EUA

Biden sai em vantagem após a agressividade de Trump em debate

Pesquisas e especialistas apontam vitória do democrata durante o debate de terça-feira, marcado por ofensas. Ex-vice de Barack Obama chama Donald Trump de ''vergonha nacional''. Denúncias de fraude arranham imagem do republicano

Rodrigo Craveiro
postado em 01/10/2020 06:00
 (crédito: Alex Wong/Getty Images/AFP)
(crédito: Alex Wong/Getty Images/AFP)

Ao mostrar agressividade e ao interromper o adversário Joe Biden, o presidente Donald Trump escolheu uma tática autodestrutiva durante o debate da noite de terça-feira, de acordo com a avaliação de especialistas. Não bastasse o evidente descontrole em vários momentos, o republicano evitou responder se aceitará uma derrota nas eleições de 3 de novembro e acusou fraude no voto pelo serviço postal. “O presidente dos Estados Unidos se comportou de uma maneira que considero uma vergonha nacional”, disse Biden. As pesquisas realizadas depois do debate apontam para uma vitória do democrata no duelo travado em Cleveland (Ohio). De acordo com a enquete da emissora CBS e do site YouGov, 48% dos norte-americanos consultados viram um desempenho melhor de Biden, contra 41% para Trump. A pesquisa feita pela TV CNN, porém, mostra que o ex-vice de Barack Obama venceu o debate para 60% dos entrevistados contra 28% para o magnata republicano. Ontem, o próprio Obama enviou mensagem de apoio ao amigo. “Joe sabe que isso não é sobre ele — é sobre nós. Faça seu plano para votar agora. Temos de votar como se nossa democracia dependesse disso. Porque é verdade”, escreveu no Twitter.

Os dois candidatos não perderam tempo e retomaram a campanha. Biden fez uma viagem de trem, acompanhado de simpatizantes, pelos estados de Ohio e da Pensilvânia. Trump participou de evento de campanha em Duluth, em Minnesota. Antes de embarcar, alfinetou o rival. “Ninguém quer Joe Sonolento como líder, incluindo a esquerda radical (a qual ele perdeu na noite passada!). Ele desrespeitou Bernie (Sanders, senador), efetivamente chamando-o de perdedor”, disse o magnata. Uma ala do Partido Republicano vê com preocupação o desempenho de Trump por entender que contribuiu para arranhar a imagem do presidente e seu projeto de reeleição. Isso teria ficado evidente nas assertivas de que não haveria meios de organizar uma eleição livre de fraude.

Em entrevista ao Correio, James Naylor Green — historiador político da Universidade Brown (em Rhode Island) — admitiu que a performance de Trump foi “um desastre”. “Ela apenas serviu para fortalecer o seu apoio entre a base de direita. Mas, certamente, não ganhou nenhum suporte entre aqueles que não têm certeza sobre em quem planejam votar”, avaliou. “Isso é especialmente verdade entre as mulheres universitárias de cor branca, que fortemente respaldam Biden. A agressividade incontrolável de Trump e o tratamento dispensado a Biden fizeram o presidente perder votos. Ao mesmo tempo, o republicano nada ofereceu em relação aos planos em um novo mandato e foi incapaz de mudar a narrativa em seu favor.”

Por sua vez, David Dulio, diretor do Centro de Engajamento Cívico do Departamento de Ciência Política da Universidade de Oakland, em Rochester (Michigan), acredita que Biden se saiu melhor. “Ele pôs por terra o padrão de qualidade estabelecido pela campanha de Trump, nas últimas semanas, quando o Partido Republicano questionou a idade do democrata e sua perspicácia mental”, disse ao Correio. “Biden não cometeu nenhum grande erro durante o debate; então, deixou essas preocupações de lado, pelo menos por enquanto.”

Apesar disso, Dulio demonstra ceticismo em relação a uma influência do debate de anteontem na campanha. “Não acho que isso tenho mudado muito a corrida eleitoral. As pessoas geralmente já se decidiram sobre Trump, de uma forma ou de outro. O número de eleitores ‘indecisos’ é pequeno. Não sei se eles conseguiram assistir ao debate por muito tempo”, ironizou. O estudioso da Universidade de Oakland também ressalta que o candidato derrotado iniciará uma ou várias contestações nos tribunais.

Racismo

O tema do racismo ressoava, ontem, horas depois do embate em Cleveland. “A supremacia branca não tem lugar na América. Nós não deveríamos ter de implorar ao presidente dos Estados Unidos para dizer isso”, lembrou Biden, no início da noite. Trump recuou e pediu às milícias de extrema direita que se retirassem e deixassem “as forças da ordem fazerem seu trabalho”. No debate de terça-feira, ele havia convocado o grupo “Proud Boys” a “retroceder e aguardar”. Antes de partir para Minnesota, o magnata desconversou: “Não sei quem são os ‘Proud Boys’”.

Green adverte que Trump instou a milícia a sabotar as eleições e a apuração de votos. “A chave está em 16 estados, que começaram a contar os votos antes de 3 de novembro e que serão capazes de anunciar o resultado naquela noite. Se Biden vencer em todos eles, por grandes diferenças, enviará uma mensagem de que lidera a corrida, ainda que leve mais de uma semana para a apuração das cédulas dos correios. Durante esse período, os republicanos e Trump farão tudo o que puderem para bloquear a contagem dos votos.”

» Pontos de vista

Por James Naylor Green

Derrota inevitável
“Trump está atrás em todas as pesquisas e, principalmente, nos swing states. Não acho que o anúncio de uma vacina contra a covid-19 ou qualquer outra eventual surpresa, em outubro, mudará o resultado das eleições de 3 de novembro. Por isso, o presidente republicano insiste que, se não ganhar a eleição, será por causa de uma fraude. Trump prepara-se para desafiar os resultados das eleições de muitas formas.” Historiador político da Universidade Brown (em Rhode Island).

Por David Dulio

Chance desperdiçada

“Até certo ponto, é verdade que Trump perdeu a chance de mudar o curso da disputa presidencial, no último debate. Algumas oportunidades se apresentaram, e o republicano não conseguiu tirar vantagem delas — como na discussão sobre a reforma da Justiça criminal, aprovada de forma bipartidária e sancionada por ele. As declarações de Trump sobre fraude não foram terrivelmente diferentes do que ele já disse sobre o tema.” Diretor do Centro de Engajamento Cívico do Departamento de Ciência Política da Universidade de Oakland, em Rochester (Michigan).

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