O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, afirmou que "a Rússia trouxe a guerra para os outros, e agora ela [a guerra] está chegando em casa."
Zelensky disse que as operações ofensivas na região russa de Kursk podem contribuir para a paz ao pressionar Vladimir Putin.
"A Rússia deve ser forçada à paz se Putin deseja tanto continuar a guerra", disse o presidente ucraniano.
Na semana passada, Kiev lançou sua maior incursão transfronteiriça desde o início da invasão em larga escala pela Rússia em fevereiro de 2022. A incursão da Ucrânia em território russo em 6 de agosto foi uma surpresa não apenas para Moscou, mas também para muitos dentro da Ucrânia e para a maioria observando a guerra de fora.
O Exército ucraniano afirma que suas tropas agora controlam 1.000 km² de território russo na ofensiva em andamento.
Putin, por sua vez, acusou a Ucrânia de "cometer crimes" contra o povo russo e prometeu uma "resposta à altura".
Enquanto isso, a força aérea ucraniana informou que sirenes de ataque aéreo foram ativadas em todo o país após relatos de novos ataques aéreos russos.
O comandante ucraniano Oleksandr Syrskyi informou que a Ucrânia continua "conduzindo uma operação ofensiva na região de Kursk", sete dias após suas tropas cruzarem a fronteira.
No entanto, o Instituto para o Estudo da Guerra (ISW, na sigla em inglês) sugere que a área sob controle ucraniano pode ser menor, cerca de 800 km².
Milhares de pessoas foram instadas a evacuar a região oeste da Rússia para sua segurança, enquanto Putin prometeu expulsar as tropas ucranianas de seu território.
Segundo o Ministério de Emergências da Rússia, cerca de 200 moradores deslocados de Kursk chegaram a Moscou nesta terça-feira (13/8), e mais de 121 mil pessoas já foram evacuadas de Kursk, com 59 mil ainda aguardando evacuação.
Evacuações também ocorrem na região de Belgorod, outra área fronteiriça russa.
Em uma atualização no aplicativo de mensagens Telegram, o órgão informou que mais de 940 cidadãos, principalmente crianças, chegaram à região de Moscou, a cerca de 520 km de Kursk.
Foram criados cerca de 400 centros de acomodação temporária em toda a Rússia para abrigar cerca de 30 mil moradores deslocados, acrescentou a pasta.
Na Ucrânia, as defesas aéreas destruíram 30 dos 38 drones lançados pela Rússia durante a noite, segundo a Força Aérea ucraniana.
Moscou também lançou dois mísseis balísticos Iskander-M, embora não esteja claro o destino das armas que não foram interceptadas.
Na manhã desta terça-feira, toda a Ucrânia permaneceu sob alerta de novos ataques aéreos.
Fontes russas relatam que 14 drones ucranianos foram destruídos durante a noite, com alvos em Kursk, Voronezh e Belgorod. Não foi informado o número total de drones lançados pela Ucrânia.
Autoridades dos EUA expressaram preocupação com a possível transferência de "centenas" de mísseis balísticos iranianos para a Rússia, o que representaria uma "escalada dramática" do apoio iraniano na guerra.
O porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Vedant Patel, afirmou que esta parceria ameaça a segurança europeia e alertou que os EUA e seus aliados estão prontos para responder de forma "rápida e severa" se a transferência ocorrer.
Os EUA já acusaram o Irã de fornecer drones de ataque à Rússia, usados para atingir a infraestrutura ucraniana — uma alegação negada pelo Irã.
'Ponto de inflexão'
O ataque da Ucrânia à Rússia marca uma mudança significativa no conflito, segundo Andreas Umland, cientista político do Centro de Estudos da Europa Oriental em Estocolmo, na Suécia.
"A Ucrânia mudou a narrativa da guerra", afirma ele à BBC News Mundo, o serviço de notícias em espanhol da BBC.
Anteriormente, Umland explica que a Ucrânia estava em uma posição defensiva, focada em recuperar território perdido.
Agora, com a ofensiva dentro do território russo, a Ucrânia alterou a dinâmica do conflito, forçando a Rússia a defender suas próprias fronteiras.
Esse movimento busca revitalizar a moral interna da Ucrânia e restaurar a confiança dos aliados ocidentais, além de reverter a narrativa negativa que surgiu após uma série de derrotas.
"Nos últimos meses, aumentaram as críticas de que não valia a pena apoiar a Ucrânia, pois ela sempre seria a parte mais fraca frente à Rússia. No entanto, a situação mudou: agora é a Rússia que está tentando recuperar território perdido devido a uma invasão, algo que não se via desde a Segunda Guerra Mundial", afirma Umland.
A ofensiva também altera a posição da Ucrânia nas futuras negociações de paz, destaca David Betz, professor de História da Guerra no Kings College London, no Reino Unido.
Antes, as conversas focavam em concessões territoriais; agora, a Ucrânia busca negociar em termos de troca de território por território, pressionando a Rússia a retirar suas tropas das áreas ocupadas.
"A intenção é fortalecer a posição ucraniana para as próximas negociações com o Kremlin", explica Betz.
Umland concorda, observando que as negociações anteriores se limitavam às exigências russas de terras ucranianas ou à aceitação de uma redução da soberania ucraniana em troca de paz.
Agora, a Ucrânia pretende negociar com foco na troca direta de territórios ocupados. "Não será mais território por paz, mas território por território: vocês se retiram do meu território e eu me retiro do seu", afirma Umland.
No entanto, a estratégia ucraniana apresenta riscos, alerta Betz.
Ele afirma que a incursão pode ser difícil de sustentar e pode drenar recursos do exército ucraniano de outros fronts, sem causar um impacto significativo nas forças russas.
Além disso, a movimentação pode forçar a Rússia a realocar suas tropas, embora ainda não haja evidências de que Moscou tenha tomado essa medida.
"Essa manobra foi muito arriscada e oferece poucos ganhos políticos ou estratégicos, pois drenou recursos ucranianos de outras frentes e não causou muitas baixas à Rússia", conclui Betz.
A ofensiva também desafia Putin, que enfrenta dificuldades para manter a narrativa de controle da situação, apontam os especialistas.
Eles destacam que o grande número de deslocados e o aumento das baixas russas complicam a imagem de estabilidade do Kremlin.
Até o momento, Putin não fez ameaças de usar armas nucleares, o que pode ser visto como uma tentativa de evitar uma escalada maior, argumenta Umland.
"Acredito que Putin não quer agravar a situação, pois, se ameaçar usar armas nucleares, terá que usá-las, caso contrário parecerá fraco. Mas, se usá-las, isso forçará o Ocidente e até mesmo aliados como a China a agir de maneira diferente", acrescenta.
Em 2020, a Rússia adotou uma nova doutrina militar que permite o uso de seu arsenal nuclear e outras armas de destruição em massa "quando a própria existência do Estado estiver ameaçada".
Um ataque à integridade territorial da Rússia seria considerado uma ameaça à sua existência.
No entanto, na sua declaração mais recente, Putin afirmou que "a principal tarefa do Ministério da Defesa é expulsar o inimigo do nosso território".
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