Fundo da Educação Básica

Cercada de polêmicas, regulamentação do Fundeb segue para o Senado

Os senadores podem votar na próxima terça-feira (15) o projeto de lei. Políticos e especialistas criticam os destaques aprovados pela Câmara dos Deputados

Mateus Salomão*
postado em 11/12/2020 22:14 / atualizado em 11/12/2020 23:04
 (crédito: Maryanna Oliveira/Agencia Câmara)
(crédito: Maryanna Oliveira/Agencia Câmara)

O Projeto de Lei que trata da regulamentação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) segue para o Senado Federal. A matéria foi aprovada, nesta quinta-feira 10/12, pelos deputados, e deve ser apreciada pelos senadores na próxima terça-feira (15). No entanto, destaques acrescidos ao texto geraram polêmica, pois destinam recursos ao Sistema S e a escolas ligadas a entidades instituições comunitárias, confessionais e filantrópicas.


O fundo foi tornado permanente após promulgação pelo Congresso Nacional em agosto deste ano. Além disso, a participação da União sobre os repasses foi aumentada. Até 2026, está planejado um crescimento gradual da complementação do fundo que chegue em 26%.


No entanto, o fundo depende da regulamentação para que possa entrar em vigor a partir de 1° de janeiro de 2021. Após a aprovação na Câmara, a matéria segue para o Senado. Se a casa alterar o texto, ele deverá retornar e ser novamente apreciado pelos deputados, antes de ir para a promulgação presidencial.


Deputados reagem aos destaques


A deputada Tabata Amaral (PDT-SP) considerou a regulamentação uma vitória, mas destaca que ocorreram percalços durante o processo. Entre o que mais preocupa a parlamentar está o repasse para instituições comunitárias, confessionais e filantrópicas no âmbito da educação fundamental e do ensino médio.

 

 

A deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP)
A deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP) (foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados)


“O que é importante ressaltar é que essas escolas se concentram nas redes com mais recursos, por exemplo, São Paulo. Então, eu tenho receio que, ao trazer essas escolas para a distribuição dos recursos, que a gente tenha algo que é o inverso do propósito do Fundeb”, ressalta a parlamentar.

 

No Twitter, o deputado Marcelo Freixo (PSOL-SP) ressaltou que o acordo estabelecido com a oposição foi descumprido. “A Câmara acaba de aprovar um golpe no Novo Fundeb que permite que dinheiro da educação pública seja drenado para instituições particulares, rompendo o acordo que havia sido feito. Nós da oposição seguimos na luta.”


No Instagram, o deputado Túlio Gadêlha (PDT-PE) também destacou que a base do governo não cumpriu o acordo de votar o projeto sem destaques ou obstruções. ”Quem perde com isso são os estudantes, professores e todos que acreditam que a educação pública, gratuita e de qualidade e o caminho para enfrentar as desigualdades no Brasil”, pondera.


 

A reação se estende ao Senado, onde a matéria será apreciada


O líder do Partido dos Trabalhadores (PT) no Senado Federal, Rogério Carvalho, considera que o texto aprovado modifica a intenção do novo Fundeb, que é de aumentar o investimento na educação pública, pois tenta amenizar as dificuldades financeiras das instituições privadas. Por isso, promete tentar modificar o texto no Senado.

 

 

O líder do PT conta que devem ser apresentadas emendas ao projeto para mudar os destaques, também espera que a matéria seja pautada na próxima semana. “O texto deve chegar no Senado nos próximos dias, e em seguida, certamente será pautado porque o Senado já demonstrou um empenho em aprovar o Fundeb”.


No Twitter, o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) afirmou que a regulamentação encontrou um golpe na Câmara. “A base governista votou pela retirada de recursos da Educação Pública para destinar a entidades confessionais, comunitárias e filantrópicas. O Fundeb é da educação pública! Vamos lutar para reverter no Senado.”


 

Especialista avalia a regulamentação e destaca os próximos passos


O líder de relações governamentais do Todos pela Educação, Lucas Fernandes Hoogerbrugge, observa que a regulamentação do Fundeb é um grande avanço por permitir que ele funcione em 2021 com uma série de pontos positivos. Ele ressalta, porém, que o texto base que o deputado acordou com a oposição era de qualidade foi distorcido com os destaques.

