OPINIÃO

Fortalecer a Defensoria Pública é ajudar os mais atingidos pela pandemia

Defensoras e defensores públicos têm sido a esperança de milhares que buscam leitos de UTI, respiradores pulmonares, medicamentos e até oxigênio hospitalar, como aconteceu na tragédia em Manaus

Luciana Dytz* Rivana Ricarte*
postado em 29/07/2021 06:00 / atualizado em 29/07/2021 08:21
 (crédito: Fernando Lopes/CB/D.A Press)
(crédito: Fernando Lopes/CB/D.A Press)

 

A pandemia do novo coronavírus trouxe desafios e perdas irreparáveis a brasileiras e brasileiros de todas as classes sociais. Mas a crise sanitária atingiu com mais dureza a população pobre e agudizou a desigualdade social que assola o Brasil. Os 10% que fazem parte do topo da renda tiveram redução de 6,9% em rendimentos, enquanto os 40% mais pobres perderam 34,2%, segundo pesquisa do Observatório das Metrópoles, da PUC-RS, e do Observatório da Dívida Social na América Latina. Pretos e pardos também sofreram mais com a doença, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Covid-19, do IBGE. Entre aqueles que disseram ter tido mais de um sintoma de síndrome respiratória, 68,3% eram negros ante 30,3% de brancos. Para esses grupos, a covid-19 é o iminente risco de morte às portas de hospitais saturados, de fome e desnutrição, de perda do emprego e da renda.

Essa é também a parcela da sociedade mais dependente da ação da Defensoria Pública, que teve seu trabalho multiplicado durante a emergência de saúde. Defensoras e defensores públicos têm sido a esperança de milhares que buscam leitos de UTI, respiradores pulmonares, medicamentos e até oxigênio hospitalar, como aconteceu na tragédia em Manaus. Defensores públicos são também o meio de acesso à renda mínima para sobrevivência, quando atuam para assegurar o pagamento do auxílio emergencial a quem tem direito mas teve o pedido negado.

Se, antes da chegada do coronavírus, a demanda por acesso à saúde resultava em 500 mil atendimentos por ano, essa marca mais que dobrou em 2020. Em âmbito federal, 645 defensores públicos prestaram mais de 1,8 milhão de serviços jurídicos no ano passado, dos quais 500 mil relacionados apenas ao auxílio emergencial. Em âmbito estadual, 6.200 defensoras e defensores realizaram cerca de 14 milhões de atendimentos em todo país.

O aumento do contingente de pessoas que necessitam da Defensoria Pública, no entanto, não se traduziu em reforço de sua estrutura. Relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), divulgado neste ano, aponta que faltam 10 mil defensores públicos no Brasil.

De acordo com o IV Diagnóstico do Ministério da Justiça, de 2015, o ideal é a existência de um profissional para atender a cada grupo de 15 mil pessoas, adotando-se apenas o critério do rendimento. Atualmente, há cerca de 6.200 defensores estaduais públicos na ativa. Em uma análise superficial, isso significa que, hoje, cada defensor(a) seria responsável por atender a mais de 30 mil potenciais usuários. A Defensoria Pública da União (DPU) também estima que 33 milhões de pessoas ainda não são alcançadas pela instituição no âmbito da Justiça Federal.

Em 2014, o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional (EC) 80, determinando que, até 2022, defensores estejam presentes em todas as comarcas e locais onde houver uma unidade da Justiça Federal. Em junho, o texto constitucional completou sete anos sem que se tenha avançado em sua efetivação. O prazo, estabelecido de forma clara e precisa, está prestes a se encerrar, mas, até o momento, a presença de defensores nos estados e distrito federal, alcança 42% das comarcas, enquanto a da DPU não alcança nem 30% das varas da justiça federal.

A Defensoria Pública não é um mero instrumento para alcançar o Poder Judiciário. É a mão que ampara milhões de vulneráveis — a população de baixa renda, em situação de rua, os aposentados e pensionistas, os povos indígenas, os encarcerados, as minorias e os excluídos deste país — aos quais se somam os pequenos profissionais autônomos atingidos pela covid-19 que não podem pagar por assistência jurídica.

No aniversário da Emenda Constitucional 80, renovamos o apelo para que as autoridades brasileiras confiram a mais alta prioridade à interiorização da Defensoria Pública. Fortalecer a Defensoria é socorrer aqueles mais atingidos pela pandemia do coronavírus. É ajudar a superar a chaga da desigualdade social que nos envergonha. É tornar o país mais justo e solidário. Fortalecer a Defensoria Pública interessa a todos os cidadãos, interessa ao Brasil.

* Luciana Dytz é Presidente da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos Federais (Anadef)

* Rivana Ricarte é Presidente da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep)

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