Em eleições legislativas não reconhecidas por quase 50 nações, entre elas o Brasil, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, retomou o controle da Assembleia Nacional e desferiu mais um golpe contra a oposição, que acusou uma fraude e um fracasso contundente ante o elevado índice de abstenção. “O povo da Venezuela demonstrou ao mundo sua imensa vocação democrática. Somos um país que deseja a paz, o diálogo, a recuperação, a harmonia e o respeito à nossa autodeterminação. Estamos de pé, na batalha e na vitória!”, escreveu o líder chavista. “Começou uma nova etapa de reconstrução do Parlamento e recuperação de nosso país.”
Até o fechamento deste texto, com 98,6% dos votos apurados e uma participação de 30,5% dos eleitores inscritos, a aliança Grande Polo Patriótico, formada por partidos pró-Maduro, obteve 68,43% dos votos. O Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) conseguiu eleger 75% dos deputados. Desde 2015, a opositora Mesa de Unidade Democrática (MUD) formava a maioria na Assembleia, após 15 anos de hegemonia chavista.
Juan Guaidó, presidente autoproclamado da Venezuela, convocou um plebiscito, entre ontem e sábado, cujo objetivo é manter intacta a atual legislatura até a realização de “eleições livres, verificáveis e transparentes”. “Não houve eleição ontem (domingo). Nos chantagearam e simplesmente não aceitamos”, afirmou, em entrevista coletiva. Em declaração conjunta assinada com 15 países, incluindo o chamado Grupo de Lima, o governo do Brasil reiterou que as eleições “organizadas pelo regime ilegítimo de Nicolás Maduro, carecem de legalidade e legitimidade” e denuncia que elas ocorreram “sem as garantias mínimas de um processo democrático, de liberdade, segurança e transparência, e sem integridade dos votos, participação de todas as forças políticas ou observação internacional”. O comunicado do Itamaraty também exorta a comunidade internacional a se unir na rejeição a essas “eleições fraudulentas” e a “apoiar os esforços para a recuperação da democracia, do respeito pelos direitos humanos e do Estado de direito na Venezuela”.
Os Estados Unidos, por meio do chefe da diplomacia, Mike Pompeo, avisou que seguirá reconhecendo Guaidó como presidente em exercício e acusou Maduro de ter roubado as eleições de 2018, quando a oposição boicotou o pleito. A União Europeia lamentou a inexistência de “padrões internacionais mínimos” de transparência na votação de domingo. Aliada de Maduro, a Rússia, do presidente Vladimir Putin, elogiou o processo e assegurou que o mesmo “foi organizado de forma mais responsável e transparente do que em alguns países que têm o costume de se apresentar como exemplo de democracia” — uma crítica indireta aos EUA.
Planos e revolta
Leopoldo López, um dos principais líderes da oposição e fundador do partido Voluntad Popular, exigiu a realização de eleições livres em um prazo entre 6 e 12 meses. “Isso é imprescindível para resolver a crise política e retornar a ordem constitucional e democrática da Venezuela”, declarou ao Correio. Exilado em Madri, López também sugeriu que militares aliados a Maduro “decidam evitar traumas ao povo, em troca de alguns benefícios que a Justiça internacional manifestou concordância”.
Deputado da Assembleia Nacional pelo partido de López, Luis Stefanelli reagiu com revolta à proclamação de vitória de Maduro. “Pretender substituir-me por um palhaço? Nunca!”, disse à reportagem. “Para eu entregar meu cargo, tem de haver uma eleição livre, democrática e com todas as condições. É minha responsabilidade constitucional, enquanto parlamentar, fazer valer as leis e a Constituição de meu país”, afirmou o parlamentar, exilado em Houston (Texas).
Stefanelli acusa o regime de Maduro de ameaçar funcionários públicos e cooptar eleitores por meio do fornecimento de cesta básica. “O meu partido foi sequestrado e entregue a 15 escorpiões, deputados que foram vendidos. Estou no exílio por não aceitar uma oferta de US$ 1 milhão. Além de ter sequestrado os partidos, Maduro ampliou as cadeiras da Assembleia Nacional de 166 para 277. Todas as normas foram violadas.”
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