A principal foto que ilustra essa reportagem tem se tornado uma cena cada vez mais rotineira nos hospitais colapsados da Faixa de Gaza. Depois de 219 dias de guerra, o número de mortos nos bombardeios de Israel chegou, ontem, a 35 mil. É como se 159 palestinos morressem todos os dias — seis a cada hora. Do total de vítimas da campanha militar lançada pelo Exército judeu contra o movimento extremista islâmico Hamas, 14 mil são crianças.
Ante o fracasso em interromper os combates e a inação da comunidade internacional, o secretário-geral da ONU, António Guterres, tornou a fazer um apelo por um cessar-fogo "imediato" na Faixa de Gaza. "Reitero o meu apelo, o apelo de todo o mundo para um cessar-fogo humanitário imediato, para a libertação incondicional de todos os reféns e para um aumento imediato da ajuda humanitária. Mas um cessar-fogo será somente o começo. Haverá um longo caminho para se recuperar da devastação e do trauma desta guerra", declarou o diplomata português.
Enquanto prepara o caminho para uma incursão terrestre em Rafah, na fronteira com o Egito, Israel voltou a bombardear o norte da Faixa de Gaza, em áreas onde supostamente o Hamas teria sido derrotado pelas tropas do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. A guerra contra o grupo extremista palestino tem causado ranhuras na relação entre Israael e Estados Unidos. Depois de o presidente Joe Biden ameaçar a suspensão do fornecimento de armas aos israelenses, o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, advertiu que uma grande ofensiva em Rafah provocaria "caos" e "anarquia", mas não eliminaria o Hamas.
"O plano de Israel em Rafah corre o risco de causar enormes danos à população civil, sem resolver o problema. Continuará a haver milhares de membros armados do Hamas", advertiu o chefe da diplomacia de Washington. "Vimos o Hamas voltar às áreas que Israel libertou no norte, inclusive em Khan Yunis", acrescentou, ao citar a cidade situada a 9km de Rafah, e ponto de convergência de refugiados.
Sofrimento
Em Rafah, a palestina Walaa Najeh Hassan, 30 anos, quase ficou viúva. Em 1º de dezembro passado, um bombardeio israelense destruiu sua casa. "O meu marido, Ahmed Ibrahim, 34 anos, perdeu as duas pernas no ataque aéreo. É muito difícil aceitar a situação em que ele se encontra. Meu sofrimento se torna ainda maior porque os bombardeios danificaram todos os hospitais. E a único hospital especializado em próteses está desativado. Você pode imaginar? Meu filho, Yousef, de apenas sete anos, cuida do pai", desabafou ao Correio. "Todos nós tememos a morte, mas Alá nos salva. Aqui em Rafah, a maioria das pessoas partiu. A guerra continua, e a situação é horrível." Walaa também pensa em fugir, mas não sabe para onde. "Muitos foram para Deir Al Balah (centro de Gaza). Ainda não encontramos abrigo. Além disso, tudo é muito caro."
Também em Rafah, a ativista comunitária Reham Al-Qeeq, 40, resiste ao medo sob uma tenda, a 1km do Mar Mediterrâneo, acompanhada do marido e dos quatro filhos. Refugiados várias vezes dentro da Faixa de Gaza, esperam o momento de fugir novamente, assim que as forças israelenses invadirem a área central de Rafah. Ela critica a postura da comunidade internacional ante o avanço do massacre. "Muitas vezes, países que têm influência sobre as decisões apoiam a ocupação, especialmente porque Israel é uma criação do Ocidente. Existem diferentes padrões duplos quando se trata de direitos humanos", ironiza, em entrevista ao Correio, por meio do WhatsApp. "Esses governos não tomaram nenhuma decisão séria para impedir o massacre dentro da Faixa de Gaza." (RC)
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