Opinião

Artigo: O papel do servidor nos novos tempos

Nenhum outro agente está em tudo como o serviço público. O setor privado não tem a abrangência, a capilaridade, os incentivos nem a legitimidade que o governo tem para lidar com nossos variados problemas sociais

Correio Braziliense
postado em 08/12/2022 06:00
Servidores públicos fazem manifestação em frente ao Ministério da Saúde com destino à Praça dos Três Poderes em maio de 2022 -  (crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)
Servidores públicos fazem manifestação em frente ao Ministério da Saúde com destino à Praça dos Três Poderes em maio de 2022 - (crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)

HELENA WAJNMAN — Diretora executiva da República.org

Engana-se quem pensa que o serviço público tem papel pequeno ou irrelevante na vida do brasileiro. Engana-se ainda mais quem pensa que o serviço privado poderia substituí-lo amplamente. Acredite: o serviço público está em tudo, em todos os aspectos da nossa vida, ainda que pareça invisível para olhos mais desatentos. Ele está na certificação de alimentos para consumo, na organização do tráfego das cidades, na moeda utilizada nas compras, na conservação de estradas e em tantos outros momentos.

Nenhum outro agente está em tudo como o serviço público. O setor privado não tem a abrangência, a capilaridade, os incentivos nem a legitimidade que o governo tem para lidar com nossos variados problemas sociais. Dados do último Censo Escolar mostram que 83% dos estudantes brasileiros estão matriculados na rede pública. Quando se trata de saúde, 80% da nossa população depende exclusivamente de serviços públicos, segundo o Ministério da Saúde. Portanto, não há caminho para o nosso desenvolvimento, como uma sociedade justa e igualitária, que não passe pela profissionalização e modernização do serviço público.

O serviço público é feito por pessoas comuns, espalhadas por todo o país. Dados da Rais 2017 revelam que mais de 11 milhões de brasileiros dedicam a jornada de trabalho para servir o país. Desse total, cerca de 60% são funcionários públicos municipais, com salário médio mensal de R$ 2.800. Outros 32% são servidores estaduais, recebendo uma média mensal de R$ 5 mil. Os servidores federais somam menos de 9% do total e têm renda média de R$ 9.100. Os chamados supersalários — aqueles acima do teto constitucional, que configuram um problema moral e puxam rótulos como o de "parasita" para todo o funcionalismo — representam apenas 0,23% do total de empregos públicos, de acordo com levantamento feito pelo Centro de Liderança Pública. Essa parcela está concentrada principalmente no Judiciário e no Ministério Público. Ou seja: os supersalários são exceção, e a maioria dos servidores vive com rendimentos módicos.

Mesmo sem receber altos salários, a administração pública reúne vários dos profissionais mais dedicados e inspiradores do Brasil. Para valorizar esses servidores, o Prêmio Espírito Público — realizado pela República.org em parceria com a Fundação Lemann e o Instituto Humanize — vem reconhecendo esses profissionais que transformam realidades. Nos últimos cinco anos, premiamos e demos maior visibilidade ao trabalho de diversos servidores que mostram, em suas trajetórias, comprometimento com o país. Muitos, inclusive, têm se engajado de forma antagônica a projetos de desmantelamento do serviço público, resistindo ao assédio praticado pelo atual governo federal.

O país vive agora a aurora de novos tempos. Precisamos nos preparar para a reconstrução do Estado brasileiro, que passou por um profundo processo de desmonte nos últimos anos. Os profissionais públicos serão cruciais nesse processo. Foram eles as principais âncoras que mantiveram o Estado de pé nos quatro anos que se passaram e, neste momento, cumprirão papel fundamental no processo de regeneração do tecido institucional da administração pública federal.

O novo governo precisa avaliar as formas de acesso ao serviço público — seja o acesso para servidores efetivos, via concursos, seja o acesso para cargos de confiança — e selecionar pessoas com as competências necessárias, imbuídas de espírito público. A nova gestão também precisa se debruçar sobre o problema da desigualdade dentro do funcionalismo público, corrigindo distorções nas carreiras. Será necessário ainda criar mecanismos de acompanhamento, engajamento e gestão de desempenho. Também é urgente ampliar medidas que promovam maior diversidade na burocracia, para dar mais espaço a grupos historicamente sub-representados no Estado brasileiro.

As pessoas são os maiores ativos dos governos. A qualidade do serviço público prestado à população nunca será superior à qualidade do prestador. E a qualidade do prestador, nesse caso, não se refere apenas às suas habilidades ou qualidades técnicas, mas também à forma como ele é valorizado, reconhecido e gerido. É por isso que a gestão de pessoas no serviço público será ainda mais crucial nos novos tempos.

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