Os diretores do Banco Central se reúnem nesta semana, entre terça e quarta-feira, para mais um encontro do Comitê de Política Monetária (Copom). Será o terceiro do ano e o primeiro após a mudança da meta fiscal nos próximos anos no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2025, enviado ao Congresso no mês passado. Analistas ampliam as apostas de que desta vez o colegiado será mais cauteloso.
A alteração da meta fiscal, em menos de um ano de vigência do novo arcabouço, acendeu mais um alerta na condução da política monetária e, apesar de o mercado de trabalho estar mais aquecido do que o esperado, isso também acaba jogando pressões inflacionárias, especialmente no setor de serviços.
Não à toa, crescem as estimativas do mercado financeiro de que o corte na taxa básica da economia (Selic), atualmente em 10,75% ao ano, será de 0,25 ponto percentual, para 10,50%, em vez de 0,50 ponto percentual, como o Copom havia sinalizado no comunicado da reunião anterior, em março.
As apostas para o próximo Copom estão divididas, mas o corte de 0,25 ponto percentual na Selic está ganhando espaço", destaca o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale. Ele acredita que não haverá o tradicional consenso entre os diretores do Copom, mas que a maioria deverá votar para a redução de 0,50 ponto.
"Mas não me surpreenderia se vier um corte de 0,25%, o que certamente vai gerar divisão no Copom", acrescenta Vale, reforçando o aumento da preocupação com a questão fiscal, já que a arrecadação extraordinária registrada nos últimos meses pode não continuar se repetindo daqui para frente. "O mercado estava muito crente de que haveria espaço político para novas rodadas de aumento de arrecadação. Mas o que precisava era de mais atenção com os gastos, por parte do governo e do Congresso", resume.
O economista da MB ressalta também que o mês de abril trouxe turbulências para todos os gostos. Ele cita a ampliação da guerra no Oriente Médio, o estouro da meta fiscal aqui no Brasil e a piora relevante do cenário norte-americano, com uma inflação mais resistente do que o esperado.
Ainda no mercado externo, aumentam as incertezas após o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) manter o intervalo dos juros básicos norte-americanos no maior patamar em 23 anos — de 5,25% a 5,5% ao ano — por um período mais prolongado do que o inicialmente previsto.
Com a economia seguindo aquecida e a inflação piorando nas últimas leituras, o Fed sinalizou que, se precisar, manterá os juros nesse patamar por muito tempo ainda. "Mas o fato é que se uma recessão ou sinais dela aparecerem, nós ainda poderemos ver queda de juros este ano. O cenário de não haver queda só valeria nessa situação de resiliência contínua da economia americana", destaca Vale.
Piora nas previsões
A previsão para a Selic no fim deste ano também mudou, passando de 9% antes da alteração da meta fiscal, para 9,50%, no último boletim Focus, divulgado na semana passada. A revisão reflete o aumento da cautela na condução da política monetária que vem sendo sinalizada pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto, em várias apresentações ao mercado, sinalizando uma redução no ritmo do ciclo de corte da Selic, iniciado em agosto do ano passado.
"Nas últimas apresentações, Campos Neto foi bem claro na crítica à mudança da meta fiscal e lembrou que quando você perde a âncora fiscal ela é arranhada, ou seja, quando você tem um desafio maior ou menor na contribuição do resultado primário para reduzir a inflação, você tende a jogar um peso mais excessivo no ajuste da política monetária", pondera Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos.
A tendência, de acordo com ele, é de pressionar por uma política monetária um pouco mais apertada ou menos flexível. "De certa forma, a mudança na meta elevou ainda mais a probabilidade dessa opção de redução do ritmo de queda da Selic na próxima reunião do Copom", avalia o economista, que acredita que haverá corte de 0,25 ponto porcentual na Selic na reunião desta semana.
"Há outras declarações também de diretores do BC, enfatizando bastante o impacto do mercado de trabalho sobre os rendimentos e da oferta de crédito, que está se dizendo que dinamizou a inflação futura e parece que tem um respaldo importante. Não esquecendo também que, mesmo com essa suavização do risco do conflito no Oriente Médio e o preço médio do barril do petróleo ainda estar em um patamar razoável, ainda existe uma certa recuperação do reajuste do combustível", alerta.
