Dia desses, ouvi uma observação comum de duas distintas senhoras - uma recém-aposentada do serviço público, privilegiada integrante da classe média brasiliense, e uma batalhadora faxineira, moradora de Águas Lindas de Goiás: "Não suporto a política. Não tem ninguém que presta. Nem aguento mais acompanhar os jornais. Nas próximas eleições, não vou votar em ninguém". Acrescentaram ainda críticas aos aparentes protagonistas do próximo pleito eleitoral, Lula e Bolsonaro, deixando escapar, cada uma à própria maneira, algum vestígio de preferência de um sobre o outro — algo que a publicidade no auge da campanha eleitoral tende a ressaltar.
O limitado recorte desta observação, talvez, reflita um cenário mais amplo da conjuntura nacional, merecedor de alguma reflexão a respeito. De início, a aversão popular aos temas políticos é um sintoma que carece de tratamento. Trata-se de uma verdadeira cilada plantada nos corações e mentes das comunidades, impedindo o necessário advento de cidadãos conscientes. Nosso histórico de frustrações com a classe governante não deveria abortar o anseio por aperfeiçoamento da gestão pública, mas servir de referência para futuras decisões diante das urnas. Ao matar a esperança de boa parte do eleitorado, os corruptos no poder se beneficiam claramente e perpetuam os planos de dominação e privilégios.
Descarregar a culpa nos jornais é uma ilusória válvula de escape. A imprensa, como praticamente todas as demais instituições democráticas brasileiras, precisa reconhecer e aprender com os próprios equívocos, mas jamais deixou de ser uma grande aliada da população. Simplesmente virar as costas para o bom serviço prestado por jornalistas profissionais, comprometidos com a busca da verdade dos fatos, apenas, mais uma vez, interessa aos que lucram com a ludibriação das massas de pagadores de impostos. Em vez disso, continua válido o esforço diário de acompanhar o noticiário, com olhar analítico, sempre o contrapondo com a realidade prática do dia a dia, para além das telas e das sobreviventes páginas impressas.
Feita a mea-culpa, resta olhar para o cenário que se aproxima. Apesar dos notórios fracassos administrativos, marcados por grosserias, incompetência e corrupção, Bolsonaro e Lula despontam na corrida à sucessão presidencial. Pela experiência e poderio acumulados, são os rivais a serem batidos. Se confirmar a candidatura, Moro tentará se apegar à imagem de combatente dos dois polos populistas e terá de sobreviver aos duros ataques que sofrerá de ambos os lados para alcançar a prometida renovação no comando da nação. Assim como o ex-juiz, outros nomes se colocam como alternativa à polarização petista/bolsonarista, mas a mensagem precisa alcançar e convencer o eleitorado — um árduo desafio.
Aos maiores interessados e possíveis vítimas desse jogo, cabe a compreensão e o bom senso de dedicar o valioso voto a quem demonstre, de fato, alguma capacidade administrativa frente aos imensos desafios dos nossos tempos — da pandemia à crise climática, da economia à educação e segurança. E que os representantes dos Poderes Executivo e Legislativo possam colaborar, mutuamente, na construção de um projeto sustentável para o Brasil.
Saiba Mais
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.