Sou naturalmente uma colecionadora de frases. Fico pescando das entrevistas, dos textos, dos livros, das conversas. Uma declaração bem formulada, cheia de sentido e de verdade, que venha lá do fundo, seja do coração, seja da experiência vivida, seja do impulso, me dá força e ânimo, me ensina e alimenta. Acho bonito, copio, guardo, reflito, repasso. Nessa semana difícil que passou, a frase veio da minha netinha, Liz: "Voinha, com quem a gente conversa pra ser tudo feliz?".
Chateada porque sua festinha de 5 anos na escola foi adiada, ela ainda lidava com a expectativa de hoje ser um dia de sol para comemorarmos ao ar livre no Eixão do Lazer. Enquanto escrevo ainda não sei se a chuva dará trégua para a festa de Liz, mas fiquei pensando aqui que resposta mais completa eu daria para a pergunta dela.
Afinal, com quem a gente conversa para ser tudo feliz?
Liz, meu amor, converse com seu coração. Aos poucos, você vai entender que ele tem as melhores respostas. Converse um pouco com seu Deus também, seja qual for sua fé. Escute a natureza, o barulho do vento, das florestas — eles podem te responder muita coisa. Troque uns olhares profundos e uns abraços demorados com seus amores.
Essas conversas íntimas são a própria felicidade. A felicidade das coisas viáveis, pequenas porque rotineiras, mas tão prazerosas. A felicidade de ser digno da vida e estar presente na grandeza que é esse universo. Prefiro chamar tudo isso de contentamento.
É o que costumo desejar para minha neta, meus filhos, meus amigos — que sejam contentes aqui e agora, e que tenhamos o bastante: saúde física e mental, amor por nós mesmos e pelo próximo e consciência da nossa condição de privilégio nesse país moribundo, padecendo de uma falta de humanidade incrível, com tanta gente ruim, que nem consigo nominar mais.
A gente já nasce cheio de expectativa. Os pais à espera do choro; depois, do riso; depois, da formatura; do casório; dos netos. Jamais deveríamos perguntar para uma criança o que ela deseja ser quando crescer. Creio que deveríamos desejar apenas ser o que somos, no tempo em que estamos. O que não significa perder a capacidade de sonhar - desde que não seja sonhar com uma felicidade que não existe. Nem de lutar, de se indignar, de protestar, de denunciar.
"Tudo feliz" é o reino distante, depois da floresta de espinhos. A gente chega nele, Liz, depois de uma longa caminhada pela vida e árduas batalhas contra nossas expectativas tolas. Abre o portal do reino, lá dentro tem um espelho enorme e nele a gente encontra a pessoa que faz "tudo feliz". Então, vamos ter aquela conversa, nosso acerto de contas. Felizes são os que têm essa chance.
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