Paralimpíadas

Brasiliense concilia vida de atleta e professora rumo às Paralimpíadas

Classificada aos Jogos de Paris-2024, a brasiliense Aline Furtado relata ao Correio como as águas do Lago Paranoá serviram de corrente para impulsioná-la ao sonho de remar em direção ao ouro na paracanoagem

Aline Furtado vai representar o DF e o Lago Paranoá nas Paralimpíadas de Paris-2024 -  (crédito:  Ed Alves/CB/DA.Press)
Aline Furtado vai representar o DF e o Lago Paranoá nas Paralimpíadas de Paris-2024 - (crédito: Ed Alves/CB/DA.Press)

Do Lago Paranoá ao Estádio Náutico Vaires-sur-Marne, na França. Dos treinos nas águas candangas a um evento mundial. Da sala de aula aos barcos. Do sonho à realidade. Aline Furtado, de 40 anos, está prestes a representar o Distrito Federal nos Jogos Paralímpicos de Paris-2024 e o time de atletas brasilienses que ajudou-a a garantir ao país o recorde de vagas na competição.

No paradesporto desde 2021, 20 anos após lesão medular que a deixou com uma limitação nos pés, Aline carimbou o passaporte no começo de maio no Mundial da Hungria. A brasiliense precisava terminar a competição à frente das adversárias australianas na categoria KL3W de caiaque feminino, e assim ela fez. Os conterrâneos Luciano Pereira Lima e William Ferreira Mendes foram fundamentais para as vagas na classe KL1M e KL2M, respectivamente, e estarão nas águas francesas como reservas.

"Foi algo único. Não fui para pegar uma medalha. Apesar de querer isso, meu foco era na classificação. Tive uma missão e deu certo. Foi um trabalho duro para chegar bem na disputa. O esporte é isso. Agora, é voltar e desenvolver o que for preciso nos treinos", conta.

Além dos desafios na água, Aline lida com outra questão fora dela: conciliar os treinos com o trabalho. Professora da Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEEDF), ela defende a vida dupla como forma de conseguir se manter. O único apoio financeiro como atleta é da bolsa de R$ 1.850 paga pelo governo federal devido ao resultado no Parapan-Americano de canoagem de 2023, quando ganhou ouro.

"A rotina é complicada. Entro no lago às 6h, treino da melhor forma possível e tenho que sair com tempo para não chegar atrasada no trabalho. Os dois concorrem, se complicam, mas a gente vai levando até encontrar uma forma de se dedicar somente aos treinos. Preciso trabalhar para me manter, não tenho como pedir afastamento da SEEDF. Faço meu melhor em ambos e essa é a realidade de muitos atletas no Brasil", testemunha.

Independentemente dos percalços, o foco é no desempenho em Paris, especialmente, por representar a cidade onde nasceu e confiar na torcida do povo brasiliense. O quadradinho, inclusive, tem papel importante na preparação de Aline, com destaque para o Lago Paranoá.

"Vou puxar sardinha para a minha casa. Competi em vários lugares, mas o Lago Paranoá não perde para nenhum. Ele tem o espaço e a possibilidade de mudar o local de treinamento de acordo com o vento. Treino no Clube da Aeronáutica e ali tenho uma saída aberta, posso ir para vários pontos para fazer meu treinamento da melhor maneira", elogia a atleta.

Das águas de Brasília para as de Paris, a professora quer honrar a bandeira verde-amarela e o quadradinho para buscar o sonho do ouro paralímpico. "O Brasil é uma referência dentro do paradesporto, principalmente, na paracanoagem. A nossa missão é única, de continuar mostrando o tamanho do nosso país no esporte. As expectativas são as maiores e melhores possíveis. Vou levar comigo a cidade onde nasci, o Lago onde eu treino e tentar algo maior, que é a medalha", projeta.

Preparação

Nos bastidores, Aline conta com o apoio do técnico Paulo Salomão. Referência do paradesporto na capital federal, o treinador não alivia para a atleta e monta rotinas de treinos de segunda a sábado com duas ou três sessões por dia. Dividida em força, flexibilidade, recuperação e fisioterapia, a programação está na reta final para que os competidores cheguem no auge em solo francês.

"A Aline está vindo em evolução e a expectativa é excelente. Ano passado ela foi para o Mundial na Alemanha e corrigimos alguns erros, esse ano tivemos alguns na Hungria, mas isso é bom, porque mostra que temos margem para crescer. O trabalho é acertar esses detalhes e tentar melhorar 5% no tempo dela para brigar por uma medalha. A gente sabe da dificuldade, mas é possível", comenta Salomão.

Apesar de a atleta ter competido com as australianas por uma cota, o treinador inclui as britânicas como adversárias para ficar de olho contra os brasileiros. Independentemente da ameaça dos concorrentes, o recado é o mesmo: o favoritismo é verde-amarelo. "O Brasil é uma grande potência mundial e respeitado na Paralimpíada. A paracanoagem é a quarta modalidade que mais traz medalhas ao país, então estamos no caminho certo. Os treinadores estão bem capacitados, a base está fomentada, temos uma grande seleção", analisa.

Ao todo eram 10 vagas possíveis para os brasileiros. Oito foram conquistadas. O desempenho comprova o crescimento da modalidade e coloca o país na rota de fazer história em Paris. O número de representantes é o maior da delegação em Paralimpíadas, com atletas nas categorias KL1M, VL2W, VL2M, VL3W, KL2M, KL1W, KL3M e KL3W.

O significado de cada sigla é de acordo com o tipo de barco e do grau de movimentação nos membros inferiores, de menor para maior (1 a 3), além do sexo. KL representa os caiaques, enquanto VL é para as canoas. M são as classes masculinas e W as femininas.

Para Salomão, o Brasil tem promessa de medalhas na maioria. Entre os homens, a esperança vem de Luiz Cardoso, campeão mundial da KL1M, e da dupla Fernando Rufino e Igor Tofalini — oportunidade de dobradinha na categoria VL2M. Nas mulheres, Mari Santilli, medalhista da VL3W da Alemanha, Débora Benevides, rumo à terceira Paralimpíada da carreira na KL2W e VL2W, e Adriana Azevedo, da KL1W.

Nos Jogos de Tóquio-2020 foram três ouros e duas pratas para o Brasil. O desempenho fica evidente considerando que na edição anterior (Rio-2016), o bronze de Caio Ribeiro foi a primeira medalha brasileira na paracanoagem. Ou seja, o sonho dourado é cada vez mais real para Paris.

Estagiário sob supervisão de Marcos Paulo Lima

 

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postado em 08/06/2024 00:01 / atualizado em 09/06/2024 07:05
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