Consumo

Mercado geek ganha cada vez mais espaço com consumo acima da média nacional

Entusiastas deste universo consomem 40% a mais do que a média nacional, diz estudo. Indústria cresce entre 5% e 10% todos os anos

Fernanda Strickland
Rafaela Gonçalves
postado em 15/08/2022 06:00 / atualizado em 15/08/2022 22:39
 (crédito: Caio Gomez)
(crédito: Caio Gomez)

Não é de hoje que o segmento geek — antigamente conhecido como nerd — é visto pelo mercado como um importante nicho comercial. E não é para menos: segundo estudo feito pela Rakuten Digital Commerce, os aficionados desse universo costumam gastar 40% a mais do que a média nacional. Para citar alguns exemplos, entre livros, filmes e produtos, a franquia Harry Potter já arrecadou mais de US$ 21 bilhões, enquanto o faturamento da Marvel Studios, só com filmes, passou de US$ 30 bilhões, receita semelhante à do Mario — um dos mais conhecidos personagens de videogame do planeta — ao longo dos anos.

Apesar de não existir um índice único que represente toda a grandeza desse nicho, o mercado geek vai muito além do cinema, e cada setor traz as suas cifras. Uma pesquisa da empresa Newzoo, que faz análises sobre jogos de videogame, mostrou que 2,7 milhões de gamers devem gastar aproximadamente US$ 200 bilhões com a indústria de jogos até 2023.

Para Magno Costa, 33 anos, almoxarifado de obra, a paixão por este universo veio na infância. "A geração dos anos 1990 cresceu com a influência do Dragon Ball, e outros animes. Então, quando eu comecei a trabalhar, comecei a comprar aquilo que eu gostava", contou.

Magno revelou que gosta muito de comprar action figures — bonecos de decoração, jogos, itens de computador, entre outros. "Recentemente fiz até uma tatuagem com um personagem de um anime, o Rengoku Kyojuro", conta. Sobre o valor gasto, Magno afirmou que depende muito do lançamento. Por exemplo, nesta semana, adquiriu dois action figures por R$ 219. "Mas já cheguei a gastar R$ 859 em um. Gosto de gastar com roupas e com filmes e séries."

Magno Costa não economiza na hora de comprar itens colecionáveis
Magno Costa não economiza na hora de comprar itens colecionáveis (foto: Fernanda Strickland/CB/D.A.Press)

Publicitário, podcaster e nerd, Estevan Sanches, de 28 anos, contou que costuma destinar mensalmente em torno de R$ 300 a R$ 400 com mercadorias do segmento geek. "Costumo gastar mais com quadrinhos, mangás e games. Tenho alguns objetos decorativos, como forma de gelo do Darth Vader, vaso de plantas em formato do Groot, além de idas ao cinema, eventualmente", disse.

Hoje ele possui diversas coleções, como coletâneas de quadrinhos e mangás. "Passei a consumir mais produtos por conta da afeição a alguns universos e narrativas do mundo geek mesmo. E, claro, gradativo aumento no poder de compra." Com o gosto pela cultura geek, Estevan e mais três amigos idealizaram o podcast Rage Quit, no qual comentam sobre suas produções favoritas.

Consumo

De acordo com a pesquisa Geek Power 2021, da empresa Omelete Company, 84% do público geek acessa conteúdos da cultura pop todos os dias. E 95% dos entrevistados leem dois livros ou história em quadrinhos (HQs) por mês. Além disso, 65% jogam games frequentemente. Em relação aos gostos desse público, 47% acompanham anime, e Naruto e One Piece são os principais. Já o estilo de música favorito deles é o rock. O personagem Loki foi eleito pelos respondentes da pesquisa como o favorito das séries de 2021.

Gabriel Teodoro, 33 anos, trabalha com serviços gerais, e revelou que tem o hábito de comprar produtos deste universo. "Tenho o costume de comprar livros de RPG (role playing game, um tipo de jogo em que os jogadores elaboram narrativas colaborativamente), mangás, action figures e muitos jogos de videogame", pontuou. "Comecei a consumir na minha infância, sendo influenciado por amigos e até por programas de TV que existiam na época." Segundo ele, o gasto com esses produtos podem chegar a mais de R$ 300. "Ainda mais com os preços aqui no Brasil", concluiu.

