Uma teoria da conspiração — envolvendo o homem que pode se tornar o próximo vice-presidente americano, as bandeiras da Somália e de Minnesota — foi amplamente compartilhada nas redes sociais dos Estados Unidos.
A teoria sugere que Tim Walz, governador do Estado americano de Minnesota, mudou recentemente a bandeira do seu Estado para se parecer com a bandeira da Somália. Ambas exibem estrelas e diferentes tons de azul em seu design.
Não há nenhuma evidência que sugira que seja este o caso. Uma teoria da conspiração é definida como a crença de que um grupo secreto, mas influente, está controlando os eventos nos bastidores. Muitas ganham força, atingindo milhares de pessoas quando são amplamente compartilhadas em plataformas de rede social.
Minnesota, com uma população de aproximadamente 5,7 milhões de habitantes, abriga a maior comunidade de origem somali dos EUA, aproximadamente 82 mil pessoas, a maioria delas muçulmanas.
Que usuários estavam compartilhando?
De acordo com um punhado de relatos alinhados com visões políticas de direita radical nos EUA, o novo design da bandeira foi escolhido deliberadamente para atrair essa grande comunidade somali — e mostrar a suposta ideologia extremista e falta de patriotismo de Walz.
A ideia ganhou força no início de agosto, quando Walz foi escolhido para ser o candidato a vice-presidente na chapa democrata liderada por Kamala Harris nas eleições deste ano.
A PeakMetrics, empresa de dados americana, informou que narrativas de conspiração associando Tim Walz à Somália foram amplamente compartilhadas no X (antigo Twitter) durante todo o verão no hemisfério norte.
Em agosto, foram registrados 76,2 mil tuítes sobre o assunto — que foi mencionado, inclusive, pelo apresentador Jesse Watters na rede Fox News.
No entanto, a teoria foi amplamente desmentida por vários analistas de rede social.
Novo design
Minnesota mudou oficialmente sua bandeira em maio deste ano, após lançar uma campanha online para encontrar um novo design.
O design anterior da bandeira de Minnesota, adotado em 1957, mostrava um homem nativo americano a cavalo ao fundo, e um colono branco arando um campo na frente. Ele foi considerado problemático por muitos em Minnesota, entre eles representantes de povos nativos americanos.
A nova bandeira exibe uma estrela de oito pontas à esquerda sobre um fundo azul escuro, com um tom azul claro à direita.
O campo azul escuro representa o formato de Minnesota, e o campo azul claro representa a importância da água para o Estado. A estrela de oito pontas representa a Estrela do Norte.
Em contrapartida, a bandeira da Somália tem um fundo azul claro sobre o qual há uma estrela de cinco pontas, representando as cinco regiões somalis.
Andrew Prekker, o designer que criou a nova bandeira de Minnesota, conta que o que o motivou foi reconhecer que a bandeira anterior tinha problemas.
"Me deparei com um site chamado Minnesotans for a Better Flag — e foi isso que me apresentou à ideia de que nossa bandeira estadual realmente não era eficaz, e suas imagens eram muito problemáticas em termos de promoção do colonialismo em relação às nossas comunidades indígenas", relata.
Ele explica que as poucas semelhanças entre as duas bandeiras — a estrela, embora de formato diferente, e o uso da cor azul — foram escolhas baseadas em características de Minnesota. Ele admite que sabia muito pouco sobre a Somália, incluindo a aparência da sua bandeira.
"Eu não tinha conhecimento sobre a Somália, sei que é uma postura um tanto ignorante. Não tinha a menor ideia sobre a Somália", diz ele.
Prekker afirmou que o governador Tim Walz não estava envolvido na supervisão da competição nem na seleção do projeto vencedor — alegação que foi reforçada pela Comissão de Redesenho de Emblemas Estaduais de Minnesota, que selecionou o design vencedor.
'História sensacionalista'
Embora a semelhança entre as bandeiras da Somália e Minnesota possa parecer bastante vaga, não é surpreendente que isso tenha levado a conversas amplamente compartilhadas nas redes sociais, diz o professor Samuel Woolley, chefe do departamento de Estudos da Desinformação na Universidade de Pittsburgh, nos EUA.
"As redes sociais são projetadas para promover conteúdo com base na quantidade de atenção que ele recebe, em vez de quão confiável ele é", afirma.
"Pesquisas mostram que rumores se espalham nas redes sociais muito mais rápido do que a verdade. Parte disso se deve simplesmente ao fato de que as pessoas adoram uma boa história sensacionalista."
Woolley explica que os algoritmos de tendências e recomendações das plataformas de rede social alimentam ainda mais as teorias da conspiração, uma vez que são "desenvolvidos sobretudo para priorizar conteúdo popular".
"Grupos coordenados de contas gerenciadas por humanos, contas de bots (robôs) automatizadas e alimentadas por inteligência artificial e outros mecanismos, possibilitam que grupos políticos burlem as verificações e contrapesos que existem nesses sistemas algorítmicos para viralizar", afirma.
John P. Wihbey, professor da Northeastern University, nos EUA, e membro da Iniciativa para a Democracia na Internet, baseada na universidade, acredita que a teoria da conspiração sobre Walz e a bandeira da Somália "claramente tem conotações racistas e xenófobas".
"Há muitas bandeiras ao redor do mundo que possuem elementos visuais semelhantes, como estrelas. O principal objetivo desta teoria parece ser confundir a população somali-americana com algum tipo de pauta progressista entre os líderes de Minnesota — e insinuar que líderes como o governador de Minnesota, Tim Walz, estão implementando uma agenda estrangeira em nome de populações (geralmente muçulmanas)", avalia.
Mas, segundo ele, o fato de tuítes terem sido curtidos não significa que as pessoas acreditam no material ou na mensagem.
"As pessoas geralmente sinalizam aprovação em relação ao conteúdo não porque acreditam racionalmente nele, mas porque estão indicando algum tipo de solidariedade em relação a uma visão geral de mundo — neste caso, uma visão de mundo que é antidemocrata e, talvez, antissomali", diz.
Para Andrew Prekker, o homem por trás da nova bandeira de Minnesota, a ideia de que seu design indica algum tipo de associação entre Tim Waltz e a Somália é uma loucura.
"Acho que a teoria da conspiração é simplesmente ridícula", afirma.
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