Articulação

Presidente eleito terá o desafio de buscar o equilíbrio fiscal

Novo arcabouço fiscal será inevitável para o próximo governo. Presidente terá que saber negociar com o Congresso

O consenso entre analistas é que o maior desafio do próximo governo será o controle das despesas e o equilíbrio fiscal. Apesar de o governo Jair Bolsonaro (PL) tentar minimizar o problema, especialistas são categóricos ao afirmar que um novo arcabouço fiscal será inevitável no próximo governo, seja ele qual for. E, para que isso ocorra, o próximo presidente terá que saber negociar com um Congresso que não vai querer abrir mão da "boquinha" de quase R$ 20 bilhões anuais de emendas do relator, as polêmicas RP9 ou orçamento secreto, muito pouco transparentes.

Nesse sentido, a economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, destaca que a capacidade de articulação do novo governo com o Congresso será fundamental para garantir a governabilidade e os ajustes necessários no Orçamento de 2023, que tem pouquíssimo espaço de manobra. "O próximo mandatário chega com temas pesados e com um Congresso que não vai querer abrir mão do orçamento secreto nas negociações", alerta.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já prometeu acabar com o teto de gastos, mas analistas reconhecem que Bolsonaro já fez isso em 2021, quando enviou ao Congresso a PEC dos Precatórios, e não será fácil fazer qualquer ajuste para conter o aumento de gastos em curso com a economia encolhendo.

"O Fiscal é um desafio monstro no ano que vem, porque não há sinais claros de nenhum dos candidatos sobre o que será feito. Só promessas que pioram ainda mais as contas públicas no ano que vem", alerta o economista Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.

Ele prevê 0,5% de crescimento do PIB em 2023 e piora nas contas públicas, pois o rombo fiscal deverá ser superior a R$ 100 bilhões, devido ao forte aumento desenfreado de gastos neste ano e que deve continuar no ano que vem. Esse resultado, aliás, ficará acima da meta fiscal prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2023, que permite um deficit primário de até R$ 69 bilhões nas contas do governo federal.

O economista-chefe do Banco Alfa, Luis Otavio de Souza Leal, que também prevê alta de 0,5% no ano que vem, engrossa o coro: "O maior desafio é a questão fiscal."

Com o resultado das urnas no primeiro turno, as chances de uma guinada mais à esquerda do ex-presidente Lula no governo são baixas, segundo os analistas. Ao ver deles, o petista precisará negociar com o centro para conseguir governar, mas isso não deverá ser um obstáculo. E, além disso, argumentam que o bloco do Centrão é muito mais flexível do que se imagina.

Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset, ressalta que, apesar da resistência de Lula em anunciar o que pretende na área econômica, o que ele tem falado sobre o teto de gastos parece uma "proposta razoável".

"O teto está no centro dos debates, mas o mercado pode ficar com o pé atrás, dependendo de quem Lula escolher. Sem uma definição, o mercado tende a continuar volátil", destaca Hegedus. No caso de Guedes, o fato de o ministro continuar alinhado com Bolsonaro é um fator positivo, mas tudo dependerá de como será a interlocução entre eles em um eventual segundo mandato.

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"Os planos de governo, tanto de Lula quanto de Bolsonaro, não são muito claros e o direcionamento só poderá ser dado quando os nomes forem colocados à mesa", destaca. Para o analista da Mirae, contudo, é possível que Lula seja mais pragmático, como quando assumiu em 2002, pois fez ajustes fiscais importantes no início do mandato.

Já Bolsonaro, na avaliação dele, estará distante da agenda liberal porque precisará enfrentar vários problemas fiscais criados por ele mesmo, principalmente, depois de criar um monte de medidas eleitoreiras com a PEC Kamikaze e que dificilmente serão canceladas no fim deste ano.

"O governo Bolsonaro deixou de ser liberal há tempos. Agora, ele está com dificuldade para se reeleger, mas não é por causa da economia, pois a inflação é administrável e não deve explodir neste ano e, muito menos, no ano que vem. O problema é que o conjunto da obra durante a pandemia foi muito desgastante", frisa.

Mesmo onde houve avanços no atual governo, como a reforma da Previdência, Hegedus lembra que Bolsonaro não soube conduzir o processo e se omitiu quando os técnicos tentavam negociar com os parlamentares. "O governo manteve privilégios dos militares, o que foi muito ruim", critica.

Diante do aumento da preocupação do mercado com a questão fiscal, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que segue a linha desenvolvimentista, critica o fato de grande parte dos economistas ortodoxos se preocuparem apenas com o corte de gastos. Ele destaca que será inevitável que o governo amplie as despesas em um ano em que haverá uma visível percepção de desaceleração da atividade econômica.

Na avaliação de Belluzzo, é preciso se preocupar com o que está acontecendo no mundo também, porque, depois da pandemia da covid-19 e os bancos centrais estão atacando o problema da inflação generalizada com o remédio errado no momento, que é a alta de juros, e as consequências já estão contratadas: recessão.

"A estrutura da economia internacional está desmilinguindo e continuam utilizando velhos remédios para novos problemas", destaca. O problema do endividamento elevado do país não é tão grave porque a dívida pública é majoritariamente interna — uma mudança expressiva ocorrida no governo do PT —, que contribuiu para que o país ficasse menos vulnerável aos choques externos, na avaliação de Belluzzo. Para ele, o próximo governo precisará melhorar a articulação.

 

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