampliar o parcelamento das dívidas previsto na Constituição por meio da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) discutida, na segunda-feira, por Guedes e pelos ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), Flávia Arruda (Secretária de Governo) e João Roma (Cidadania), com os presidentes da Câmara e do Senado Federal, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), respectivamente. Segundo o ministro da Economia, a PEC ainda será apresentada e permitirá, se aprovada, que os precatórios de maior valor sejam pagos com uma entrada de 15% e mais nove parcelas anuais de igual montante, em 10 anos ao todo, portanto. As causas de pequeno valor — até R$ 66 mil, seriam pagas integral e imediatamente.

“Existem milhões de pequenas causas ganhas contra o Estado brasileiro por cidadãos, e essas, nós estamos preservando o pagamento integral das sentenças. Todas as causas pequenas serão atendidas integralmente e instantaneamente, já vão para o Orçamento e serão preservadas”, disse Guedes. Segundo ele, “não haverá calote”.

No ano passado, durante a discussão do Orçamento deste ano, o então relator, senador Márcio Bittar (PSDB-AC) fez uma proposta parecida para também financiar um programa social, que era chamado pelo parlamentar de Renda Cidadã. Contudo, o assunto foi abandonado, porque gerou o mesmo ruído em relação às pedaladas fiscais — manobras contábeis que abriram espaço para o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

“Ao que tudo indica, houve uma melhora na proposta, que, na nossa avaliação, não parece uma pedalada a ponto de gerar uma abertura para um processo de impeachment de Bolsonaro. Mas é inegável que isso cai como uma bomba sobre o mercado, porque aumenta os riscos fiscais. Esse novo programa (Bolsa Família) vai aumentar o peso no Orçamento, é de longo prazo e não há uma receita equivalente para compensá-lo”, destacou Lucas Fernandes, coordenador de análise política da BMJ Consultores Associados.

“Os precatórios não começaram a aumentar ontem. Não é propriamente uma surpresa. Despesa determinada pela Justiça se paga. Mexer em regra fiscal ao sabor da conjuntura é temerário”, Felipe Salto, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente.

 

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