Estados Unidos

Trump tentou se unir a invasores do Capitólio, diz ex-assistente da Casa Branca

Em audiência na Câmara dos Representantes, testemunha revela que o então presidente republicano agarrou o volante da limusine, agrediu o agente do Serviço Secreto e planejou dirigir até o Congresso, em 6 de janeiro de 2021

Rodrigo Craveiro
postado em 29/06/2022 06:00
 (crédito: Saul Loeb/AFP)
(crédito: Saul Loeb/AFP)

"Eu sou a p... do presidente. Leve-me para o Capitólio agora." Foi dessa maneira que o então presidente  dos Estados Unidos, Donald Trump, reagiu quando se viu impossibilitado de ir até o Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, para se reunir aos manifestantes que invadiram a sede do Legislativo. O líder republicano ficou enfurecido com o agente do Serviço Secreto Robert Engel, que o acompanhava dentro da "Besta", a limusine presidencial.

As revelações foram feitas ontem por Cassidy Hutchinson, ex-assessora de Mark Meadows, então chefe de gabinete da Casa Branca, em audiência na comissão criada pela Câmara dos Representantes para investigar o ataque ao Capitólio. Pela primeira vez, Trump foi diretamente associado à violência que culminou em cinco mortes. Hutchinson soube por outro assessor, Tony Ornato, que Trump agrediu Engel e tentou agarrar a direção da limusine quando o agente se recusou a levá-lo ao edifício.  

Cassidy Hutchinson, assistente do então chefe de gabinete da Casa Branca Mark Meadows, presta juramento na Câmara, antes do depoimento
Cassidy Hutchinson, assistente do então chefe de gabinete da Casa Branca Mark Meadows, presta juramento na Câmara, antes do depoimento (foto: Mandel Ngan/AFP)

Mais: segundo Hutchinson, enquanto o levante ocorria, o presidente determinou a suspensão das medidas de segurança, apesar de saber que muitos simpatizantes estavam armados. "Era algo antiamericano. Estávamos assistindo ao prédio do Capitólio ser desfigurado por causa de uma mentira", afirmou ela, ao se referir às ilações feitas por Trump de que o democrata Joe Biden teria ganhado as eleições em meio a uma fraude. O depoimento da ex-assessora deixou até mesmo deputados republicanos perplexos. "Isso mostra como Trump estava envolvido pessoal e emocionalmente com os eventos de 6 de janeiro. Ele realmente se importava com o que estava acontecendo no Capitólio e queria ser parte daquilo", disse um dos legisladores à CNN sem se identificar. 

Hutchinson também relatou que Pat Cipollone, um dos advogados da Casa Branca, tentou alertar os colegas sobre o que representaria a ida de Trump ao Capitólio. "Por favor, tenham a certeza de que ele não vá ao Capitólio. Seremos acusados de todo tipo de crime inimaginável, se fizermos esse movimento acontecer", advertiu Cipollone a assessores do republicano. O magnata desmentiu que tivesse tentado tomar a limusine e se apressou em desqualificar Hutchinson, ao chamar o depoimento de "fraudulento" e "doentio". "Eu mal sei quem é essa pessoa, Cassidy Hutchinson, a não ser que ouvi muitas coisas negativas sobre ela (totalmente falsa e 'vazadora')", afirmou Trump na Truth, a rede social criada por ele. Ele atribuiu as palavras de Hutchinson ao fato de ela ter sido impedida de viajar para a Flórida com a equipe do republicano depois da posse de Biden.

Em entrevista ao Correio, o historiador político James Naylor Green — professor da Universidade Brown (em Rhode Island) — destacou a gravidade do testemunho de Hutchinson. "A denúncia foi feita por uma republicana, por uma pessoa que trabalhou no governo de Trump e queria a sua reeleição. Ela ficou chocada com a reação dele. Semanas antes, os assessores sabiam que Trump queria participar da marcha de 6 de janeiro. O Serviço Secreto descartou essa possibilidade, sob a justificativa de que não haveria como garantir a segurança do presidente", explicou. "Tudo indica que Trump havia combinado com as milícias de extrema-direita para que fossem a ponta de lança em uma invasão ao Capitólio."

Simpatizantes do republicano entram em confronto com forças de segurança: cinco mortos no ataque
Simpatizantes do republicano entram em confronto com forças de segurança: cinco mortos no ataque (foto: Joseph Prezioso/AFP)

Green mostra-se cético sobre uma punição. "Nos EUA, não existe tradição de se condenar um ex-presidente", observou. De acordo com o estudioso, os testemunhos na Câmara indicam que Trump foi o líder mais antidemocrático da história norte-americana. "Ele participou de uma conspiração para não reconhecer o resultado das eleições e quase deu um golpe. É uma lição sobre autocratas legalmente eleitos, capazes de colocar em xeque a democracia. Trump segue como ameaça."

 

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

  • Cassidy Hutchinson, assistente do então chefe de gabinete da Casa Branca Mark Meadows, presta juramento na Câmara, antes do depoimento
    Cassidy Hutchinson, assistente do então chefe de gabinete da Casa Branca Mark Meadows, presta juramento na Câmara, antes do depoimento Foto: Mandel Ngan/AFP
  • Simpatizantes do republicano entram em confronto com forças de segurança: cinco mortos no ataque
    Simpatizantes do republicano entram em confronto com forças de segurança: cinco mortos no ataque Foto: Joseph Prezioso/AFP

Eu acho...

"A comissão de investigação criada pela Câmara dos Representantes não tem o poder de punir Trump. Agora, é possível que um grande júri admita que o ex-presidente cometeu crimes contra o Estado, como fraude eleitoral, subversão e conspiração. Mas não existe uma tradição norte-americana. Acho muito difícil o Departamento de Justiça encaminhar acusações contra Trump. Isso criaria uma crise nacional. Existe uma polarização no país entre democratas e republicanos. Os republicanos cerrariam as fileiras em torno de Trump, nesse cenário."

James Naylor Green, historiador político da Universidade Brown (em Rhode Island)

Eu acho....

"Os EUA deveriam criar rotas legais e seguras para a migração, a fim de que as pessoas não se sintam compelidas a atravessar por meio de desertos perigosos, rios caudalosos ou em caçambas super aquecidas de caminhões-baú. Nós, da HRW, temos repetidamente conversado com autoridades mexicanas e norte-americanas. Temos alertado sobre o calor extremo na fronteira e sobre como políticas dissuasivas abastecem o contrabando e provocam um aumento no número de mortes."

Ari Sawyer, especialista em fronteira dos EUA pela organização não governamental Human Rights Watch (HRW)

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação