O presidente chileno, Gabriel Boric, desfrutou neste domingo (13), junto com seu gabinete, de um ato informal em um bairro popular de Santiago, onde dançou e recitou, mas também criticou duramente os abusos da Igreja e o abandono da cultura.
Ao ritmo da cueca, dança tradicional chilena, o recém-empossado presidente compartilhou de momentos de descontração com seus ministros, os filhos destes e centenas pessoas reunidas em um parque do bairro de La Pintana, a 20 km do centro da capital.
"Permitam-me dizer algo impróprio", interrompeu Boric seu próprio discurso para fazer uma crítica à presença do arcebispo emérito de Santiago, cardeal Ricardo Ezzati, na véspera durante uma oração na Catedral Metropolitana.
Ezzati é investigado por encobrir abusos sexuais no âmbito da Igreja Católica do Chile.
"Me incomodou ver o senhor Ezzati, ver as pessoas que agiram como acobertadoras de graves crimes contra as crianças", disse Boric em relação às centenas de casos de abusos sexuais de menores durante décadas na instituição religiosa, que acabaram com a imagem do clero desde que vieram à tona em 2018.
"Boric, amigo, o povo está contigo!", exclamou a multidão em reação ao comentário.
Banho de cultura
O presidente chamou atenção dos presentes, que por horas desfrutaram de todo tipo de ato cultural em um ambiente familiar, enquanto outras centenas de pessoas que não puderam ir ao parque acompanhavam o evento por telões gigantes instalados do lado de fora.
O dia transcorreu com apresentações da orquestra sinfônica juvenil do bairro; versos recitados pelo Prêmio Nacional de Literatura 2020, o poeta mapuche Elicura Chihuailaf, tanto em espanhol quanto em mapudungun (idioma do povo mapuche); música tradicional e popular; e um recital de 'paya', versos improvisados acompanhados por violão.
Além da clássica cueca, que pôs de pé o presidente e seus ministros, que não hesitaram em quebrar o protocolo e dançaram em frente ao palco junto com dezenas de pessoas que assistiam ao ato.
"Minha primeira tarefa é aprender a dançar", brincou Boric ao início de seu discurso, que se tornou crítico ao mencionar "o abandono" da cultura pelo Estado "por muito tempo".
"Sei que estão enfrentando dificuldades, têm sido negligenciados e abandonados pelo Estado por muito tempo. (Quero) dizer-lhes que vão estar presentes, que são protagonistas, não vamos dizer-lhes o que fazer", afirmou.
"Temos que acreditar"
Apesar das medidas de segurança por sua presença, o presidente chileno se juntou às pessoas em danças, canções e reflexões.
"No Chile vamos precisar de todos e todas, temos que acreditar, sentir que é possível viver em um país diferente e melhor. Somos parte de uma geração que há dois anos disse em tom forte e claro que queria mudar as coisas", destacou Boric.
Os ministros de seu gabinete feminista (14 mulheres e 10 homens) também se aproximaram do povo. Desde a manhã, chegaram caminhando entre as pessoas pelos jardins do parque.
"Hoje vim de micro (ônibus público)", disse, entre risos, à AFP, a ministra do Meio Ambiente, Maisa Rojas, que no sábado, no primeiro ato do novo governo publicou nas redes sociais que chegou ao palácio presidencial La Moneda de bicicleta e metrô.
Boric evitou também ler o discurso preparado para o ato e decidiu dirigir-se ao público de improviso, visivelmente emocionado.
"Como podem ver, a emoção me invade (...) Eu tinha um discurso preparado com muita gente que trabalha e está tentando interpretar minha forma de falar, mas quando cheguei aqui, disse: "Como vou ler um discurso que foi escrito antes? Tenho que falar a partir dos sentimentos'", afirmou, em meio a aplausos.
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