 

O líder de relações governamentais do Todos pela Educação, Lucas Fernandes Hoogerbrugg
O líder de relações governamentais do Todos pela Educação, Lucas Fernandes Hoogerbrugg (foto: Arquivo Pessoal)

 

Lucas elenca a ampliação do conveniamento para instituições comunitárias, confessionais e filantrópicas na educação fundamental e do ensino médio, além da abertura do conceito de profissionais da educação para terceirizados e profissionais dessas escolas. “São dois pontos que achamos negativos e que o Senado deve atuar sobre eles para garantir que o texto tenha ajustes antes de ser sancionado”, considera.


Se mantida a alteração, o líder espera prejuízo para a educação, pois será usado parte dos recursos que iriam para escolas públicas e passa para a rede particular. Também significa retirar dos locais mais pobres e passar para os mais ricos. “Os municípios mais ricos têm 18 vezes mais instituições sem fins lucrativos do que os mais pobres”, considera.


As alterações demandam discussão e definição, aponta especialista


A Coordenadora de Implementação Regional do Itaú Social, Sonia Dias, considera a aprovação uma vitória por regulamentar todas as mudanças e melhorias no fundo. Mas acha que definições precisam ser feitas por partes do texto não terem sido discutidos na primeira versão, como a extensão para as escolas privadas e a flexibilização do teto para pagamento de salários.

A coordenadora de implementação regional do Itaú Social, Sonia Dias
A coordenadora de implementação regional do Itaú Social, Sonia Dias (foto: Patrícia Stavis)

 

A especialista em educação considera a inclusão de instituições comunitárias, confessionais e filantrópicas muito recente, portanto, não ficou claro a forma do uso do recurso, a quantia destinada e se serão utilizados recursos já alocados na rede pública. “Toda a matéria que foi colocada inicialmente para a aprovação vem sendo debatida há muito tempo no Congresso. Então, acredito que os destaques demandam maior debate”, observa.

 

Ubes considera a aprovação dos destaques um golpe à educação


A presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Rozana Barroso, destaca que a entidade estudantil considera um golpe a aprovação das emendas ao texto que destinam recursos do Fundeb ao setor privado. “Primeiro que a educação pública passa, neste momento, por uma crise gigantesca. Segundo, que o sistema S tem recursos. Nós acreditamos que o Fundeb é para a educação pública”,

A presidente da Ubes, Rozana Barroso
A presidente da Ubes, Rozana Barroso (foto: CUCA DA UNE)

 

Rozana afirma que a entidade continuará alerta e se mobilizando.“Nós estamos de olhos abertos para a etapa do Senado Federal”, considera. A Ubes também estuda vias judiciais para tentar barrar os destaques caso sejam mantidos. Enquanto isso, mantém as mobilizações on-line para pressionar os senadores.

 

Presidente do Consed considera preocupante o texto que segue para o Senado


“De um lado ela (a aprovação da regulamentação) é positiva por trazer segurança a respeito do Fundeb em 2021. Não ter a regulamentação nos colocaria em um cenário de muita incerteza e de muitos riscos. Então essa é uma avaliação positiva”, ressalta o vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Vitor de Angelo. Mas ele também lembra pontos negativos.

 

O vice-presidente do Consed, Vitor de Angelo
O vice-presidente do Consed, Vitor de Angelo (foto: Consed / Reprodução)


Vitor ressalta que o que mais interessa é o conteúdo da regulamentação. Ele não considera ruim, mas reflete que o que foi aprovado, diferentemente do que estava no relatório original do relator Felipe Rigoni, não foi positivo porque avançou para alguns aspectos que têm sido questionados. Vitor se refere aos filantrópicos e financiar os terceirizados. Do ponto de vista do conteúdo, o vice-presidente julga bastante preocupante o texto que saiu da Câmara dos Deputados.

 

*Estagiário sob a supervisão da editora Ana Sá

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