Por Pedro Teberga*
A Inteligência Artificial deixou de ser novidade distante e já está incorporada à vida escolar, influenciando a forma como aprendemos, ensinamos e avaliamos. Ferramentas que geram textos, resumem conteúdos, produzem imagens ou corrigem provas estão ao alcance de um clique. A rotina das salas de aula mudou, mas escolas ainda operam em um vácuo normativo e pedagógico, sem diretrizes claras sobre como lidar com essas tecnologias. Nesse cenário, a iniciativa do Conselho Nacional de Educação para criar uma resolução sobre ouso da IA na educação é o primeiro passo necessário.
O CNE trabalha atualmente na elaboração de uma proposta com consulta pública que deve acontecer ao longo de setembro. A ideia é orientar o uso da IA na educação básica e também na formação inicial de professores, tornando sua presença obrigatória nos currículos de Pedagogia e Licenciaturas. Essa movimentação é inédita no país e pode posicionar o Brasil como referência no debate global sobre IA e educação, em um momento em que o tema ainda divide opiniões no mundo todo.
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Não é o caso de criação de uma disciplina nova, mas o reconhecimento de que a IA já está transformando a prática docente e a experiência de aprendizagem. O desafio não é tecnológico, mas formativo. Professores precisam entender o funcionamento dessas ferramentas, suas limitações, seus vieses, os riscos envolvidos e as oportunidades pedagógicas que oferecem. Isso exige um compromisso com a formação crítica e continuada, para que a IA seja usada como apoio à mediação humana, e não como substituta da relação professor-aluno.
Se usada sem critério, a IA pode aprofundar desigualdades. Alunos de escolas com mais recursos terão acesso a ferramentas melhores e a educadores mais preparados, enquanto outros podem ficar sujeitos a soluções automatizadas, pouco sensíveis às particularidades de cada estudante. Também há riscos relacionados à privacidade de dados, à reprodução de estereótipos e à redução da criatividade. Estabelecer diretrizes claras para o uso da IA contribui para reduzir desigualdades educacionais.
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Por outro lado, é inegável que a IA pode oferecer benefícios reais. Pode ajudar no diagnóstico de dificuldades, na personalização do ensino, na produção de materiais adaptados e no suporte à correção de atividades. Pode também liberar tempo dos professores para que se concentrem em tarefas mais humanas, como a escuta, o acolhimento e a construção de sentido com os alunos. Mas tudo isso só acontece se houver intencionalidade pedagógica e preparo profissional.
O momento é histórico. Pela primeira vez, o país pode estabelecer balizas éticas e pedagógicas para o uso de tecnologias que já moldam o presente e certamente farão parte do futuro. A consulta pública do CNE será uma chance rara de participação coletiva. O debate precisa sair dos fóruns técnicos e chegar às salas dos professores, às reuniões pedagógicas, às conversas com pais e estudantes. É mais do que acompanhar a inovação, trata-se de garantir que ela sirva a um projeto de educação comprometido com a autonomia, a equidade e o desenvolvimento humano.
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Esse movimento não deve impor limites, mas abrir caminhos. O uso da Inteligência Artificial na educação precisa ser conduzido com intencionalidade e responsabilidade. A escola do futuro está sendo construída agora. Acima de tudo, ela precisa ser um espaço deformação humana, não apenas tecnológica.
*Pedro Teberga é professor universitário e especialista em desenvolvimento de negócios digitais. Coordena e ministra cursos em instituições como Einstein, Inteli, ESPM, FGV, Centro Universitário Belas Artes e Faculdade Belavista. É professor visitante na NOVA SBE (Portugal).
