SAÚDE

Vacinação no Reino Unido é nova etapa na luta contra a pandemia

Reino Unido inicia, na próxima semana, a primeira campanha em massa de vacinação contra a covid-19. Premiê Boris Johnson qualifica a aprovação da fórmula como "fantástica". Idosos em asilos e profissionais da saúde terão prioridade. Rússia prepara a imunização de civis

Rodrigo Craveiro
postado em 03/12/2020 06:00
 (crédito: AFP / JUSTIN TALLIS)
(crédito: AFP / JUSTIN TALLIS)

A vacina contra a covid-19 saiu dos laboratórios e tornou-se uma realidade. A partir da próxima semana, o Reino Unido aplicará as primeiras 800 mil doses do imunizante, depois de se transformar, ontem, na primeira nação a aprovar o uso da fórmula da Pfizer/BioNTech. “Nós esperávamos pelo dia em que os cientistas nos dessem o poder para impedir que o inimigo nos faça doentes. Agora, os cientistas o fizeram. (…) Somos o primeiro país do mundo a encomendar a vacina da Pfizer, assegurando 40 milhões de doses. Estamos preparando o maior programa de imunização em massa da história do Reino Unido, a qual começará na semana que vem”, declarou o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, que classificou a notícia como “fantástica”.

Mais cedo, o premiê tuitou que “a proteção das vacinas finalmente nos devolverá nossas vidas e fará a economia se mover de novo”. A vacinação não será compulsória e vai priorizar idosos em asilos e seus cuidadores, além da população com mais de 80 anos e os profissionais da área da saúde.

O imunizante da Pfizer/BioNTech foi desenvolvido a partir de uma técnica inovadora: o RNA mensageiro — a vacina usa sequências do RNA para fazer com que o corpo humano desenvolva anticorpos para criar uma resposta imunológica.

O anúncio de Johnson levou o presidente da Rússia, Vladimir Putin, a pedir às autoridades sanitárias do país que iniciem as imunizações “em larga escala” contra o coronavírus (Sars-CoV-2) até o fim da próxima semana. “Eu sei que mais de 2 milhões de doses já foram produzidas ou serão produzidas nos próximos dias”, acrescentou o líder russo, especificando que “grupos de risco, médicos e professores” serão vacinados primeiro. A vacina russa, chamada de Sputnik V, encontra-se na terceira e última fase de testes clínicos com 40 mil voluntários e teria eficácia de 92%.

Enquanto a fórmula russa desperta dúvidas na comunidade científica, o governo britânico assegura que a vacina da Pfizer/BioNTech cumpre com “normas estritas de segurança, eficácia e qualidade”. O índice de eficiência registrado nos testes clínicos foi de 95%. O Reino Unido terá, pela frente, um complexo desafio logístico. A vacina precisa ser armazenada a 70 graus Celsius abaixo de zero e vem em embalagens com 975 doses que não podem ser divididas em lotes menores. Para ter proteção total, é necessário a administração de duas doses em um intervalo de 21 dias — no 12º dia, o corpo começa a construir imunidade, a qual estará completa no 28º. Uma rede de 50 hospitais se encarregará das aplicações.

Especialista em vacinas contra infecções emergentes e professor de medicina da Universidade de Massachusetts (EUA), Shan Lu considerou o anúncio de Londres como “um passo muito significativo”. “É a primeira vacina contra a covid-19 oficialmente aprovada com base em ensaios da fase três. Pode ser o ponto de virada da pandemia. Muitas pessoas começarão a ser imunizadas, retardando a transmissão do Sars-Cov-2”, afirmou ao Correio o também ex-presidente da Sociedade Internacional de Vacinas.

Inovação

Segundo Lu, mesmo que aprovada para uso emergencial, a vacina contra a covid-19 baseada em mRNA indica um tipo completamente novo de imunizantes aprovados para uso da população em larga escala. “Não podemos dizer, com certeza, se ela substituirá outros tipos de fórmulas. Esperamos ver mais vacinas de mRNA desenvolvidas para outros alvos de patógenos. Se terão o mesmo sucesso que a vacina da Pfizer/BioNtech, isso ainda não se sabe”, comentou.

