A pouco mais de cinco semanas das eleições norte-americanas, Donald Trump recusou-se novamente a admitir se aceitará o resultado da votação de 3 de novembro. “Queremos ter certeza de que a eleição é honesta, e não estou certo de que ela possa ser”, afirmou a repórteres, pouco antes de embarcar para Charlotte, na Carolina do Norte. “Temos que ter muito cuidado com as cédulas. As cédulas — isto é um grande golpe”, acrescentou, em alusão ao voto por meio do serviço postal. As declarações do presidente repercutiram negativamente dentro do próprio Partido Republicano. “O vencedor das eleições de 3 de novembro será empossado em 20 de janeiro. Haverá uma transição ordeira, assim como tem ocorrido a cada quatro anos desde 1792”, disse Mitch McConnell, líder da maioria no Senado. “Os republicanos creem no Estado de direito, nós acreditamos na Constituição, e é isso que dita o que acontece em nosso processo eleitoral”, comentou John Thune, o segundo republicano mais influente no Senado. Na quarta-feira, ao ser questionado se assumiria o compromisso de transição pacífica, em caso de derrota, Trump respondeu: “Teremos que ver o que acontece em novembro”.
O magnata republicano envolveu-se em situação constrangedora, na manhã de ontem. Acompanhado da primeira-dama, Melania, Trump foi vaiado por um grupo de manifestantes, ao visitar o prédio da Suprema Corte e homenagear a falecida juíza progressista Ruth Bader Ginsburg. “Votem para tirá-lo!” e “Honre o desejo dela”, gritava a multidão, em referência a um pedido da magistrada para que sua substituta seja escolhida somente depois de 3 de novembro. As vaias ocorreram no momento em que o casal deixava o veículo, por volta das 10h (11h em Brasília). O tributo a Ginsburg foi rápido: Trump observou um minuto de silêncio diante do caixão coberto com a bandeira dos Estados Unidos e deixou o local, retornando à Casa Branca. Nas redes sociais, internautas criticaram o mandatário por supostamente ter usado a ocasião para publicidade.
Allan Lichtman, historiador político da American University (em Washington), afirmou ao Correio que teme pela lisura da votação. “Eu vejo um grande risco de Trump tentar roubar a eleição, se parecer que ele está em desvantagem. Ele tem dito que deseja se livrar de algumas cédulas de voto a distância, as quais acha que não o favorecerão”, advertiu. “Não importa o que os republicanos digam agora, eles mostraram que apoiarão Trump, ainda que se comporte de forma ultrajante.” O estudioso previu a vitória de Biden em 3 de novembro — ele tem acertado todos os prognósticos desde 1984.
Apesar do desejo expresso por Ruth Ginsburg, Trump parece determinado a anunciar o nome da substituta da juíza amanhã, às 17h (18h em Brasília), em pronunciamento na Casa Branca. “Acho que tudo vai correr muito bem, que vai muito rápido”, disse o presidente à emissora Fox Radio. “Temos cinco mulheres e gosto de todas”, acrescentou. Trump avisou que entre as finalistas está Bárbara Lagoa, juíza conservadora de Miami e de origem hispânica.
Até o falecimento de Ginsburg, acometida por um câncer de pâncreas, a Suprema Corte contava com cinco juízes conservadores e quatro liberais. Com a decisão de Trump, a hegemonia da direita poderá ser garantida por mais de uma geração, segundo especialistas — a máxima instância do Judiciário ficaria com seis conservadores e apenas três progressistas. A Suprema Corte tem papel decisivo em temas importantes para a vida do norte-americano, como o direito ao aborto, o matrimônio homossexual, o acesso à saúde e questões relacionadas à imigração. A indicação de um magistrado foi mote da campanha eleitoral do republicano, em 2016.
Um dia depois de visitar Charlotte, na Carolina do Norte, o democrata Joe Biden rendeu um tributo a Ginsburg com um vídeo publicado no Twitter. “Nós somos uma nação mais justa e mais igual por causa da juíza Ginsburg. Agora, cabe a todos nós continuar sua luta”, escreveu.
China
A China indignou-se, ontem, na ONU, com os Estados Unidos, que mais uma vez a apontaram como responsável pela disseminação do coronavírus no mundo, durante reunião por videoconferência do Conselho de Segurança sobre o futuro da governança global. “Já chega! Já criaram problemas suficientes no mundo!”, disse Zhang Jun, embaixador chinês na ONU, à embaixadora americana Kelly Craft, sob o olhar impassível do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres. “Antes de apontar o dedo aos outros, qual é a causa dos 7 milhões de casos de infecção e mais de 200 mil mortes nos Estados Unidos?”, questionou o embaixador chinês, acusando Washington de espalhar “o vírus da desinformação”, de “mentir” e de “enganar”.
O presente milionário de Michael Bloomberg
O bilionário Michael Bloomberg enviou US$ 6 milhões à Flórida para ajudar a campanha de Biden a ganhar o voto hispânico, um eleitorado que está inclinado para Trump neste estado, graças ao apoio dos cubano-americanos. Os fundos são parte dos US$ 100 milhões que o ex-prefeito de Nova York anunciou, dez dias atrás, que gastaria na Flórida a favor da campanha de Biden, neste estado crucial para as eleições de 3 de novembro, informou o comitê político Priorities USA. “Trump fomentou a divisão em nosso país, inclusive por meio de seus ataques implacáveis contra a comunidade latina”, disse Bloomberg. “Mas, em novembro, os eleitores hispânicos desempenharão um papel fundamental nas eleições.”
