Unir dois arquirrivais da mesma cidade com uma mesma camisa seria combustível para o início de uma guerra em Gênova, na Itália. Mas, naquele 29 de setembro de 1969, não foi assim. O Santos só tinha uma data disponível na agenda para um amistoso contra Sampdoria ou Genoa. Como nenhum dos dois clubes abriu mão, o jeito foi anunciar um combinado para enfrentar Pelé, Coutinho & Cia.
Coube ao pacificador romano Fulvio Bernardini a tarefa de escalar o time. O técnico da Sampdoria não só topou a missão como quebrou o clima de rivalidade com uma preleção inusitada. "Quem me contou essa história foi um amigo meu aqui na Itália chamado Francesco Morini. Segundo ele, o Fulvio Bernardini chegou para o time e disse: 'Olha aqui, não quero saber de violência. Estou aqui hoje para ver o Pelé jogar. E vou logo avisar, se alguém bater nele eu tiro do time na mesma hora'", revelou, em entrevista ao Correio, em 2010, José João Altafini, o Mazzola, campeão mundial em 1958 com a Seleção Brasileira e, à época, atuava como comentarista esportivo na tevê italiana.
A ordem de Fulvio Bernardini foi cumprida ao pé da letra. Quer uma prova? O Santos venceu o jogo por 7 x 1! Livre, leve e solto, o blindado Pelé marcou duas vezes antes de deixar o campo aplaudido para ser substituído por Douglas. Djalma Dias também fez dois. Nenê, Negreiros e Léo completaram a aula de futebol-arte. O medo do técnico Fulvio Bernardini era tamanho que até o gol do combinado foi contra. Turcão marcou para o dueto Sampdoria/Genoa.
Apesar do bom comportamento, a obediência não foi recompensada pelo técnico. Fulvio Bernardini premiou os reservas. Trocou praticamente a equipe inteira durante a partida. No total, houve sete substituições, segundo a ficha técnica disponibilizada à reportagem pelo historiador oficial do Santos, Guilherme Gauche. "Todo mundo foi para casa feliz", brincou Mazzola.
Visão italiana
Segundo Mazzola, o gol mais impressionante marcado por Pelé na ótica dos italianos é o primeiro do Brasil na final da Copa do Mundo de 1970, no México. A Squadra Azzurra foi a vítima. "Aqui na Itália, eles dizem que o Pelé parou no ar antes de cabecear o cruzamento do Rivellino no canto esquerdo do goleiro Albertosi. Recorreram até a jogadores de basquete para comprovar a tese. Realmente é um gol magnífico. Alguns chegam a dizer que o Michael Jordan (ex-Chicago Bulls, considerado o Pelé do basquete) aprendeu a levitar com o Rei", divertiu-se Mazzola.
"Aqui na Itália, eles dizem que o Pelé parou no ar antes de cabecear o cruzamento do Rivellino no canto esquerdo do goleiro Albertosi. Recorreram até a jogadores de basquete para comprovar a tese. Dizem que Michael Jordan aprendeu a levitar com o Rei", contou Mazzola, campeão mundial em 1958
Saiba mais
Trajetória do craque
Mazzola deixou o futebol brasileiro em 1958. O Milan desembolsaria um bom dinheiro para levá-lo aos gramados italianos. E o investimento valeu a pena. Com a camisa rossonera, e atuando com o nome de Altafini, o jogador ítalo-brasileiro comemorou três títulos nacionais (59, 62 e 68), além da cobiçadas Copa dos Campeões, atual Liga dos Campeões (69) e Recopa da Europa (68). Na Itália, Altafini jogou também na Juventus, sagrando-se mais uma vez campeão nacional (1972) e no Napoli.
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Três perguntas para…
Você e o Pelé eram os mais novos da Seleção Brasileira de 1958. O que os diferenciava?
Eu sou de 1938 e ele era de 1940. Portanto, sou dois anos mais velho. Mas, quando treinávamos juntos antes do Mundial, parecia que eu tinha 17 anos e ele 25. Eu brincava de jogar bola e ele já jogava muito bem. Era muito mais compenetrado do que eu, impressionante.
Em qual jogo ele conquistou o mundo?
Quando vencemos a França nas semifinais. Ele fez três gols e os franceses ficaram maravilhados. Para mim, o grande protagonista dos títulos mundiais de 1958 e 1962 foi o Garrincha, mas o Pelé impressionou por fazer tudo aquilo aos 17 anos, como se fosse um trintão. Depois ele fez mais dois na final, contra a Suécia, mas se você for ver, o Garrincha abriu as portas de todos os jogos pelos espaços que conseguiu nas defesas adversárias para que nós pudéssemos aproveitar.
Você jogou 18 anos no futebol italiano e mora na Itália. Por que o Pelé nunca jogou aí?
Não foi por falta de tentativa. Nos sete anos em que eu joguei no Milan, cansei de ouvir que a nossa rival, Internazionale, mandou várias e várias propostas para o Santos, mas ele e o clube recusaram todas. Mas eu entendia o motivo. Pelé era e continuará sendo para sempre um patrimônio do Brasil.
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