O professor destaca a importância de se ter vacinas fabricadas com bom perfil de segurança e eficácia e proteção, desde que os fabricantes e as agências reguladoras sigam uma operação ética e bem planejada dos testes clínicos. “Será perigoso se a corrida para o desenvolvimento de vacinas basear-se puramente no terreno do nacionalismo. A comunidade global precisa trabalhar em conjunto para compartilhar ciência, tecnologia, recursos, experiência e disponibilidade de vacinas licenciadas. Qualquer sucesso baseado em um ou em poucos países não será capaz de alcançar o controle total da pandemia.” A Pfizer/BioNTech e nenhuma das fabricantes publicaram resultados da fase três dos teste clínicos em revistas científicas — os estudos não foram revisados por outros especialistas da área.

Por sua vez, Michael Head, especialista em saúde global pela Universidade de Southampton (Reino Unido), admitiu que o início da imunização é um “grande momento” para o mundo. “A pandemia provocou enorme fardo, e isso pode ser o primeiro passo para superarmos o coronavírus”, disse à reportagem.

A BioNTech, empresa alemã fundada em 2008 pelo casal turco Ugur Sahin e Özlem Türeci, comemorou o avanço. “A autorização para uso emergencial no Reino Unido marcará a primeira vez em que cidadãos à margem dos testes clínicos terão a chance de serem imunizados”, afirmou Sahin, para quem a vacinação reduzirá as” hospitalizações entre os grupos de risco. Albert Bourla, diretor da Pfizer, declarou que a aprovação da vacina “marca um momento histórico na luta contra a covid-19” . Até o fechamento desta edição, o mundo registrava 64,3 milhões de infecções e 1,48 milhão de mortes. No Reino Unido, 1,6 milhão de pessoas contraíram o coronavírus e 59,1 mil morreram.

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Os cientistas falam

 (crédito:                Arquivo pessoal                    )
crédito: Arquivo pessoal


“É possível que este seja o começo do fim da pandemia. Não apenas por conta dessa vacina baseada em mRNA, em particular, mas pelo fato de que muitos outros tipos de imunizantes serão desenvolvidos, testados e, possivelmente, apresentarão uma proteção similar. Se o progresso atual da tendência de desenvolvimento de vacinas persistir, começaremos a ter o controle total da pandemia da covid-19, embora isso ainda possa levar algum tempo.”

Shan Lu, professor de medicina da Universidade de Massachusetts, especialista em vacinas contra infecções emergentes e ex-presidente da Sociedade Internacional de Vacinas

 

“Nós precisamos vacinar a maior parte da população mundial para encerrarmos, de forma adequada, a pandemia. Isso levará muito tempo. Portanto, o anúncio do premiê Boris Johnson é o primeiro passo para colocarmos a covid-19 sob controle. Precisamos ver os resultados da vacina russa, junto com as outras principais candidatas. Como necessitamos de bilhões de doses para imunizar o mundo, é preciso que mais de uma vacina seja aprovada.”

Michael Head, pesquisador em saúde global pela Universidade de Southampton (Reino Unido)

 

Ex-presidente da França morre de covid-19

 (crédito: Thierry Zoccolan/AFP)
crédito: Thierry Zoccolan/AFP


O ex-presidente francês Valéry Giscard D’Estaing, de 94 anos, faleceu, ontem à noite, “rodeado pela família”, no centro da França, por complicações relacionadas à covid-19. O centrista Giscard D’Estaing foi chefe de Estado entre 1974 e 1981. Ele havia sido hospitalizado diversas vezes nos últimos meses por problemas cardíacos. D’Estaing, que residia desde o início do confinamento em sua casa, no campo, foi internado no serviço de cardiologia do hospital de Tours, entre 15 a 20 de novembro. O ex-presidente, que comemorou seu 94º aniversário em 2 de fevereiro, fez uma de suas últimas aparições públicas em 30 de setembro de 2019, no velório de outro ex-líder francês, Jacques Chirac, que foi seu primeiro-ministro de 1974 a 1976.

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