Europa

Portugal: Partidos formam aliança para isolar a extrema-direita

Partidos Socialista e Social Democrata cerram fileiras para controlar a Assembleia da República pelos próximos quatro anos e impedir o avanço do ultraconservador Chega, acusado de inviabilizar a eleição da mesa diretora do Parlamento

Simpatizante do Partido Socialista celebra a democracia durante as eleições de 10 de março, em Lisboa -  (crédito: Patricia de Melo Moreira/AFP)
Simpatizante do Partido Socialista celebra a democracia durante as eleições de 10 de março, em Lisboa - (crédito: Patricia de Melo Moreira/AFP)
postado em 28/03/2024 06:00

Lisboa — Depois do grande susto que levaram das urnas, com a extrema-direita quadruplicando de tamanho e elegendo 50 deputados, os dois maiores partidos de Portugal decidiram passar por cima das divergências e fechar uma aliança para garantir o controle da Assembleia da República nos próximos quatro anos. O Partido Socialista (PS), de esquerda, e o Partido Social Democrata (PSD), de centro-direita, somaram forças, isolaram a ultradireita e elegeram o novo presidente do Parlamento, José Pedro Aguiar-Branco, com 160 votos, depois de quase dois dias de impasse e três tentativas frustradas. Pelo acordo, o representante do PSD ficará no comando da Assembleia nos próximos dois anos e o PS, com Francisco Assis, exercerá a função nos dois anos seguintes.

A solução foi proposta pelo PS, diante da dificuldade da Aliança Democrática, que inclui o PSD, de formar maioria para fazer o presidente do Parlamento. O acerto foi possível depois de o Chega, de extrema-direita, ter tumultuado o processo e inviabilizado as tentativas anteriores de definir a mesa diretora da Assembleia da República. A justificativa de PS e PSD para firmar o acordo foi a de garantir a estabilidade política de Portugal na atual legislatura, que foi sacudida pela decisão dos eleitores de darem quase 1,2 milhão de votos aos radicais de direita. Para o novo presidente do Parlamento, sua eleição mostra que a democracia venceu. "Se tem uma coisa que os últimos dias nos ensinaram é que não devemos desistir da democracia. Eu não desisto e vou trabalhar para fortalecê-la", afirmou em seu primeiro discurso oficial.

A extrema-direita, no entanto, conseguiu garantir uma das quatro vagas de vice-presidente do Parlamento para o deputado Diogo Pacheco de Amorim. A escolha do representante do Chega causou barulho, sobretudo, pelo histórico dele como militante contra o movimento que levou à Revolução dos Cravos, em 25 de abril de 1974, e resgatou a democracia portuguesa. Para a líder do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, essa escolha só foi possível porque a Aliança Democrática, tendo o PSD à frente, não foi capaz de garantir uma solução institucional política para o país. Amorim rebateu as críticas endereçadas à sua eleição e destacou que não é contra o modelo político de Portugal, mas, sim, contra o sistema que o controla. Os demais vice-presidentes são Teresa Morais (PSD), Marcos Perestrello (PS) e Rodrigo Saraiva (IL).

Disputa pela oposição

Futuro primeiro-ministro de Portugal, Luís Montenegro, que tomará posse em 2 de abril, preferiu o silêncio em torno das articulações para a presidência da Assembleia da República. Mas, segundo Hugo Soares, secretário-geral do PSD, apesar do acordo com o Partido Socialista para isolar o Chega, o novo governo, comandado pela Aliança Democrática, promoverá as mudanças que prometeu durante a campanha e não repetirá as administrações socialistas. "Nosso compromisso é com o resultado eleitoral, que mostrou que o país quer mudanças", assinalou. Ele acrescentou, ainda, que os portugueses "não querem saber de jogos políticos".

José Pedro Aguiar-Branco, presidente do Parlamento de Portugal
José Pedro Aguiar-Branco, o novo presidente do Parlamento de Portugal (foto: Wikipedia )

Segundo o socialista Pedro Nuno Santos, derrotado na disputa para primeiro-ministro, a aliança com o centro-direita foi uma necessidade para se resolver um impasse institucional. Ele contou que, como Montenegro não apresentou uma solução para resolver o problema envolvendo a presidência do Parlamento, a legenda, que governou Portugal nos últimos oito anos, agiu a fim de garantir o fortalecimento da Assembleia. "A direita não conseguiu aprovar o nome que o PSD apresentou. Então, o PS sugeriu uma presidência partilhada", explicou. Santos reforçou, no entanto, que os socialistas serão oposição ao novo governo, também uma forma de esvaziar esse papel que o Chega quer ocupar.

Muito irritado com a estratégia usada pelos socialistas e pelo centro-direita, o líder do Chega, André Ventura, disse que o PSD, de Montenegro, optou por se aliar à esquerda em vez de construir uma ampla frente de direita. "O PSD é livre para fazer isso, mas, a partir de agora, cada um segue o seu caminho, e o Chega liderará a oposição em Portugal, porque é o terceiro partido do Parlamento e o único que está fora do pseudoacordo", afirmou. Esperneando, ele voltou a reclamar que, mais uma vez, o PSD "humilhou, espezinhou, maltratou o partido que representa quase 1,2 milhão de eleitores".

Enquanto o bate-boca na Assembleia da República corria solto, Montenegro foi ao encontro do ainda primeiro-ministro António Costa, no Palácio de Belém, sede do Executivo. Os dois amarraram os últimos detalhes para a troca de governo. Segundo Costa, está havendo uma total colaboração entre os dois nesse período de transição. "Recebi hoje (ontem) o primeiro-ministro indicado, a quem desejo as maiores felicidades pessoais e políticas para o bem de Portugal e dos portugueses", escreveu ele numa rede social. O líder do PSD deve anunciar hoje a composição de seu ministério.

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