Júlia Christine*
postado em 17/08/2025 06:00 / atualizado em 17/08/2025 06:00
A vontade de seguir crescendo torna Maria Jurema Sampaio de Araújo Oliveira, 67 anos, uma profissional diferenciada na loja de cosmético e perfume em que trabalha há 32 anos. Mesmo com a influência da internet nas vendas, ela não ficou para trás e está sempre atenta às tendências da moda. Confira outras histórias de comerciárias que, mesmo diante de barreiras geracionais e do preconceito com a idade, mantêm-se em seus empregos e conquistam respeito dos chefes e colegas jovens. - (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Com mais de 50 anos, mulheres encontram no comércio a realização profissional. Apesar do preconceito que ainda ronda essa faixa etária, algumas empresas perceberam que a experiência, a empatia e a fidelidade dos clientes fazem dessas profissionais verdadeiros trunfos nas vendas. Independentemente dos desafios, elas provam que a idade pode ser sinônimo de vantagem competitiva.
Contraditoriamente, existem corporações que priorizam profissionais mais jovens por acreditarem que são “mais dinâmicas”, “modernas” ou “com a cara da marca”. O comportamento discriminatório, por sua vez, está enraizado na crença equivocada de que a idade mais avançada limita o ímpeto inovador. É comum que recrutadores tenham em mente que os profissionais com mais experiência seriam, consequentemente, mais limitados e desatualizados frente às novas tendências e tecnologias.
Maria Jurema Sampaio de Araújo Oliveira, 67 anos, prova que a idade não define sua capacidade. Sua postura, comprometimento e vontade de seguir crescendo a tornam uma vendedora exemplar. Há 32 anos na Lord Perfumaria, ela relata que, mesmo com as mudanças do comércio ao longo dos anos e a influência da internet nas vendas, não ficou para trás e está sempre atenta às atualizações da moda.
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“Mesmo mais velha, tenho que estar preparada. Se eu ficar para trás, este mundo novo passa por cima de mim. Diariamente, acompanho diversas blogueiras, sei o que elas estão passando no rosto, sei o que estão vestindo e o que estão fazendo. Procuro sempre ficar por dentro de todos os assuntos, para que, assim, consiga atender desde os clientes mais tradicionais até os mais jovens e visionários”, conta.
Além do carisma, da proatividade e do conhecimento do produto que está sendo vendido, Jurema aponta que a imagem pessoal conta muito na hora de captar a atenção do cliente. Ademais, estar bem arrumada ajuda a desconstruir a ideia de que mulheres mais velhas são “ultrapassadas” ou “desleixadas”. Essa maturidade vira um ativo visível, que inspira admiração e respeito. “Eu tenho 67 anos, não posso deixar as pessoas acharem que eu, por ser mais velha, não me cuido. O cliente se espelha no vendedor”, assegura.
A conquista de compradores com idades diversas é uma marca registrada do profissional que tem experiência. Apesar de estar enquadrada na terceira etapa da vida, Maria Jurema declara que exercer um bom atendimento e disparar nas vendas não tem a ver com juventude ou velhice, e sim com a postura profissional e assertiva. “Eu atendo adultos e idosos com a mesma postura com que recebo os adolescentes. Fidelizar o cliente está diretamente relacionado à forma como os tratamos”
Entre colegas de trabalho, ela relata que a convivência com mulheres mais jovens reflete uma troca geracional valiosa. “As mais velhas sempre vão aprender com as mais novas, e as mais novas vão aprender com as mais velhas. Eu, por ter mais experiência, ensino bastante como falar com o cliente, como passar segurança e firmeza. Elas, com paciência, me ensinam sobre os produtos e tendências”, finaliza.
Diretor da Lord Perfumaria, Ennius Muniz, 78, destaca que, na instituição, existe uma tradição de priorizar o recrutamento de vendedoras mais experientes. Além disso, devido à qualificação de longo prazo que as profissionais recebem, a permanência delas ao longo dos anos é de extrema importância. “Achamos que a experiência é fundamental no atendimento ao público. Também faz parte da nossa cultura manter a profissional por longos períodos, para que, assim, participem de cursos, viajem e se qualifiquem com excelência”, explica.
Quanto às diferenças entre as gerações de vendedoras, Muniz expõe grandes qualidades das mulheres que estão acima dos 50 anos. “Essas mulheres, diferentemente da juventude, são mais focadas e sabem o que querem. Algumas jovens profissionais ainda não estão decididas sobre o rumo que querem seguir na vida, são muito ansiosas e, nem sempre, se dedicam inteiramente”.
