Pratas da Casa

Empreendedoras sociais do DF são escolhidas para programa internacional

As brasilienses Ana Luiza Gabatelli e Luciana Padovez participam da Iniciativa Jovens Líderes das Américas (YLAI), promovida pelo Departamento de Estado dos EUA

Talita de Souza *
postado em 24/01/2021 15:39 / atualizado em 24/01/2021 15:49
Luciana é responsável por escola de empreendedorismo em Goiânia -  (crédito:  Estudio At/Divulgação)
Luciana é responsável por escola de empreendedorismo em Goiânia - (crédito: Estudio At/Divulgação)

As brasilienses Ana Luiza Gabatteli, 31 anos, e Luciana Padovez, 31, não se conhecem, mas têm muito em comum: são empreendedoras e estão entre os 18 brasileiros escolhidos, entre 2,3 mil candidatos, para participar da Iniciativa Jovens Líderes das Américas (YLAI) 2021.

O programa, promovido pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da América (EUA) desde 2015, capacita e promove o encontro de jovens empreendedores sociais de 37 países da América Latina, do Caribe e do Canadá.

O objetivo é desenvolver habilidades e competências dos participantes que fomentem o negócio criado por eles, de forma a transformar as regiões em que os empreendimentos estão localizados.

Esse também é o objetivo de Ana Luiza e Luciana. Graduada em letras — português do Brasil como segunda língua e mestre em linguística aplicada, pela Universidade de Brasília (UnB), Ana Luiza mantém um projeto social que oferece aulas de português para refugiados no Distrito Federal.

Já Luciana, doutora em administração com tese em ensino de empreendedorismo pela UnB, oferece aulas de empreendedorismo para capacitar mulheres de bairros periféricos, em Goiânia.

As empreendedoras iniciaram a jornada em 11 de janeiro, junto a outros 263 jovens, e, nos próximos três meses, receberão mentoria de organizações anfitriãs norte-americanas por quatro semanas; participarão de capacitações para liderança empreendedora e atividades interculturais.

Em edições regulares, os selecionados cumprem o programa nos EUA, mas, devido à pandemia, as atividades foram adaptadas para o ambiente virtual, processo que durou cerca de um ano.

O processo de inscrição e seleção, composto por preenchimento de formulário com a descrição do projeto social e entrevista com a Embaixada dos EUA, foi feito em 2019 e o resultado foi divulgado no mesmo ano.

}“Quando soube do resultado, fiquei feliz, mas a gente não acredita muito, né? A ficha demorou a cair. Soubemos em dezembro de 2019 e era para embarcar para os EUA em julho do ano passado, mas, com a pandemia, isso foi adiado”, conta Ana Luiza.

“Agora, a organização adaptou tudo para o on-line e, realmente, começamos. As coisas ficaram reais e estou a mil por hora. O contato com outros empreendedores, aprender com outros, as ideias fervilhando... Está sendo muito melhor do que pensei”, revela Ana Luiza.

Luciana também afirma que a troca diária com colegas de outros países é um dos pontos altos do programa. “Somos muitos e de vários países, mas somos parecidos em muitos aspectos. Temos a mesma empolgação e a mesma paixão para lidar com o negócio. Conhecer e trocar experiências é uma parte muito legal”, diz.

Aulas de português para refugiados

Ana Luiza criou escola para estrangeiros no DF
Ana Luiza criou escola para estrangeiros no DF (foto: Arquivo Pessoal)

Desde 2017, Ana Luiza Gabatteli decidiu utilizar o empreendimento criado por ela em 2012, a escola de português para estrangeiros Vila Brasil, para responder a uma necessidade emergente no Distrito Federal: o ensino da língua portuguesa para refugiados.

“Diferentemente de outras iniciativas que existiam, eu ofereci um serviço voluntário inovador: em vez de o refugiado vir até o local de estudo, o professor da minha escola vai até ele”, explica.

“Muitos refugiados não têm condições financeiras para custear transporte até o Plano Piloto, e isso fez diferença. Temos alunos de São Sebastião, Varjão, Paranoá e Taguatinga. Crescemos bastante e, em 2019, atingimos 100 alunos”, conta.

