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Câmara Legislativa deve votar instalação de câmeras nas salas de aula

Políticos, professores, alunos e sindicato divergem a respeito da lei que visa instituir o Sistema de Registro de Atividades (SRA) nas instituições públicas de ensino do Distrito Federal.

A Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) deve votar, na próxima terça-feira (21/10), o PL 944/2024, de autoria do deputado distrital Thiago Manzoni (PL), que prevê a instalação de câmeras de áudio e vídeo dentro das salas de aula das escolas públicas do Distrito Federal. A ideia  é criar o Sistema de Monitoramento e Registro de Atividades (Simra).

O projeto estava previsto para ser votado na última terça-feira (14/10), às vésperas do Dia dos Professores, porém, por falta de quórum a data sofreu alteração. A sessão foi marcada por manifestações a favor e contra a proposta apresentada, que segundo o documento, sugere a implementação de um sistema comparado à caixa-preta de aviões dentro das salas de aula para “captação ininterrupta de áudio e vídeo das atividades desenvolvidas nas salas de aula das instituições públicas de ensino do Distrito Federal.”

O projeto, que agora será votado na próxima terça-feira (21), surge na forma de substitutivo do PL 1.211/2024, proposto pelo deputado distrital Roosevelt (PL). Ambos tramitam juntos na casa, a partir da anexação do proposto por Roosevelt ao proposto por Manzoni. 

Apesar da discussão realizada nesta terça, o projeto não foi votado e segue para tramitação e votação na próxima semana. Em publicação no perfil oficial de Manzoni, o deputado afirma: “Não vamos desistir”, além de apresentar um relato de Roosevelt, em que ele diz: “O espírito do projeto é trazer segurança ao professor, pai, aluno e toda a comunidade escolar”, afirma. 

Em nota publicada nas redes sociais do Sindicato de Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF), para a associação, o projeto é visto como “perseguição à docência “ e “censura à liberdade de cátedra”. Segundo a publicação: “A proposta é impor barreiras à liberdade de cátedra e ampliar a corrida contra a educação crítica e emancipadora.”

O que diz o PL 944/2024

A proposta apresentada pelo deputado Thiago Manzoni (PL) pretende tornar obrigatória a instalação de um sistema de segurança nas escolas públicas do DF e conta com cinco artigos direcionados à explicação de como o projeto será colocado em prática, além das regras a serem cumpridas. 

A partir de dados dos anos de 2019, 2017 e 2014, o autor justifica a criação do PL. Segundo a justificativa apresentada no documento, há um “claro avanço da indisciplina e da falta de respeito à autoridade do professor em sala de aula. Tal realidade tem roubado a paz desses profissionais e tornado, em muitos casos, impraticável o exercício da profissão.” O que salienta a importância do monitoramento. 

Ainda em sua justificativa, o autor cita: “Por outro lado, não é incomum que a conduta do profissional de educação em sala de aula também seja colocada em dúvida sob acusações que vão desde doutrinação ideológica até violências praticadas contra alunos”, dessa forma, conclui que, em ambos os casos, se faz necessário o uso de mecanismos comprobatórios para proteção dos educadores, mas também para utilização dos pais ao “exercerem autoridade sobre a educação de seus filhos.”

Divulgação/Jeremias Alves - Deputado Thiago Manzoni (PL)

Em resposta ao Correio, o deputado distrital, autor da proposta, Thiago Manzoni (PL) destaca a importância do projeto para sanar questões de violência nas instituições de ensino, além do desinteresse apresentado pelos estudantes, indisciplina e doutrinações ideológicas. Ao ser questionado a respeito das críticas recebidas pelo projeto, o parlamentar declara: “A maioria esmagadora das pessoas é favorável ao projeto, em especial os pais de alunos e os professores. De toda sorte, respeitamos a opinião minoritária de quem diverge.”

Opiniões 

A criação do PL conta com apoiadores e críticos da iniciativa. Para Kauê Souza Lima, 15 anos, estudante da rede pública, o projeto se faz necessário para a segurança dentro das salas de aula. Kauê afirma: “Acredito que aconteçam diversas coisas que os coordenadores das escolas não sabem e não conseguem intervir por falta de provas”, dessa forma, ele declara que “esse sistema ajudaria muito.” 

Em contrapartida, sob a perspectiva da professora alfabetizadora Caroline Miranda Marins, 23, o projeto que busca a implementação do Sistema de Monitoramento e Registro de Atividades (SIMRA) em salas de aula “está preocupado em fiscalizar a ação do docente, e não promover qualquer tipo de segurança.”

De acordo com a educadora, os problemas vão muito além do que ocorre nas unidades escolares, mas também passam pela desvalorização da classe e da educação como um todo. “Essa proposta, além de ser um potencial ataque à liberdade de cátedra, visto que essa fiscalização fortalece os ataques que os professores vêm sofrendo pela desvalorização da própria educação, também é um gasto que põe em detrimento as necessidades das escolas, como melhorias em infraestrutura e valorização profissional”, afirma Caroline. 

Ela destaca também que, apesar da iniciativa representar, por um lado, um meio de resguardo aos profissionais da educação em casos de violência como as noticiadas recentemente, por outro lado, segundo Miranda: “Sabemos que há uma onda de desvalorização e tentativa de combate a uma educação emancipatória, de viés crítico e, portanto, a possibilidade de proteção pode se tornar um fomento aos ataques ao professorado”, conclui. 

Arquivo pessoal - Caroline Miranda Marins, 23 anos

A professora finaliza dizendo: “A categoria não pode recuar, ainda que seja aprovado. Se recuarmos, perdemos direitos e falhamos em deveres no sentido de oferecer e mediar uma educação de qualidade.”

Posição do Sinpro-DF

O Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF), após a realização da sessão de terça-feira (14), na CLDF, requereu uma reunião com todos os 24 deputados(as) para debater o projeto em caráter de urgência, até segunda-feira (20/10). 

Por meio de nota enviada ao Correio, o Sinpro-DF declara: “A categoria do magistério público, organizada pelo Sinpro-DF, estará em peso na CLDF para dizer não ao PL 944. Reafirmamos: professor não é bandido. Exigimos respeito!”

No que diz respeito à opinião do sindicato quanto ao PL, eles afirmam: “Avaliamos que o PL 944 tem potencial risco à liberdade de cátedra de professores e professoras, pilar fundamental para um ensino dinâmico, crítico e criativo. O monitoramento constante pode inibir a necessária relação de confiança e a troca livre de ideias entre professores e estudantes.”

Além disso, a organização também destaca ter conhecimento sobre as situações de violência ocorridas no ambiente escolar, mas ressalta: “Este é um reflexo da violência social mais ampla, que atinge todas as esferas da sociedade. Combater este mal exige investimento na educação e políticas públicas profundas, não medidas de vigilância que tratam os sintomas, e não a causa do problema.”

Há ainda, em nota, pontos em destaque que sugerem o que deve ser prioritário ao governo: investimento em educação; valorização da categoria do magistério público; fim das salas de aula superlotadas; garantia de estrutura adequada para o trabalho dos professores; laboratórios, salas de informática, bibliotecas e outros recursos estruturais em todas as unidades escolares e ampliação do número de professores efetivos, com imediata redução do número de profissionais em contrato temporário.

Divulgação/ Palloma Barbosa/ Sinpro-DF -
Divulgação/ Palloma Barbosa/ Sinpro-DF -