Visto, lido e ouvido

Artigo: A crise entrou de férias

Circe Cunha
postado em 26/12/2021 06:00

Passadas as festas de fim de ano, 2022, que já se anuncia no horizonte, promete ser um tempo de grandes expectativas para o país e para os brasileiros. As mudanças que o país necessitava para, ao menos, se ver livre dos muitos problemas enfrentados ao longo de 2021, simplesmente não foram realizadas e sequer foram alinhavadas para o ano que começa. Não há, até o momento, evidência alguma de que os assuntos de Estado, de vital importância para a vida do cidadão e da sociedade, tenham sido tratados ou equacionados quer pelo Executivo ou pelo Legislativo. Com isso, o que temos pela frente são incertezas e um acúmulo de questões que vão se juntando e que acabarão agora misturadas às eleições ou diluídas em infindáveis debates e discussões políticas frívolas e sem resultados práticos. A pandemia embrulhou todas essas questões num volumoso pacote de fim de ano e esse parece jazer esquecido bem no meio da Praça dos Três Poderes, debaixo da chuva e sob o olhar indiferente das autoridades. As únicas providências que parecem existir, para esse novo ano, se resumem na movimentação das campanhas, um tema que interessa, sobremaneira, apenas aos candidatos, todos de olhos postos nos futuros mandatos.

É nesse ponto que as coisas começam a fazer algum sentido para o cidadão desperto. Não existe, de fato, um Estado brasileiro, no sentido moderno do termo ou que possua sequer algum sentido conceitual ou prático dentro do que se entende por ciência política. O que há é um arranjo improvisado, distante das premissas de República, feito por indivíduos que encontram, no controle da máquina do Estado, benefícios para si e para seu grupo no entorno.

Para tanto exercem esse domínio, distribuindo os encargos que esse controle gera para o restante da população sobre a forma de impostos, tributos e outras taxações. As crises institucionais cíclicas, decorrentes desse arranjo, são todas elas oriundas de conflitos internos entre os controladores da máquina do Estado, e não dizem respeito ao cidadão comum, que permanece à margem de todo esse processo.

No Brasil, o agravante dessa disformia de governo decorre do fato de que todo esse arranjo, feito sob a falsa fantasia de eleições e outros mecanismos da democracia, que empresta a esse processo um pálido verniz de legalidade e constitucionalidade, é feito sob critérios de compadrismo, semelhante ao que apontava Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil, quando criou o conceito do homem cordial.

O que presenciamos nesse governo com mais nitidez e, em outros passados, com maior ou menor grau, é essa constante em fazer da máquina pública do Estado uma instância a prover diretamente os indivíduos que a controlam e que professam o mesmo credo ou possuem laços sanguíneos ou ideológicos. Ao restante, às leis e o jugo de instâncias como a Receita Federal, e outros órgãos de controle do Estado.

Em linhas gerais é o que existe e que é causa e consequência de tudo o que aflige o país. Com a chegada das festas de fim de ano, se é que existem razões para se falar em festas, pelo menos existe a perspectiva de que o grosso das chamadas autoridades estão em recesso prolongado longe do poder. Tal fato pode ser encarado como algo animador, já que se constata, nesse período, que a "crise" entrou de férias e viajou para bem longe da capital.

 


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