Eduardo Velho lembra que, com as chuvas no Rio Grande do Sul, há um novo agravante que pode pressionar a inflação. "Tem aí uma quebra da safra de soja por conta dessas enchentes no Sul no país, há produtores reavaliando para baixo a estimativa da safra. Então, me parece que isso dá margem para uma piora na inflação e uma piora na área fiscal, que vai forçar uma conduta menos flexível do Banco Central em maio", pontua.
Mercado de trabalho
O aumento no número de vagas formais no mercado de trabalho em março, com criação de 244 mil postos com carteira assinada, e a taxa de desemprego em 7,9%, em patamar melhor do que o esperado pelo mercado, também ajudam nas apostas para que o corte da Selic seja de 0,25 ponto percentual em vez de 0,50 ponto. O mercado de trabalho mais aquecido pode implicar em um cenário mais positivo para o consumo de bens e serviços e, com isso, um desafio maior para o BC no controle da inflação.
Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, acredita que a maior parte do mercado está apostando queda de 0,25 ponto percentual na taxa Selic por várias razões. "Um aumento de incertezas globais, tanto em relação às dúvidas sobre taxa de juros dos Estados Unidos quanto às questões geopolíticas. Aqui no Brasil, a situação fiscal também merece atenção. E, principalmente, isso afeta diretamente a inflação de serviços, uma combinação de expansão fiscal com renda. Todos esses fatores fazem com que as expectativas de inflação estejam acima da meta", destaca.
Padovani ressalta ainda que a taxa de juro real (descontada a inflação) ainda está elevada e, portanto, há espaço para redução da Selic. "Há espaço para corte dos juros, mas em ritmo mais moderado, porque a inflação de serviços parou de cair, e está estabilizada em 5%. Por isso, há justificativa para o mercado esperar um corte de 0,25 ponto percentual. E as declarações de Campos Neto influenciaram muito para isso e abriu essa possibilidade de corte menor", explica.
Divergências na decisão
Assim como Vale, Padovani acredita que é possível uma divisão na decisão do Copom. Ele, inclusive, demonstra preocupação com o atual patamar dos juros e acredita que ainda é cedo para o Copom mudar a sinalização futura (forward guidance) da reunião anterior.
"Acho que os juros reais estão muito elevados e o processo inflacionário continua, apesar da dificuldade com o setor de serviços, não há motivos para eles mudarem o forward guidance que eles tinham dado de corte de 0,50 ponto. Mas a fala de Campos Neto e o aumento das incertezas globais, assim como as dúvidas em relação ao fiscal e o mercado de trabalho mais aquecido, tudo isso, são argumentos para o corte de 0,25 ponto na Selic", reforça.
O economista Alberto Ramos, diretor de pesquisa para América Latina do Goldman Sachs, também espera que o Copom se desvie do anterior forward guidance e desacelere o ritmo de normalização da taxa básica de juros para 10,50% ao ano, apostando também no fim do consenso entre a diretoria do BC.
"Não descartamos um ou mais votos para um corte de 50 pontos-base na Selic e um comunicado hawkish (mais intolerante à inflação) sugerindo espaço limitado para uma flexibilização adicional significativa posteriormente", afirmou em relatório enviado aos clientes.
Ramos ressalta esperar que o Copom reforce no comunicado que a "postura política permanecerá restritiva até que o processo de desinflação se consolide e as expectativas de inflação voltem a ancorar em torno da meta".
"É necessária prudência, dado que a dinâmica da inflação nos serviços básicos permanece rígida, as expectativas de inflação para 2024, 2025 e 2026 permanecem visivelmente acima da meta de inflação e para 2025 pioraram desde a última reunião, além disso, o cenário do mercado de trabalho permanece restritivo", explica. "Globalmente, o cenário macroeconômico interno tornou-se menos favorável à inflação e o cenário externo mais incerto e volátil", acrescenta o economista do banco norte-americano.
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