Gabriel Teodoro, 33 anos, trabalha com serviços gerais, e revelou que tem o hábito de comprar produtos do universo Geek
Gabriel Teodoro, 33 anos, trabalha com serviços gerais, e revelou que tem o hábito de comprar produtos do universo Geek (foto: Fernanda Strickland)

José Fugice, CEO da consultoria de negócios do Grupo GoAkira, afirmou que é difícil precisar em que momento o mercado geek conseguiu se estabilizar. "Mas um fato importante é que ele vem crescendo todos os anos. Esse setor abrange licenciamento, cinema e games, que fazem parte da indústria que cresce todos os anos entre 5% e 10%", disse. "Para você ter uma ideia, a CCXP, que é o maior evento geek da América Latina, teve, em 2019, 280 mil participantes, sendo que em 2014, no primeiro ano do evento, foram apenas 97 mil pessoas", exemplificou.

Sobre os próximos anos, Fugice disse que, só em 2021, o setor de licenciamento no Brasil, que reúne os produtos ligados aos personagens mais famosos, faturou mais de R$ 21 bilhões. "O número representou um crescimento de 5% em 2020, mesmo com pandemia. Uma estimativa feita pela NewZoo mostrou que 2,7 milhões de gamers irão gastar cerca de US$ 200 bilhões na indústria de jogos até 2023. Trata-se de um mercado gigantesco, em que as empresas não terão a opção de entrar ou não, simplesmente entrarão", frisou.

O Grupo Uni.co, detentor das marcas Imaginarium, Puket, Casa MinD e Love Brands, que integra a Americanas S.A. desde 2021, também estuda a aquisição de uma nova vertical de produtos voltados ao segmento geek. “Acreditamos muito no potencial desse mercado e podemos aumentar a nossa oferta de produtos exclusivos e diferenciados para atender as necessidades desses públicos, fortalecendo ainda mais a nossa relação com o público jovem e novas gerações de consumidores”, afirmou Wellington Santos, CEO da companhia.

Movidos pelo sentimento

"A principal diferença do público nerd ou geek é que ele é movido por sentimento. Não é commodity", disse João Paulo Sette, CEO do Social Comics, primeira plataforma de quadrinhos digitais. Há anos no mercado, especialmente com atuação na organização de eventos de RPG e Anime no Nordeste, antes de ser empreendedor, ele era um consumidor. "A ideia surgiu lá atrás, em 2011. Eu sempre curti muito ler quadrinhos, jogar RPG, sempre fui nerd. Então pensei se não seria interessante levar os quadrinhos para o ambiente digital. Não conhecia nenhum app que fizesse isso na época, depois que descobri a existência de outro app nos Estados Unidos. Foi basicamente unir duas coisas que gosto, que são quadrinhos e tecnologia", contou.

Como uma banca virtual, onde as pessoas podem comprar, alugar ou assinar planos para ler os seus quadrinhos, a plataforma hoje conta com mais de 3 mil quadrinhos licenciados disponíveis. Sette avalia que, no Brasil, o mercado começou a despertar para esse universo após a primeira CCXP, em 2014, cobrindo as principais áreas dessa indústria, como videogames, histórias em quadrinhos, filmes e séries para TV.

"Em um exemplo simples do nosso dia a dia, ou eu abasteço meu carro em um posto perto de casa ou vou atrás de um com valor menor, o pensamento é pela comodidade ou economia. Já o fã percorre milhares de quilômetros de distância, paga três vezes mais caro e se expõe a qualquer coisa, muitas vezes para apenas ver seu ídolo de perto ou adquirir alguma coisa que deseja muito. Não há limite para o sentimento, é por isso que o geek consome mais: o sentimento por aquilo é o verdadeiro combustível", ressaltou Sette.

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  • Magno Costa não economiza na hora de comprar itens colecionáveis
    Magno Costa não economiza na hora de comprar itens colecionáveis Foto: Fernanda Strickland/CB/D.A.Press
  • O publicitário Estevan é um dos idealizadores do podcast Rage Quit
    O publicitário Estevan é um dos idealizadores do podcast Rage Quit Foto: Arquivo pessoal
  • Gabriel Teodoro, 33 anos, trabalha com serviços gerais, e revelou que tem o hábito de comprar produtos do universo Geek
    Gabriel Teodoro, 33 anos, trabalha com serviços gerais, e revelou que tem o hábito de comprar produtos do universo Geek Foto: Fernanda Strickland