Estados Unidos

Biden critica ataque racista e defende mais limites à venda de armas

Em um discurso público, o presidente convocou os americanos a "enfrentar os inimigos" e "rejeitar a mentira" da substituição racial

Agência Estado
postado em 18/05/2022 00:14 / atualizado em 18/05/2022 00:14
 (crédito: Drew Angerer/Getty Images/AFP)
(crédito: Drew Angerer/Getty Images/AFP)

O presidente dos EUA, Joe Biden, pediu que os americanos rejeitem a teoria da substituição racial e o "veneno do supremacismo branco" durante um discurso em Buffalo nesta terça-feira, 17. Em uma viagem coberta de acenos às bases democratas, Biden classificou o ataque a tiros que deixou 10 mortos em um supermercado da cidade como "terrorismo" e deve pedir ao Congresso para barrar o acesso de pessoas com transtornos mentais a armas de fogo.

Em um momento em que os investigadores descobrem novos detalhes sobre os preparativos do atirador Payton S. Gendron para realizar o ataque do que vem sendo considerado um crime com motivações raciais, Biden chegou a Buffalo na manhã desta terça-feira, acompanhado da primeira-dama, Jill Biden, para prestar homenagens às vítimas do ataque a tiros.

O casal presidencial depositou flores em um memorial montado por populares na entrada do supermercado onde ocorreu o ataque e cumpriu uma agenda de visitas a parentes de vítimas e às equipes que atenderam a ocorrência no sábado.

Em um discurso público, o presidente convocou os americanos a "enfrentar os inimigos" e "rejeitar a mentira" da substituição racial, teoria que teria inspirado o atirador de Buffalo e vem sendo cada vez mais difundida por membros da extrema direita americana.

"O que aconteceu aqui é simples e direto: terrorismo. Terrorismo. Terrorismo doméstico", disse Biden. E completou: "Violência infligida a serviço do ódio e da sede viciosa de poder que define um grupo de pessoas como inerentemente inferior a qualquer outro grupo, um ódio que através da mídia e da política, a internet, radicalizou indivíduos raivosos, alienados, perdidos e isolados em acreditar falsamente que eles serão substituídos".

Embora Biden não tenha mencionado nenhum nome específico, a acusação de que a mídia e a política promovem a teoria da conspiração e alimentam a animosidade racial de olho em benefícios próprios vem em um momento de recrudescimento da guerra cultural no país antes das eleições de meio de mandato, em novembro.

Na disputa de suas primárias, o Partido Republicano vê suas alas internas disputarem espaço, com pelo menos uma delas impulsionada por teorias radicais e extremistas.

Horas após o ataque a tiros em Buffalo, o pré-candidato à vaga republicana ao Senado no Arizona, Blake Masters, repercutiu o núcleo da teoria em um tuíte: "Os democratas querem fronteiras abertas para que possam trazer e anistiar dezenas de milhões de estrangeiros ilegais - essa é a estratégia eleitoral deles".

A reprodução também alcança a alta cúpula republicana. Figuras influentes como a deputada Elise Stefanik (Nova York) já defendeu publicamente a tese. Em uma postagem patrocinada no Facebook no ano passado, resgatada pela Associated Press, o Comitê de Campanha de Elise afirmou que os democratas querem uma "insurreição eleitoral permanente", concedendo anistia a imigrantes ilegais para derrubar "nosso eleitorado".

Apesar dos resultados expressivos conquistados pela ala mais à direita do partido nas primárias realizadas até o momento, o establishment do Partido Republicano tenta brecar o avanço do extremismo, condenando-o publicamente.

A deputada Liz Cheney, filha do ex-vice-presidente Dick Cheney e uma das principais congressistas republicanas, afirmou na segunda-feira que a liderança do partido permitiu o nacionalismo branco, a supremacia branca e o antissemitismo. "A história nos ensinou que o que começa com palavras termina em muito pior", disse Cheney.

Fora do partido, o caso mais notório de um apoiador da teoria da substituição é o apresentador da Fox News Tucker Carlson, que cotidianamente replica seus conceitos ao vivo, já tendo afirmado que "o país está sendo roubado dos cidadãos americanos".

Na segunda-feira, Carlson afirmou que o caso em Buffalo estava sendo usado por liberais para calar a oposição. "Porque um adolescente mentalmente doente assassinou estranhos, você não pode expressar suas crenças políticas em voz alta", disse.

O contorno eleitoral que ganhou o debate em torno do massacre em Buffalo retoma temas que foram explorados de forma vencedora por Biden nas eleições de 2020, quando o então candidato alertou sobre os perigos da supremacia branca e se referiu aos protestos de 2017, em Charlottesville, como uma de suas principais inspirações para concorrer ao cargo.

O retorno da disputa ideológica em torno de temas como racismo e imigração ao centro do debate a seis meses das eleições pode ser um trunfo político para os democratas -- uma vez que o partido que elege o presidente, historicamente, perde cadeiras no Parlamento nas eleições seguintes, o que, neste caso, significaria a perda da maioria.