Com o YLAI, Ana Luiza busca conhecimento e networking para ampliar o projeto social e transformá-lo em uma organização não governamental (ONG) para promover capacitação técnica e profissionalizante aos refugiados, uma forma de inseri-los no mercado de trabalho.

Para isso, a empreendedora terá a ajuda da organização anfitriã, uma escola de inglês como segunda língua situada em Utah. “O dono, meu host, é um imigrante, foi do Peru para os EUA e entende a importância do meu projeto. Hoje, ele tem três empresas, mas chegou com apenas US$ 14”, diz.

“Já tive a primeira reunião com ele e tem sido muito legal. Ele está bem interessado e sinto que será uma parceria para além do programa”, afirma Ana Luiza, empolgada. Ela listou três desafios para trabalhar junto ao host: como angariar valores para ampliar o projeto, como tornar escalável e como aumentar o impacto social da iniciativa.



Espírito empreendedor

Esta não é a primeira vez que Ana Luiza aceita desafios para responder a necessidades à sua volta, sejam elas sociais ou profissionais. Ela criou a Vila Brasil porque percebeu que não havia locais para atuar após a conclusão da graduação de letras.

“Meu curso é destinado ao ensino de estrangeiros, surdos e indígenas, todos os que não têm português como língua nativa. Durante toda a graduação, eu ouvia que não tinha onde trabalhar, que teríamos que dar aula para brasileiro e eu não queria isso”, lembra. “Então eu pensei: ‘quer saber? Se não tem local, eu vou abrir um’”, conta.

Em agosto de 2012, seis meses após o término da graduação, a Vila Brasil foi inaugurada. A escola não tem espaço físico e, desde o início, os professores vão até os alunos para ministrarem as aulas.

Ana Luiza teve, na época, a parceria de uma colega professora. “Já dávamos aulas para estrangeiros que faziam intercâmbio na UnB e juntamos nossos alunos. No começo, éramos professoras, administradoras, contadoras, tudo”, diz.

“Fomos crescendo. A Embaixada do Canadá nos conheceu e se tornou nossa cliente desde o início. Atualmente, a escola tem 14 professores e vários alunos”, afirma. Hoje, ela se orgulha de ser dona de um empreendimento que é reflexo do que ela ama: culturas.

Ao concluir o ensino médio, a brasiliense fez um intercâmbio no Canadá e, por um mês, morou na casa de uma família receptora e estudou a língua nativa. “Eu quis fazer a viagem porque sempre amei cultura e línguas. Voltei com a sementinha de querer misturar experiências, por isso escolhi meu curso.”

“Hoje, vejo que vivo um combo de paixão por ensino mais línguas mais culturas”, afirma. “O YLAI vai me ajudar a levar isso além para mais refugiados.”


SAIBA MAIS


Vila Brasil - escola de português para estrangeiros
Informações: bit.ly/ProjetoPLAc
E-mail: acolhimento@cursovilabrasil.com.br
WhatsAapp: (61) 99188-7833

Para encorajar empreendedoras periféricas

Alunas do Sempreende social, projeto de luciana que será aprimorado pelo YLAI
Alunas do Sempreende social, projeto de luciana que será aprimorado pelo YLAI (foto: Arquivo Pessoal)

Empreender para ajudar mulheres em vulnerabilidade social a empreenderem. Essa é a meta da criadora da escola de empreendedorismo Sempreende, Luciana Padovez. Ela viu no YLAI a oportunidade de obter aprendizados para ampliar o projeto Sempreende Social, criado por ela em Goiânia com objetivo de ensinar pessoas periféricas a começarem um negócio.

“Tivemos duas edições do projeto e, até agora, funciona assim: uma ONG parceira seleciona as mulheres, e nós damos os cursos. Mas queremos ampliar isso para ter um impacto ainda maior”, diz. A brasiliense mudou-se para a capital goiana aos 2 anos com a família.

O plano é tornar a atividade não só constante, mas, também, escalável. “Queremos que o projeto não esteja apenas em Goiânia, mas em todo Brasil. Queremos treinar professores em todas as regiões para irem até esses locais vulneráveis e ensinarem o método”, conta.

Os cursos oferecidos no projeto social são semelhantes aos ministrados na escola Sempreende e abordam desde os primeiros passos para abrir um negócio até como exercitar a criatividade.



