Análise

Artigo: É o regime presidencialista realmente o nosso problema?

O mecanismo do presidencialismo de coalizão pode não ter produzido seus melhores resultados, mas na sua forma, em que é atacado, pode servir de cortina de fumaça para esconder o outro lado que influencia o problema

Correio Braziliense
postado em 18/07/2022 06:00
 (crédito:  Pedro França/Agência Senado)
(crédito: Pedro França/Agência Senado)

FÁBIO OURIQUE DA SILVA - Consultor político, especialista em gestão pública, formado em administração

Em que pese o fato de boa parte dos países desenvolvidos ter adotado o sistema parlamentarista como forma de governo nas já consolidadas democracias vigentes (algumas em vias de se tornarem centenárias), existe o fascínio no imaginário brasileiro sobre o não explorado, ou o usual em outros países como sendo a solução para o Brasil, imaginando que a cultura, os usos e costumes brasileiros pudessem ser subjugados e qualquer alteração de regime e forma de governo, pura e simplesmente, como num passe de mágica, transformaria o país.

É necessário ter uma constância no hábito da disciplina e estudo em política para nos mostrar que o poder da transformação está aliado ao voto que nos é de direito o único instrumento para mudar o que está instalado numa das casas legislativas do Brasil, a Câmara dos Deputados. Isso, por conseguinte, torna a eleição dos seus membros de extrema relevância e preocupação central dos brasileiros.

Para além de responsabilizar a forma de governo, por exemplo, culpar o presidencialismo de coalizão, muito achincalhado pelo senso comum (que nos perdoe Sergio Abranches que cunhou a expressão), é preciso, sem sombra de dúvida, jogar luz na estrutura do problema. E qual seria ele?

O mecanismo do presidencialismo de coalizão pode não ter produzido seus melhores resultados, mas na sua forma, em que é atacado, pode servir de cortina de fumaça para esconder o outro lado que influencia o problema: o que a composição da Câmara dos Deputados produz e quem é enviado a Brasília para ocupar os assentos do parlamento para que boa parte dos imbróglios do país tenha encaminhamento mais positivo, pois é de responsabilidade da Câmara dos Deputados a construção do orçamento federal e das emendas parlamentares, aprovação de leis, alteração da Constituição e até mesmo a famigerada admissibilidade do processo de impeachment e sua votação.

A partir das eleições próximas, num eventual novo governo, os brasileiros deveriam produzir, antes de tudo, uma nova legislatura com uma Câmara dos Deputados mais austera, independentemente do regime e da forma que adotar, até mesmo a preconizada pelo professor Michel Temer, a semipresidencialista. Porém, cabe ressaltar que precisamos de mais profundidade de análise, mais dedicação em escolher os representantes. Não é incomum em roda de amigos alguém responder que não lembra em quem votou para deputado federal nas últimas eleições.

Também se verifica que o último processo eleitoral não produziu resultados efetivos no Legislativo, haja vista que em 2018 os brasileiros renovaram 243 deputados federais, são 47,3% de novos ocupantes das cadeiras da câmara federal. Essa renovação, a despeito da novidade, não garantiu diferenças nas negociações do governo com a casa legislativa, como, por exemplo, sobre emendas parlamentares, pois instituiu um orçamento secreto. Inclusive não alterou a negociação para a eleição do presidente da casa e muito menos produziu diferenças na aprovação do fundo eleitoral.

Portanto, rogamos para a reflexão de que a eleição mais importante, que fará a transformação da realidade do país, é a que preenche as vagas dos deputados federais, perfazendo a compreensão que monta não só para o presidente da República esse compromisso, como avalia o senso comum, mas responsabilizando a Câmara dos Deputados; afastando de vez o debate de que a recuperação do país se daria somente pela via de alteração da forma de governo.

Esses concretos fatos denunciam a dificuldade dos brasileiros em escolher seus representantes e, para além da forma de governo, é importante perceber quem interfere no país significativamente, quem dá a última palavra. Consequentemente, se faz necessária a adoção da disciplina em acompanhar o cenário político para uma escolha de maior qualidade dos deputados federais (passado, presente e propostas para o futuro), mas prioritariamente absorvermos a ideia de que é na câmara dos deputados que habita o poder incisivo nas decisões importantes do país, possuindo papel central na vida de cada brasileiro.

É preciso assim delegarmos a relevância desse voto a mesma importância que delegamos ao pretenso "salvador" presidente da república que comumente fazemos, e teremos com esse entendimento dado um passo eficaz para alteração do status quo da nação, rumo à transformação na nossa neófita democracia, ampliando a visão sobre o problema, tendo sob maiores horizontes a oportunidade de trazer um bem maior para o nosso país.

 

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