Democracia em xeque
Em evento na Universidade George Washington, na capital dos Estados Unidos, o senador progressista Bernie Sanders (foto) advertiu que as eleições de 3 de novembro são uma disputa entre Donald Trump e a democracia. “Esta não é apenas uma eleição entre Trump e Joe Biden. Esta é uma eleição entre Donald Trump e a democracia — e a democracia deve vencer”, afirmou. De acordo com Sanders, o atual ocupante da Casa Branca tem pouco respeito pela Constituição americana e pelo Estado de direito. “Hoje, a transição pacífica do poder, o alicerce da democracia dos EUA, está sendo ameaçada como nunca antes”, alertou o senador, ao ser citado pelo site The Hill.
Ataque à duquesa de Sussex
Aparentemente incomodado com os comentários de Meghan Markle (foto) sobre as eleições nos EUA, Trump atacou a atriz e desejou, ironicamente, “boa sorte” a seu marido, o príncipe Harry. Markle, ex-estrela de Suits e atual duquesa de Sussex, convocou outros americanos a votarem, ao falar durante programa na rede ABC, na terça-feira. “A cada quatro anos, somos informados: ‘Esta é a escolha mais importante da nossa vida’. Mas é”, convocou. Questionado sobre os comentários da atriz, Trump disse aos repórteres: “Não sou fã dela”. “Desejo boa sorte a Harry, pois ele vai precisar.” Harry, que surgiu ao lado de Meghan no programa de televisão, declarou: “À medida que nos aproximamos de novembro, é vital que rejeitemos o discurso de ódio, a desinformação e os ataques na internet”. Nem Meghan, 39 anos, nem Harry, 36, mencionaram Trump diretamente.
Carta de apoio a democrata
“Nós somos ex-funcionários públicos que devotamos nossas carreiras, e, em muitos casos, as nossas vidas, pelos EUA”, afirmam os 489 signatários de uma carta pública de apoio a Joe Biden. A missiva foi divulgada pela organização Líderes da Segurança Nacional por Biden, e traz os nomes de generais, almirantes, suboficiais e embaixadores, entre outros. Segundo eles, Biden tem “o caráter, os princípios, a sabedoria e a liderança necessária para abordar um mundo em chamas”.
39 dias
Tempo restante para as eleições presidenciais dos Estados Unidos. Na próxima terça-feira, Trump e Biden travarão o primeiro debate
Sobrinha processa magnata
Mary Trump decidiu processar o tio (o presidente Donald Trump) e dois irmãos do republicano por alegações de que o trio cometeu fraude para privá-la de seus interesses nos negócios da família Trump e se enriquecer. Em julho passado, Mary lançou o livro Too Much and never enough: how my family created the world’s most dangerous man (“Demais e nunca o suficiente: como a minha família criou o homem mais perigoso do mundo”) — que traz informações comprometedoras sobre o magnata republicano.
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Mais de 120 prisões em protestos raciais
A polícia de Kentucky prendeu 128 manifestantes, ente a noite de quarta-feira e a madrugada de ontem, na cidade de Louisville. Os protestos foram provocados pela decisão da Justiça de não culpabilizar por assassinato a nenhum dos policiais envolvidos na morte da afro-americana Breonna Taylor. Os atos espalharam-se por várias cidades dos Estados Unidos, como Nova York, Los Angeles, e a capital, Washington. No entanto, o epicentro foi Louisville, em Kentucky, a cidade de Taylor. Aos 26 anos, a mulher morreu durante um tiroteio com a polícia em seu apartamento, em março.
Depois da decisão do tribunal, na quarta-feira, milhares de pessoas caminharam pelas ruas da cidade para exigir justiça para a enfermeira, que se tornou um dos símbolos dos protestos contra a violência policial e o racismo nos Estados Unidos. As manifestações, inicialmente pacíficas, tornaram-se violentas. Vários participantes entraram em confronto com a polícia, que usou granadas para dispersar o protesto. Dois policiais foram baleados no tumulto. Ambos sobreviveram e estão hospitalizados, em condições estáveis.
“Houve um total de 128 prisões durante o protesto de ontem (quarta-feira) à noite e nesta manhã (ontem)”, declarou o porta-voz da polícia local, Dwight Mitchell, à agência France-Presse (AFP). Entre os detidos, está um suspeito da tentativa de assassinato dos dois policiais, informou a imprensa local.
Taylor morreu na noite de 13 de março, quando três agentes à paisana entraram em sua casa com um mandado de busca e apreensão. Depois que o namorado da enfermeira abriu fogo contra os agentes, supostamente por tê-los confundido com ladrões, eles atiraram e vários dos disparos atingiram a jovem.
Mais de seis meses depois, um grande júri decidiu, na quarta-feira, processar um desses policiais, Brett Hankison, por colocar em risco a vida de outras pessoas — neste caso, três dos vizinhos da vítima. Mas, nem Hankison nem os outros dois policiais que usaram suas armas na casa de Taylor foram acusados por sua morte. “Nada parece mostrar que Breonna importava”, afirmou Ben Crump, o advogado da família da vítima, ao programa de televisão Today, da NBC.
Toque de recolher
As autoridades de Louisville impuseram toque de recolher entre as 21h de ontem e as 6h30 de hoje. Grande parte do centro dessa cidade de 600 mil habitantes encontra-se fechada para o trânsito, e vários armazéns protegem suas vitrines com tábuas contra a possibilidade de novas manifestações. “Haverá mais violência esta noite. As pessoas estão cansadas”, afirmou Marcus Reede, de 52 anos, dono de um restaurante em Louisville, à AFP. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que fez do slogan “lei e ordem” um dos motores de sua campanha para as eleições de 3 de novembro, escreveu no Twitter que estava “em oração” pelos policiais hospitalizados.