violência e abuso

Projeto Curta Maria contra violência doméstica completa 15 edições

Projeto inspirado pela Lei Maria da Penha faz turnê por escolas públicas do DF para promover conscientização contra abuso e violência

Millena Gomes*
postado em 13/04/2022 19:29 / atualizado em 15/04/2022 22:23
 (crédito: Divulgação)
(crédito: Divulgação)

O projeto Curta Maria, voltado para a conscientização sobre violência doméstica, completa 15 anos neste mês. A iniciativa foi inspirada pelo surgimento da Lei Maria da Penha, criada em 2006, e já passou por duas escolas públicas do Distrito Federal, promovendo rodas de conversa e produções audiovisuais. Até maio, a ação será levada a mais oito escolas.

O projeto foi idealizado pela Casa de Educação Anísio Teixeira, em parceria com o Instituto AV3, e deve acolher pelo menos mil estudantes entre 15 e 18 anos, que estejam no ensino médio. A proposta é sensibilizar os alunos acerca da violência contra mulheres e meninas por meio de rodas de conversa com psicólogos e professores e da elaboração de vídeos curtos produzidos pelos próprios alunos.

Segundo a coordenadora-geral do Curta Maria, Jacira Siqueira, o projeto também tem o objetivo de atender aos artigos 1º e 3º da Lei 8.313, referentes ao incentivo e formação artística e cultural. Por este motivo, o concurso premia, por meio de patrocínios, os cinco melhores vídeos entre as dez escolas.

Ela também conta que, a partir do projeto, os estudantes se sentem encorajados a denunciar abusos e violências dentro do núcleo familiar ou praticados pessoas próximas. “Nós já tivemos 1.200 alunos, já chegamos a ajudar pelo menos 50 que pediram ajuda diretamente”, conta Jacira.

Com circulação apenas distrital nas escolas públicas, o Curta Maria já entrou para as páginas do Banco Mundial e foi contemplado pela Casa da Mulher Brasileira como exemplo de boas práticas, em 2016. Em 2017, a ONU reconheceu o projeto ativista, que foi tema de abertura do painel ONU Mulheres.

Encontro 

No último dia 13, os estudantes do CEM 01 de São Sebastião se reuniram para celebrar os 15 anos da Lei Maria da Penha. Esta foi a segunda das dez jornadas que serão realizadas entre abril e maio – Por um mundo sem violência contra mulheres e meninas.

Na sessão solene de abertura, a professora Maria José Rocha Lima (Zezé), idealizadora do Projeto Curta Maria, afirmou, que a Lei Maria da Penha chegou rompendo com a cultura milenar de que violência doméstica era uma questão privada, de foro íntimo e cultural, muito bem representada pelo ditado popular “em briga de marido e mulher, não se mete a colher".

A professora falou sobre a origem da Lei Maria da Penha. A norma recebeu esse nome porque foi criada a partir da luta de Maria da Penha Maia Fernandes por justiça, após sofrer várias agressões e tentativas de assassinato pelo marido, que acabaram a deixando paraplégica. Ela foi casada por 23 anos com Marco Antônio Herredia Viveros, um professor de economia e de administração, que a agredia e tentou matá-la duas vezes em 1983.

Na primeira tentativa de assassinato, ele a deixou paraplégica por um disparo de arma de fogo enquanto ela dormia; na segunda tentou assassiná-la por eletrocussão e afogamento. Após a segunda tentativa de assassinato, Maria da Penha tomou coragem para denunciá-lo, mas o cumprimento da pena foi ínfimo: apenas dois anos em regime fechado após 19 anos de julgamento. Esse fato levou o Centro pela Justiça pelo Direito Internacional e o Comitê Latino Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem), juntamente com a vítima, a formalizarem uma denúncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Nessa circunstância, o Brasil foi condenado por não ter na época suporte legal suficiente à proibição da prática de violência doméstica contra a mulher.

“Toda essa violência é resultado de normas e costumes milenares de submissão da mulher ao homem. É um dos efeitos desse poder masculino sobre a mulher, normatizado pelo estatuto do direito romano iuris corrigendo: o pai ou o marido tinha o direito de agredir a mulher fisicamente para corrigir seus hábitos ou forçá-la a obedecer as suas determinações. Embora o iuris corrigendo tenha sido revisto a partir da Constituição Federal, o costume do cachimbo deixou a boca dos homens tortas”, afirmou Zezé.

Reflexão

Já o advogado Daniel Nepomuceno falou sobre os aspectos jurídicos da Lei Maria da Penha, as informações técnicas sobre os mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar. Na sua conferência o palestrante, além de informar sobre os dispositivos da Lei Maria da Penha, ampliou o conhecimento dos jovens estudantes, apresentando as novas emendas que aperfeiçoaram a LMP, apresentou exemplos aos quais a lei se aplica e promoveu uma reflexão sobre a necessidade de conhecê-la para bem exigir a sua aplicação.

A professora e cineasta Marcela Tamm apresentou o Manual de Produção de Filmes, especificamente produzido por ela para o projeto. A cineasta, que é coordenadora de produção e autora e editora do Manual de Produção de Vídeos, realizou palestra orientando sobre os diferentes tipos de filme, entre longas e os curtas. Caracterizando os filmes para passar no cinema, os feitos para a televisão, os publicitários, os de propaganda política e os filmes para serem exibidos nas mídias sociais tais como facebook, instagran, whatsAPP ou Youtube. Discorreu ainda sobre as etapas de criação e destacou que, na jornada, o tema está previamente definido: a Lei Maria da Penha e a violência doméstica. Durante a tarde, ela acompanhou os estudantes no trabalho de produção e edição dos vídeos.

Experiência

A professora Jacira Siqueira, coordenadora geral desta 15ª Edição Especial, emocionou o auditório com relato da sua experiência pessoal, marcada por formas de violência dramáticas praticadas contra a sua mãe e irmãos que, segundo ela, “a transformaram e se converteram em energia para lutar contra todas as formas de violência contra a mulher”.

Em sua palestra intitulada "Precisamos falar sobre Violência Doméstica", Jacira apresentou as fases do ciclo da violência: Tensão - clima criado pelo agressor com agressões verbais, crises de ciúmes, ameaças, queixas e descontrole emocional; Violência - agressões físicas ou sexuais, morais e descontrole e ataques de fúria, seguida da fase do arrependimento, que alguns autores chamam de “a lua de mel”, caracterizada por arrependimento, juras de amor e promessas de que não acontecerá novamente, ciclo que se reproduz às vezes durante toda a vida do casal.

“Há quem insista que a promulgação da lei fez crescer os números de casos de violência. No entanto, o que cresceu foi a coragem e o amparo legal para denunciar, aumentando a consciência cultural da sociedade”, concluiu Juciara. 

Cronograma:

Escolas que irão receber o projeto Curta Maria 2022
ESCOLA DATA
Centro de Ensino Médio 02 de Brazlândia 08/04
Centro de Ensino Médio 03 do Gama Sul 11/04
Centro de Ensino Médio 01 de São Sebastião 13/04
Centro de Ensino Médio de Taguatinga Norte  26/04
Centro de Ensino Médio 01 do Paranoá 29/04
Centro de Ensino Médio Incra 8 de Brazlândia  04/05
Colégio Cívico Militar Centro Educacional 7 10/05
Centro de Ensino Médio 05 de Taguatinga 12/05
Centro Educacional Irmã Maria Regina 17/05
Centro de Ensino Médio 01 de Brazlândia 19/05

*Estagiária sob a supervisão de Ana Sá

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