Restrição à compra de armas

Antes do presidente Joe Biden chegar a Buffalo, a Casa Branca informou que o presidente pretendia pedir por novas leis federais para dificultar o acesso a armas por civis -- um tema que constantemente é retomado após cada ataque a tiros no país.

Durante o discurso em Buffalo, Biden condenou ataques a tiro recentes em Charleston, El Paso, Pittsburgh e Atlanta, mas não deixou claro como pretende restringir o acesso às armas, uma vez que propostas para novas restrições têm sido rotineiramente bloqueadas pelos republicanos.

Questionado sobre a legislação sobre armas quando estava no aeroporto, Biden disse: "Vai ser muito difícil. ... Eu não vou desistir de tentar".

Durante a tarde desta terça, a rede americana CNN revelou que o plano do presidente é pedir ao Congresso um veto na venda de armas de fogo a pessoas com doenças e transtornos mentais.

O que diz a lei

A lei federal que regulamenta o acesso a armas por parte de pessoas com problemas de saúde mental foi aprovada em 1968. De acordo com ela, qualquer pessoa que tenha sido involuntariamente internada em uma instituição de saúde mental ou considerada, por uma autoridade legal, como um perigo para outras pessoas por ter uma doença mental está proibida de possuir uma arma de fogo.

A maioria dos Estados, no entanto, usa definições diferentes para doença mental. Algumas leis estaduais diferem da lei federal, criando brechas legais. Um exemplo é o caso de Seung-Hui Cho, o atirador que matou 32 pessoas na Virginia Tech em 2007. Ele havia sido declarado mentalmente doente por um tribunal e ordenado a se submeter a um tratamento de saúde mental. Pela lei federal, ele não poderia possuir uma arma, mas conseguiu comprar uma porque seu tratamento era ambulatorial e, na época, a Virginia só restringia a compra àqueles que tivessem sido internados involuntariamente em hospitais psiquiátricos.

Sob o SAFE Act, aprovado após os massacres de Sandy Hook e Webster, o Estado de Nova York tem algumas das leis de armas mais rígidas e complicadas do país. Atualmente, o Estado exige licença para venda de armas de fogo e verificação no NICS para transferir qualquer arma de fogo. Além disso, tramita no Senado o projeto de lei 7065, proposto pelo senador estadual James Sanders. Se aprovada, a lei exigirá que qualquer pessoa que deseje comprar uma arma de fogo passe primeiro por uma avaliação de saúde mental.

Em geral, para todos que desejam comprar uma arma, há verificação de antecedentes criminais, embora ela não seja exatamente obrigatória. Em qualquer lugar do país, quando alguém tenta comprar uma arma de fogo, o vendedor deve entrar em contato com o NICS, Sistema Nacional de Verificação de Antecedentes Criminais Instantâneos, que tem um prazo de três dias para realizar uma verificação. Se o NICS não enviar uma resposta dentro deste prazo, o vendedor tem o direito de vender a arma de fogo, a menos que seja proibido pelo Estado.

Atirador de Buffalo planejou ataque por 5 meses

Enquanto Biden descrevia detalhadamente as vítimas do ataque ao supermercado, dando a cada uma rosto, nome e história -- o presidente se emocionou ao dizer que um dos mortos era um pai que havia ido ao supermercado comprar um bolo de aniversário para o filho de 3 anos -- a investigação sobre o tiroteio continuava em andamento.

Novos detalhes continuaram a surgir desde o ataque, com o comissário de polícia de Buffalo, Joseph Gramaglia, dizendo na segunda-feira que os investigadores descobriram que o suspeito do tiroteio esteve no local no início de março, aparentemente parte de seus meses de planejamento para o ataque.

Gramaglia falou depois que o The Washington Post publicou uma investigação sobre uma conta online na qual alguém se identificando como Gendron havia escrito sobre ter ido ao mesmo supermercado no início de março para uma aparente viagem de reconhecimento e ser confrontado por um segurança. Na época, escreveu o suspeito, ele estava compilando planos detalhados sobre o local, de acordo com as mensagens analisadas pelo jornal americano.

O documento revelou até que ponto o suposto agressor planejou o violento ataque, descrevendo a loja como "área de ataque 1? e mais dois locais de Buffalo como áreas para "atirar em todos os negros". Ele registrou os trajetos de viagem para cada um, o tempo necessário para cada ataque e a estimativa de que mais de três dúzias de pessoas seriam mortas a tiros ao todo, segundo o documento.

Os investigadores estão montando um cronograma detalhado das ações do suposto agressor nos dias que antecederam os tiros, disseram autoridades, e o FBI apreendeu computadores e outros materiais da casa de Gendron, no subúrbio de Conklin, em Nova York, nos arredores de Binghamton, onde morava com os pais e dois irmãos. (Com agências internacionais)

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