Visto, lido e ouvido

Escolas, cidades e pandemia

Circe Cunha
postado em 01/12/2021 06:00

Por certo, de todos os efeitos deletérios à saúde física e mental dos indivíduos, trazidos pela pandemia, nenhum outro é mais nocivo ao corpo e à mente do que o isolamento social, imposto pelas autoridades de governo, principalmente nos centros urbanos, onde o processo de interação entre as pessoas é fator fundamental para a existência da própria cidade.

A questão contraditória está em como fazer para que as cidades funcionem sem o protagonismo daqueles que são os responsáveis diretos por seu dinamismo. De fato, não é possível a movimentação de toda a engrenagem de uma cidade, sem suas peças principais, representadas pelas pessoas e, não o mínimo de racionalidade em ter toda uma infraestrutura e mecânica de uma cidade, sem aqueles a quem se destina todo esse esforço. Pelo jeito, estamos na trilha certa, para tornarmos nossas cidades em lugares fantasmas, tomadas pelo pó denso da decadência, num processo que, depois de iniciado, será difícil deter. Ao contrário do que muitos imaginam, as cidades não adormecem, não fecham para balanço e não tiram férias. Para as cidades, não vale a célebre expressão "eppur si muove", provavelmente dita, em 1633, por Galileu Galilei, perante o tribunal da Inquisição. Já o mecanismo urbano é operado diuturnamente pelo gênero humano. A autonomia dada aos habitantes dos centros urbanos, não vale em relação às cidades.

Dito isso, fica mais fácil entender que o próprio futuro de nossas cidades e de toda a vida social é dependente direto e perpétuo do lento processo de formação acadêmica de seus habitantes. Em outras palavras, é preciso formar, sempre e cada vez mais, pessoas aptas a conduzir as cidades, sob pena de termos que abandoná-las, ameaçados pelo eventual caos, que representaria para todos nós, deixá-las administradas por mãos inabilitadas.

Nesse ponto é preciso entender que a pandemia, muito antes de representar um fator de perigo para cada um de nós, representa uma ameaça ainda maior para nosso habitat, tornando, inclusive, nossos centros urbanos em uma ameaça à nossa integridade.

As contradições, em tempos de pandemia, se acumulam. Não há como ficar na pretensa segurança do lar, deixando à cidade entregue as forças naturais da inércia. Tão ou mais importante que não deixar as engrenagens das cidades pararem, colocando a mão na massa, como fazem, por exemplo, médicos, trabalhadores da limpeza, da segurança e outros, é manter, de forma ininterrupta, sobretudo os mais jovens, nas escolas, em salas de aula, num intenso trabalho de preparação intelectual para uma futura substituição dos mais velhos no controle de nossa vida coletiva e urbana.

Salvar as cidades da pandemia é salvar seus habitantes. A possibilidade de uma nova onda, que se anuncia com essa nova variante do coronavírus, denominada de ômicron, quando ainda muitas de nossas cidades nem tiveram tempo de se recuperar de um primeiro surto, deixa ainda mais incertezas e aponta para a necessidade de manutenção redobrada de nossas cidades.

É sabido, por muitos povos, que a cidade é a extensão natural de nossas casas. Portanto, está dentro dos limites do que seria o nosso território de vivência. Fechar as cidades, deixá-las entregues à própria sorte, como tem acontecido em outras partes do país e do mundo, é apostar na nossa ruína.

Por isso, preservar os mais jovens significa, antes de tudo, dar-lhes os instrumentos necessários, por meio do ensino continuado, para que possam, mais do que sobreviver, encontrar a plenitude da vida em ambientes saudáveis e seguros. Somente a escola e o ensino de qualidade podem garantir, neste momento de expectativas e receios, um porto seguro para as futuras gerações. É no ambiente escolar que estão não só todas as respostas para a superação desse momento de aflição, como para a continuidade de nossas cidades e o prosseguimento de nossa própria espécie.

 


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