Maturidade
Com uma grande bagagem na área do varejo, Nancy Bragança foi vendedora durante muito tempo e, hoje, aos 56 anos, é gerente da Agilitá, onde comercializa peças de roupas. Ao longo dos anos, diversos aprendizados e experiências a levaram à maturidade. Todavia, a escuta do cliente foi fundamental para se destacar na área e chegar ao cargo atual.
“Com anos de experiência, aprendi muitas coisas, e uma das mais importantes foi ouvir o cliente. No geral, o cliente quer ser ouvido. As pessoas compram por muitos motivos e nem sempre é porque precisam de fato do produto. Aprendi que eu preciso do cliente, e não ele de mim. O comprador sempre será o protagonista”, conta.
Mesmo com a maturidade da meia-idade, Nancy pondera que, com as novas gerações, a mão de obra escassa e a concorrência vasta, as vendedoras precisam se reinventar diariamente. “Hoje, o cliente está mais exigente e informado. Com a internet, ele chega na loja já sabendo muito sobre o produto e a marca. Por esse motivo, o vendedor precisa ser mais do que alguém que vende — precisa encantar e criar conexão. Antigamente, bastava ter carisma e conhecer bem o produto”, afirma.
Como conselho, Bragança, com sinceridade, faz um apelo contra a vitimização das vendedoras mais velhas: “As limitações de cada uma estão na maneira como cada uma pensa e se comporta. A conquista e o crescimento profissional não têm a ver com a idade, mas com o profissionalismo. Devemos estar sempre abertas e dispostas a aprender e trocar vivências com os mais jovens. Muitos de nós, mais velhos, pecamos quando pensamos que não precisamos mais aprender”, termina.
Entre gerações
Érica Vilela Farage Bruno, 52, trabalha na Bali Automóveis, concessionária de veículos, e afirma amar o que faz, além de ter uma jornada de vendas de sucesso. Com uma fácil adaptação no comércio, trabalhar com vendedoras mais novas não foi um desafio com a chegada dos 50 anos. “Com elas, eu aprendo, me divirto e dou conselhos. É uma troca de experiências contínua”, compartilha.
A competitividade no mercado de trabalho é comum, principalmente quando empresas precisam bater metas. Quando se trata de uma disputa geracional, Vilela conta algo pouco comentado: a rivalidade entre as mulheres da mesma idade. “É muito raro ter disputa entre as vendedoras mais novas com as mais experientes. Infelizmente, o grande problema é a competitividade entre as mulheres mais velhas. Ciúmes e inveja acabam sendo normais nesse meio”, relata.
Giulia Kayane Lopes dos Anjos, 21, também trabalha na Bali Automóveis e tem o privilégio de ter companheiras mais velhas ao seu lado. Ela assegura: “Trabalhar com vendas, especialmente ao lado de mulheres tão fortes, competentes e engajadas, é um privilégio. Elas são referência de determinação e resultados. Mulheres que não apenas batem metas, mas superam expectativas com excelência. Por ser mais nova, tenho o privilégio de aprender com cada uma delas”.
Mesmo sem o desejo de seguir na área, Giulia se inspira e confessa que as colegas mais velhas têm qualidades únicas, provenientes da idade. “Com todos esses anos de experiência, elas sempre estão dispostas a ensinar, aconselhar e nos colocar para cima. Por meio dos conhecimentos delas, aprendi o valor de criar uma clientela fiel e tratar cada cliente com cuidado e respeito”, conclui.
O Valor da diversidade
Atuando há uma década na área de recursos humanos, Bárbara Nogueira, 34, afirma que a diversidade etária gera riqueza de ideias, mais empatia e inovação. “Quando você tem uma equipe multigeracional, há mais troca de perspectivas, o que enriquece a experiência do cliente. Vendedoras maduras, por exemplo, tendem a ouvir mais, entender melhor as entrelinhas e propor soluções mais personalizadas”.
Em um tempo em que tudo é automatizado, o toque humano faz a diferença. Por esse motivo, durante os atendimentos, as mulheres com mais idade se destacam. Nesse cenário, a experiência de vida se transforma em um grande ativo competitivo. “A maturidade traz calma, escuta ativa, bom senso e capacidade de gerar conexão verdadeira com o cliente. Essas mulheres costumam entender melhor as entrelinhas da comunicação, acolher diferentes perfis de consumidores e personalizar a experiência”, finaliza.
* Estagiária sob a supervisão de Ana Sá*