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democracia brasileira

Artigo: Desafio dramático

pri-0201-opiniao Opinião -  (crédito: Caio Gomez)
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postado em 02/01/2023 06:00

ANDRÉ GUSTAVO STUMPF - Jornalista (andregustavo10@terra.com.br)

No feriado de 12 de outubro de 1977, o Palácio do Planalto amanheceu protegido por soldados e atiradores de elite em posições estratégicas. O presidente da República decidira exonerar seu ministro do Exército, Sylvio Frota, que era abertamente contrário ao processo de abertura lenta e gradual na política brasileira. Naquele Dia de Nossa Senhora Aparecida para os católicos ou de comemorar a descoberta da América, ocorreu o confronto decisivo entre os partidários da democracia e os defensores do regime fechado conduzido pelos militares.

Os herdeiros daquela turma de perdedores se espalharam pela babel brasileira. Uns se envolveram com o negócio das drogas, que no final dos anos setenta passou a ter maior presença no Brasil. Os jogos de azar atraíram alguns, outros decaíram para o grupo de ladrões profissionais do erário e milicianos que infestaram áreas não protegidas pelos governos locais e nacional. Militares indignados sempre houve. O jovem militar Jair Bolsonaro foi punido por tentar colocar bomba no quartel por causa de baixos salários. Ele sempre se manifestou contra a anistia.

Teve início precisamente naquele momento o lento processo de organização recente da extrema direita no Brasil. A insatisfação na caserna era grande. Na década de 1980, houve uma série de explosões de bomba em jornaleiros e até na sede da Ordem dos Advogados do Brasil, no Rio de Janeiro. A mais séria delas ocorreu em 1981 quando dois militares do Exército tentaram explodir a estação de energia do Riocentro — enorme centro de convenções na Barra da Tijuca — durante a realização de um show de música popular. A bomba explodiu antes da hora, matou o sargento e feriu gravemente um capitão. O Exército brasileiro foi flagrado e fotografado naquela operação.

Essa é a face visível daqueles que se colocam contra o regime democrático. Seu aspecto menos conhecido é a ação daqueles que perderam o bonde da história quando houve a decisão de abrir o regime e passaram a trabalhar com tráfico de drogas, crime organizado e posteriormente as milícias, que hoje infestam a cidade do Rio de Janeiro. Esse grupo sempre tentou ter representação política. Encontrou na figura do capitão Jair Bolsonaro, truculento e pouco instruído, o candidato perfeito. Era o personagem favorável à tortura, contra a anistia e a favor da ditadura militar, deputado federal ideal para representá-los na alta política.

Bolsonaro, contra todas as expectativas, venceu a eleição sem partido forte, sem projeto e sem equipe. Ele se socorreu dos militares que, antes, haviam sido afastados do poder. O ajudante de ordens do general Silvio Frota era o capitão Augusto Heleno, general e chefe do Gabinete de Segurança Institucional. Foi ele que disse, na porta do Palácio da Alvorada, "infelizmente, Lula não morreu". Nos Estados Unidos, Donald Trump, presidente, também fora dos padrões usuais daquele país, assumiu posição de direita radical na política interna e na área externa decidiu confrontar a China. No que foi imediatamente imitado por Bolsonaro.

O desalento da população com os resultados apresentados pela gestão do Partido dos Trabalhadores nos governos Dilma Rousseff e Lula produziram o fenômeno Bolsonaro. O fracasso dos petistas, que se enrolaram em sucessivas denúncias de corrupção na Petrobras — dentro e fora do país — e outros organismos do governo federal produziram a desolação, a descrença e o antipetismo que vicejou na eleição de 2018. Esse antipetismo elegeu um capitão despreparado para presidir a nação brasileira. Um desastre.

O tempo passou, o Supremo Tribunal Federal errou antes ou errou depois, mas o fato é que de presidiário Lula tornou-se pela terceira vez presidente da República. A votação foi apertada, vantagem de estreitos 2 milhões de votos, porque muitos brasileiros têm memória, ao contrário do que se pensa. Os desmandos de Bolsonaro funcionaram contra ele e fizeram surgir o antibolsonarismo, que ajudou agora a recolocar Lula no Palácio do Planalto.

Trata-se de desafio brutal, profundo, devastador, combate de vida ou morte para subir ao pódio dos grandes líderes brasileiros. Não há espaço para vacilo, nem erro. Lula não poderá agir da mesma maneira que fez antes e esperar resultados diferentes. Depois de chegar ao espaçoso gabinete do terceiro andar do Palácio do Planalto só lhe resta avançar para deixar seu cargo, daqui a quatro anos, maior do que entrou. Caso contrário, as acusações do passado vão reaparecer de forma explosiva na política brasileira. Momento dramático da história do Brasil.

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