Praça Tiananmen (ou Praça da Paz Celestial), Pequim. No mesmo local em que 10 mil estudantes pró-democracia foram massacrados pelos tanques e pelos soldados chineses, em 4 de junho de 1989, o presidente Xi Jinping discursou durante a celebração dos 100 anos do Partido Comunista Chinês (PCC), às 10h25 de hoje (21h25 de ontem em Brasília). Ele assegurou que o renascimento da China é “um processo histórico irreversível” e associou este processo à existência do partido. “O povo chinês se levantou, e a era em que a nação era oprimida e intimidada acabou para sempre”, avisou Xi, também secretário-geral do PCC.
O líder comparado a Mao Tsé-tung, fundador da República Popular da China e do próprio partido, apontou o altruísmo como sucesso da PCC. “O Partido sempre representou os interesses fundamentais de todo o povo chinês e está com ele em todos os momentos. O Partido não tem interesses especiais próprios. Ele nunca representou qualquer grupo de interesse individual, grupo de poder ou estrato privilegiado”, declarou Xi. “O marxismo seguirá como a alma de nosso sistema. A capacidade de nosso partido e a fortaleza do socialismo com características chinesas são atribídas ao fato de que o marxismo funciona.”
Ao contrário do 70º aniversário da República Popular da China, em 2019, o evento de hoje não contou com demonstrações de poderio militar, à exceção do sobrevoo de caças e de helicópteros que, em formação, imitavam o número 100. Pouco antes do discurso de Xi, a emissora CCTV 13 exibiu reportagens nas quais cidadãos exaltavam o partido, que reúne 95 milhões de integrantes. A cerimônia começou com milhares de estudante entoando canções e fazendo gestos coreografados, com os punhos cerrados e ensaiando marcha. Um imenso tapete vermelho foi colocado por toda a extensão da praça, passando por baixo de um imenso arco com um martelo e uma foice. Sentados na tribuna da Porta Tiananmen, símbolo de Pequim e acesso principal à Cidade Proibida, Xi e os demais líderes do PCC ficaram de frente para 70 mil pessoas de todos os grupos étnicos chineses.
Anthony Saich, professor de assuntos internacionais e diretor do Centro Ash para Governança Democrática da Universidade de Harvard, prefere não comparar o atual presidente chinês a Mao Tsé-tung. “Xi comanda o sistema da maneira que o fundador da República Popular da China o fazia e se vê como o Mao da ‘nova era’. No entanto, acho Xi mais parecido com outro líder, Liu Shaoqi, o qual acreditava que um partido unificado e disciplinado era essencial para a China”, afirmou ao Correio. Segundo o estudioso, Xi governa por meio do PCC e muito de sua autoridade deriva de sua posição como secretário-geral do partido. “Para Mao, sua visão e sua vontade eram mais importantes do que o próprio PCC. Durante a Revolução Cultural, ele se dispôs a lançar um ataque ao partido quando pensava que o PCC tinha se desviado de seu propósito”, disse.
Autoridade
Segundo Saich, ao contrário de Mao ou do sucessor Deng Xiaoping, Xi não teria autoridade, caso não exercesse o cargo de secretário-geral do PCC. “Xi moveu-se, inesperadamente, para concentrar mais poder em suas mãos do que qualquer outro líder desde a era de Mao e de Deng. O presidente removeu rivais, promoveu aliados a posições-chave e dominou órgãos decisórios do país”, explicou.
Jeff Wasserstrom, historiador da Universidade da Califórnia, afirma que, nos últimos anos, muitas pessoas previram que o PCC estaria prestes a perder o poder. “Existem várias razões para ele ter se mantido no controle do país. Uma delas é que o PCC experimentou, ao longo de sua história, novos meios de fazer as coisas, com a ideologia aberta a mudanças. O partido mostrou-se mais adaptável do que muitas organizações similares e estudou como grupos autoritários perdem sua posição no topo”, disse ao Correio. “O PCC tem sido ajudado pelo que ocorreu em outras partes do mundo. Quanto mais problemas houver em sistemas democráticos, mais fácil será para o partido destacá-los em sua propaganda.”
Para Wasserstrom, Xi modela algumas características de Mao Tsé-tung e rompe, de forma dramática, com outras qualidades do “Grande Timoneiro”. “Décadas depois da morte de Mao, os líderes tentaram mostrar que o culto à personalidade era um padrão problemático do passado, e coleções de discursos de governantes não foram publicadas enquanto eles estavam no poder. Agora, os livros de Xi estão por toda a parte. Por outro lado, Xi não mostrou o interesse de Mao em agitar movimentos de massa turbulentos. Enquanto Mao criticava Confúcio como um pensador feudal, Xi continuou a tradição de seus predecessores, e o celebrou como uma espécie de santo nacional”, declarou ao Correio.
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“Xi Jinping não parece carismático. Seus discursos não são impetuosos ou inspiradores como os de Mao Tsé-tung e Deng Xiaoping. São mais roteirizados. Xi parece ser muito espontâneo. Sua atenção em todo o mundo vem do papel cada vez mais importante da China na economia e na geopolítica mundial. A China é um grande ator global, e qualquer líder precisaria ser ouvido. Domesticamente, ele tem sido um político habilidoso, em termos de alçar aliados a posições-chave e de remover adversários.” Anthony Saich, professor de assuntos internacionais e diretor do Centro Ash para Governança Democrática da Universidade de Harvard.
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Expurgo na cúpula
O ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un, demitiu vários altos funcionários, após acusá-los de responsabilidade por um “grave incidente” relacionado com a pandemia da covid-19. As motivações do expurgo permanecem misteriosas. O regime de Pyongyang nega até mesmo a existência da doença em seu território. “Os funcionários provocaram um grave incidente que representa uma enorme crise para a segurança da nação e de seu povo”, declarou Kim, durante uma reunião do Politburo — o comitê executivo do Partido dos Trabalhadoresd a Coreia —, citado pela agência de notícias estatal KCNA.
Não foram detalhados o número de pessoas demitidas nem os fatos atribuídos aos afetados. No entanto, Kim as acusou de serem “vítimas de egoísmo e de passividade”. “A incompetência e a irresponsabilidade dos altos funcionários representam um fator significativo que desacelera a implementação de tarefas importantes”, acrescentou o líder norte-coreano.
Especialistas duvidam da informação de que a pandemia da covid-19 não atingiu a Coreia do Norte. Kim Jong-un, que comanda uma nação cujo sistema de saúde é precário, decidiu fechar as fronteiras em janeiro de 2020 para evitar a propagação do novo coronavírus, surgido na vizinha China.
A agência KCNA informou que, durante a reunião do Politburo, Kim criticou altos funcionários por “negligência” e disse que a “falta de competência e a irresponsabilidade” dos altos funcionários atrasou a realização de tarefas importantes. Ele acusou estas pessoas de “autoprotecionismo e passividade”.