Por Denys Monteiro*
Certamente, você, leitor, conhece a parábola da formiga e da cigarra. A cigarra passava o verão cantando, enquanto a formiga trabalhava incansavelmente de sol a sol para garantir provisões para o inverno. Quando o frio chegou, a cigarra, sem reservas, sucumbiu à fome. A moral da história, repetida por gerações, reforça o valor da disciplina, da prudência e do trabalho duro. Virtudes que, sem dúvida, moldaram o ethos corporativo moderno.
Durante uma pausa para descanso em julho, aproveitei para finalizar a leitura do livro Die with Zero, do autor Bill Perkins, que me trouxe uma provocação: e se estivermos interpretando a fábula da cigarra e da formiga de forma incompleta?
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Na obra, Perkins sugere que, embora a formiga represente o arquétipo da responsabilidade, ela também pode simbolizar um estilo de vida excessivamente orientado ao acúmulo, o que negligencia o prazer, o descanso e as experiências significativas. Afinal, em nenhum momento da história a formiga faz uma pausa. Ela não canta, não celebra, não vive o verão.
Essa metáfora ganha contornos ainda mais relevantes quando aplicada à vida de executivos e líderes empresariais. Em um ambiente onde produtividade é moeda corrente e o tempo é constantemente negociado em nome de resultados, muitos profissionais se veem presos ao ciclo da acumulação. Seja ela de patrimônio, de conquistas ou de status, mas todas com a promessa de que, um dia, poderão usufruir de tudo isso. Mas e se esse “dia” nunca chegar?
Perkins defende que o verdadeiro patrimônio de uma vida bem vivida está nas experiências que colecionamos e não nos ativos que acumulamos. Ele chama atenção para o conceito de “dividendos emocionais”: memórias que geram valor ao longo do tempo, que se tornam mais preciosas à medida que envelhecemos e que, ao contrário dos bens materiais, não se depreciam.
Para líderes empresariais, essa reflexão é mais do que filosófica. É estratégica! O equilíbrio entre vida pessoal e profissional não é um luxo, mas uma necessidade. Executivos que cultivam experiências significativas tendem a desenvolver maior inteligência emocional, empatia e capacidade de tomada de decisão. Além disso, empresas que promovem culturas que valorizam o tempo pessoal colhem frutos em forma de engajamento, retenção de talentos e saúde organizacional.
A disciplina que nos leva ao sucesso profissional precisa ser acompanhada da coragem de viver o presente. Tirar férias, fazer pausas, estar com os filhos, visitar os pais, cultivar amizades... Isso não é antítese do sucesso, mas parte dele.
A fábula da formiga e da cigarra não precisa ser descartada. Ela continua valiosa, mas talvez seja hora de enxergá-la por outro ponto de vista. O executivo moderno não precisa escolher entre acumular ou viver. Ele precisa aprender a equilibrar. Porque, no fim, os melhores dividendos da vida não estão no extrato bancário, mas nas lembranças que carregamos e nas histórias que deixamos.
À propósito, escrevi este texto logo após retornar de 10 dias de férias com minha filha, a primeira viagem que fizemos somente nós dois. Uma experiência que, sem dúvida, gerou os dividendos mais valiosos que já recebi.
E você, que tipo de dividendos está cultivando? Só os financeiros ou boas experiências com quem você ama?!
*Denys Monteiro é CEO da ZRG Partners Brasil, empresa de solução em capital humano