Estados Unidos

Trump se apresenta à Justiça hoje (4/4); entenda o que pode acontecer

Magnata se tornará, hoje, o primeiro ex-presidente norte-americano formalmente acusado pela Justiça por mais de 30 crimes. Republicano teria pago suborno a ex-atriz pornô, com quem supostamente se relacionou, para esconder adultério

Rodrigo Craveiro
postado em 04/04/2023 06:00
 (crédito: Ed Jones/AFP)
(crédito: Ed Jones/AFP)

Os Estados Unidos e o planeta voltam as atenções, hoje, para Nova York. Pela primeira vez na história, um ex-presidente norte-americano estará sentado diante do juiz para escutar as acusações que pesam contra ele. Donald Trump, 76 anos, será fichado, fotografado de frente e de lado, e terá as impressões digitais colhidas. Também hoje, o mundo tomará conhecimento dos crimes supostamente cometidos por aquele que foi o homem mais poderoso do mundo entre 2017 e 2021. A imprensa dos EUA antecipou que Trump responderá na Justiça por 34 acusações associadas ao pagamento de propina para uma ex-atriz pornô, em 2016, pouco antes da campanha presidencial. O magnata republicano teria repassado US$ 130 mil (cerca de R$ 420 mil à época) a Stormy Daniels, 44, para silenciá-la sobre uma relação extraconjugal quando Barron, filho caçula de Trump, tinha acabado de nascer.  

O ex-presidente desembarcou em Nova York, na tarde de ontem, e seguiu para a Trump Tower, onde pernoitou. A ex-primeira-dama Melania ficou na mansão do casal, em Mar-a-Lago, na Flórida. Trump deixou-se fotografar e chegou a acenar para jornalistas, ao entrar pela porta da frente do próprio arranha-céu, na 5ª Avenida, por volta das 16h15 (17h15 em Brasília). De acordo com a rede de TV CNN, ele se encontrou, no local, com os advogados Joe Tacopina e Susan Necheles.

Simpatizantes começaram a se reunir diante do prédio e em outros pontos, como a sede da Promotoria do Distrito de Manhattan e o Tribunal Penal de Nova York. A metrópole vive um clima de tensão, com a segurança reforçada. O prefeito Eric Adams advertiu contra a presença de "alguns agitadores" e pediu aos simpatizantes de Trump para que se "controlem". "Enquanto estiverem na cidade, comportem-se bem", aconselhou.

Pouco antes de seu avião particular decolar da Flórida, Trump utilizou a Truth Social, rede criada por ele próprio, para atacar o indiciamento e inflamar os seguidores. "Caça às bruxas. Nosso outrora grande país está indo para o inferno!", escreveu.

Ele assegurou que iria a Nova York para "devolver a grandeza aos Estados Unidos" e chamou de "corrupto" o procurador Alvin Bragg, responsável pelo seu indiciamento, na última quinta-feira. "O procurador corrupto não tem um caso. O que tem é uma jurisdição, onde é impossível que eu tenha um julgamento justo", acrescentou, ao fazer menção ao fato de que Nova York é uma cidade tradicionalmente democrata. Também reafirmou que será candidato às eleições presidenciais de 2024.

Pronunciamento

Depois de ser informado sobre as acusações, no tribunal nova-iorquino, o bilionário retornará para Mar-a-Lago, onde deverá fazer um pronunciamento à imprensa, às 20h15 (21h15 em Brasília). No entanto, não se descarta que o juiz Juan Merchan imponha sigilo ao caso, o que impediria Trump de declarar-se publicamente sobre o tema. A expectativa é que o ex-presidente se proclame inocente, o que o levaria a julgamento. Os advogados sustentam que a admissão de culpa está fora de cogitação.

Não se sabe, de concreto, o que esperar do ritual desta tarde. Não existe um roteiro para a "rendição" de um ex-presidente a um tribunal. Tacopina acredita que Bragg e sua equipe farão de tudo para "obter toda a publicidade" do caso. Isso incluiria permitir aos cinegrafistas tomarem imagens dele atravessando os corredores do tribunal. "Esperamos que seja o mais indolor e o mais elegante possível para uma situação como esta", disse o advogado. Segundo Tacopina, Trump não deverá ser algemado. Veículos, como o The Washington Post, a CNN e o The New York Times, peticionaram ao juiz Juan Merchan para que torne público o indiciamento feito por Bragg. Também solicitaram a presença de câmeras na sala da Corte.

Anthony Michael Kreis, Ph.D. e professor de direito da Universidade Estadual da Geórgia, explicou ao Correio que a opinião pública não deve esperar imagens de impacto midiático hoje. "Sob a legislação de Nova York, a prisão, o fichamento e o processo de formalização da acusação ocorrerão a portas fechadas. A fotografia dele fichado será mantida em privado pelo Estado", previu. "Por isso, a população não terá um vislumbre do processo. Os direitos do ex-presidente serão preservados, assim como os de qualquer outro réu. Trump será liberado rapidamente depois que o procedimento de amanhã (hoje) for finalizado."

Professor emérito de direito da Universidade de Nova York, Stephen Gillers discorda de Kreis e aposta que o magnata republicano tentará transformar o dia de hoje em um circo. "Espero que Trump venda cópias autografadas de sua fotografia como acusado fichado, além de imagens dele algemado, caso consiga fazê-lo. Todas as imagens funcionam a seu favor, seja financeiramente ou não", afirmou à reportagem.

O especialista disse que Trump deverá ser preso para entrar na jurisdição do tribunal. "Uma prisão não significa que ele tenha que ser contido. Neste caso, a prisão estabelece a autoridade da Corte sobre ele, inclusive no que diz respeito às condições de fiança."

