Atendimento médico

Médicos indianos travam batalha dramática contra a covid-19

A pandemia deixou evidente as fragilidades estruturais do sistema de saúde da Índia, especialmente nos hospitais públicos mal equipados e com financiamento insuficiente

Agência France-Presse
postado em 02/06/2021 09:48 / atualizado em 02/06/2021 09:49
 (crédito: DIPTENDU DUTTA/AFP)
(crédito: DIPTENDU DUTTA/AFP)

Esgotados por longas jornadas de trabalho, mal remunerados e traumatizados, os médicos indianos que estão na linha de frente da batalha contra a pandemia de covid-19 temem por suas vidas e famílias.

"Estamos sobrecarregados de trabalho, estressados e muito assustados", declarou à AFP Radha Jain, médica de Nova Délhi.

Desde o início de abril, a covid-19 matou pelo menos 165.000 pessoas na Índia, um país de 1,3 bilhão de habitantes, que tem algumas das cidades mais densamente povoadas do mundo.

Mais de 1.200 médicos morreram de covid-19 desde o início da pandemia, 500 deles nos últimos dois meses, de acordo com as estatísticas da Associação Médica da Índia.

Apesar da epidemia ter começado a registrar uma queda, a Índia contabiliza a cada dia mais de 3.000 mortes por causa do coronavírus e o sistema de saúde está em colapso.

O doutor Deependra Garg, que trabalha no subúrbio de Nova Délhi, sofreu uma tragédia em casa. Sua esposa Anubha, de 48 anos, médica e devidamente vacinada, contraiu covid-19 em abril.

Seu estado de saúde piorou e Garg teve que lutar, como tantos outros, para conseguir uma internação, pois todos os hospitais estavam lotados.

"Sem alternativa" 


Finalmente, Anubha foi internada em um hospital a 200 km de sua residência, onde faleceu duas semanas mais tarde, deixando uma filha de 12 anos.

"Estamos na linha de frente 24 horas por dia, sete dias da semana. Estamos expostos a uma alta carga viral, mas temos que continuar trabalhando contra todas as probabilidades porque escolhemos esta profissão. Não temos alternativa", disse o doutor Garg.

A pandemia deixou evidente as fragilidades estruturais do sistema de saúde da Índia, especialmente nos hospitais públicos mal equipados e com financiamento insuficiente.

O governo indiano gasta menos de 2% do PIB no atendimento médico, uma das menores taxas do mundo.

Durante a segunda onda da epidemia, várias notícias rodaram o país sobre hospitais com número insuficiente de funcionários, enfermos jogados no chão, leitos ocupados por vários pacientes e parentes que permaneciam nas unidades sem proteção.

A Índia, terceira maior economia da Ásia e sexta do mundo, tinha apenas 0,8 médico para cada 1.000 habitantes em 2017, uma situação equivalente a do Iraque, de acordo com os dados do Banco Mundial.

Brasil e Estados Unidos, os outros dois países mais afetados pelo vírus, tinham 2,2 e 2,6, respectivamente.

O setor de saúde da Índia tinha um déficit de pelo 600.000 médicos e dois milhões de profissionais de enfermagem antes do início da pandemia, de acordo com o instituto americano Center for Disease Dynamics, Economics and Policy.

Os hospitais foram obrigados a recorrer a estudantes no último ano de Medicina, destacou o médico Shekhar Kumar, que trabalha em uma unidade particular no estado de Uttar Pradesh (norte).

"Os pacientes precisam permanecer hospitalizados por mais tempo, o que aumenta a carga de trabalho e o risco", explicou Kumar.

Os médicos também estão traumatizados pela necessidade de decidir quem salvar devido à falta de medicamentos e oxigênio.

"Esta situação mudou a vida dos médicos", afirmou à AFP Ravikant Singh, fundador de uma organização que ajuda os hospitais de campanha.

"Não conseguimos salvar muitas vidas devido à falta de oxigênio", explicou.

Os médicos temem infectar suas famílias. Kumar está obcecado com a ideia de que o vírus "se esconde em todos os lugares, em qualquer lugar".

"Se os médicos não podem salvar a própria vida, como podem salvar a vida dos outros?", questiona, pessimista.

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