Visão de futuro

Outro objetivo de Luciana é tornar a própria escola um empreendimento escalável, além de reformular o negócio para também estar presente no ambiente virtual. “Os cursos eram totalmente presenciais. Nos planejávamos para estar on-line em pouco tempo, e 2020 acelerou o processo. Mas, queremos fazer da melhor forma”, conta.

“Inclusive, já estamos fazendo um processo de reposicionamento com base no que já conversei com minha host”, revela. A organização anfitriã de Luciana é uma startup de educação de Boston e também ajuda empreendedores a captar investimentos. No momento, a host a ajuda a construir o espaço virtual da empresa.

Este é mais um passo da longa carreira de Luciana no empreendedorismo. Exceto estágios feitos durante a graduação em administração na Universidade Federal de Goiás (UFG), entre 2007 e 2010, a empresária nunca trabalhou a não ser em seus próprios negócios.

“No fim do ensino médio, meus amigos pensavam no curso que fariam e eu em qual negócio abriria. Eu sempre quis ser empreendedora”, lembra. Em 2012, ela deu o pontapé na vida de empresária abrindo um restaurante. “Eu fiz tudo errado, tive dificuldades no ponto que escolhi e também com a precificação dos pratos. Depois de uns dois anos, comecei a lucrar”, relata.

Com a experiência, ela enxergou a oportunidade de ajudar outras pessoas a não cometerem os mesmos erros que ela. Foi quando começou o mestrado, em 2014, na UFG. “Lá eu fui convidada a criar um curso de extensão para ensinar pessoas a empreenderem. Se chama UFG empreende e existe até hoje”, comemora.

Em 2015, Luciana decidiu vender o restaurante para se dedicar apenas ao ensino. “Na época, muitas pessoas perguntavam por que não dávamos cursos fora da universidade. Eu pensei muito nisso”, lembra.

Refugiados em aula em domicílio com professor do projeto social de Ana Luiza
Refugiados em aula em domicílio com professor do projeto social de Ana Luiza (foto: Arquivo Pessoal)

Foi apenas durante o segundo ano de doutorado na UnB, em 2017, que ela decidiu criar a Sempreende. “Decidi criar uma escola de cursos livres, modelo tão comum fora do país, mas incomum aqui. Era uma forma de fazer o que amo e ajudar outras pessoas”, diz.


SAIBA MAIS

Sempreende - escola de empreendedorismo
Informações: www.sempreende.com.br
Contato: (62) 99903-0918


Nova edição do programa aberta


A Iniciativa Jovens Líderes das Américas (YLAI) 2021 abriu novo edital para beneficiar jovens responsáveis por projetos sociais. Confira as informações:


» Inscrições até 25 de fevereiro pelo site ylai.state.gov/apply

» Requisitos: ter de 25 a 25 anos no início doprograma; residir no Brasil; ter histórico de crescimento do próprio negócio ou empreendimento social por pelo menos dois anos; e ter proficiência em leitura, redação e conversação em inglês

» Dúvidas sobre inscrição: apply.ylaifellowship@irex.org

» Selecionados farão o programa entre 11 de outubro e 19 de novembro nos Estados Unidos

Conheça a lista dos 18 brasileiros selecionados para o YLAI 2021:


- Aline Maria Nogueira Machado (CE)

- Alonso Alves Pereira Neto (MG)

- Ana Luíza Gabatteli Vieira (DF)

- Daiany Mayara de Franca Saldanha (SP)

- Diogo Bezerra da Silva (SP)

- Emanuela Pinheiro Farias (RJ)

- Gabriel Rocha de Farias (RJ)

- Guilherme de Rosso Mancos (SP)

- Guilherme Pritsch Braga (RS)

- Gustavo Trindade Valio (SP)

- João Pedro de Góes Novochadlo (PR)

- Luciana Padovez Cualheta (GO)

- Ludymila Lobo de Aguiar Gomes (AM)

- Monique Rodrigues do Prado (SP)

- Natália Pietzsch (RS)

- Rafael de Paula Souza (RS)

- Raquel Guabiraba Ribeiro (RJ)

- Yasmim Barreto de Sousa (AM)

 

*Estagiária sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa

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