O indiciamento de Trump voltou a deixar em evidência a divisão política dos Estados Unidos. Segundo uma pesquisa realizada pela CNN, 60% norte-americanos aprovam a decisão de Bragg de indiciar o magnata. O índice sobe para 94% entre os democratas e para 62% entre os independentes, enquanto 79% dos republicanos são contra.

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  • Robert Hoatson protesta diante da Trump Tower, em Nova York:
    Robert Hoatson protesta diante da Trump Tower, em Nova York: "Tranque-o e jogue a chave fora" Foto: Scott Olso/Getty Images/AFP
  • Manifestante segura cartaz com a frase
    Manifestante segura cartaz com a frase "Ninguém está acima da lei", do lado de fora do tribunal Foto: Kena Betancur/Getty Images/AFP
  • Simpatizante de Trump com máscara do movimento Anonymous: aliados de prontidão
    Simpatizante de Trump com máscara do movimento Anonymous: aliados de prontidão Foto: Kena Betancur/Getty Images/AFP
  • Mulher com camisa, boné e bandeira alusivos ao ex-inquilino da Casa Branca, diante do prédio da Corte
    Mulher com camisa, boné e bandeira alusivos ao ex-inquilino da Casa Branca, diante do prédio da Corte Foto: Stefani Reynolds/AFP
  • Policiais separam briga diante da Procuradoria do Distrito de Manhattan: ânimos exaltados
    Policiais separam briga diante da Procuradoria do Distrito de Manhattan: ânimos exaltados Foto: Leonardo Muñoz/AFP

Da Casa Branca ao tribunal

Entenda o que pode ocorrer hoje e depois com Trump 

A acusação formalizada

Às 14h15 (15h15 em Brasília), Trump será oficialmente acusado por 34 crimes, de acordo com a imprensa norte-americana. O juiz Juan Merchan, da Corte de Nova York, notificará oficialmente o ex-presidente sobre os crimes dos quais é acusado.

Inocente ou culpado?

O juiz Merchan perguntará a Trump como ele deseja se declarar: inocente ou culpado. Joe Tacopina, o advogado do magnata, antecipou que seu cliente pretende declarar-se inocente e descartou qualquer acordo com a Justiça. A equipe de defesa apresentará moções contra a acusação.

Os prováveis crimes

Trump teria pago US$ 130 mil (cerca de R$ 420 mil em vários da época) à atriz pornô Stormy Daniels, pouco antes das eleições presidenciais de 2016. A intenção do magnata teria sido esconder uma relação extraconjugal com Daniels. O ex-presidente registrou o pagamento como "honorários advocatícios" ao então advogado Michael Cohen. 

Sem algemas

Trump não será algemado. Isso porque as algemas, normalmente, são usadas apenas para suspeitos que representam risco de fuga ou à segurança. 

Foto de fichamento

O ex-presidente dos Estados Unidos terá a foto de acusado feita pelas autoridades da Corte de Nova York. No entanto, uma lei estadual desencoraja a divulgação da imagem. É possível, no entanto, que o próprio Trump decida tornar pública a foto dele fichado. Seria uma forma de inflamar seus simpatizantes.

Livre e "amordaçado"

O republicano deverá ser liberado pela Corte para retornar à Flórida, onde se espera que faça um discurso às 20h15 de hoje (21h15 em Brasília). O juiz pode emitir uma ordem de sigilo, o que impediria Trump e sua equipe de defesa de fazerem declarações públicas sobre o caso. Se isso ocorrer, o teor, ou mesmo a realização, do pronunciamento do ex-presidente será uma incógnita. 

E depois?

O advogado Joe Tacopina pretende apresentar vários recursos. As acusações poderão ser retiradas pela Corte, apesar de ser uma hipótese bastante improvável. Outra possibilidade é de que Trump chegue a um acordo com os promotores e aceite se declarar culpado, a fim de enviar um julgamento e atenuar a pena. A terceira opção é a Justiça levar adiante o julgamento, que que seria antecedido por várias audiências. 

Eu acho...

Anthony Michael Kreis, Ph.D. e professor de direito da Universidade Estadual da Geórgia
Anthony Michael Kreis, Ph.D. e professor de direito da Universidade Estadual da Geórgia (foto: Fotos: Arquivo pessoal)

"Sob o ponto de vista político, o indiciamento poderá muito bem ajudar o ex-presidente Donald Trump a conseguir a indicação do Partido Republicano, durante as primárias. Mas é muito cedo para prever o impacto que isso terá quando tudo estiver dito e feito. A acusação de hoje (amanhã) é a potencialmente menos contundente que Trump enfrenta, já que a Geórgia e o governo federal também contemplar indiciá-lo. Portanto, qualquer impulso político que ele receber pode não durar muito."

Anthony Michael Kreis, Ph.D. e professor de direito da Universidade Estadual da Geórgia

Stephen Gillers, professor emérito de direito da Universidade de Nova York
Stephen Gillers, professor emérito de direito da Universidade de Nova York (foto: Arquivo pessoal )

"Entre sua base eleitoral, a popularidade de Donald Trump tende a aumentar depois da formalização das acusações. Mas a aferição desse fenômeno terá que ser feita no momento em que as provas começarem a surgir no julgamento, ou quando ocorrerem as petições e as audiências. Nós veremos se a prova é mais séria e mais difícil de ser descartado do que a suposição que o caso seja meramente o pagamento de suborno à ex-atriz Stormy Daniels."

Stephen Gillers, professor emérito de direito da Universidade de Nova York

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