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litoral norte de São Paulo

Artigo: Mesma tragédia, mesmas vítimas

 Desmoronamento causado pelas chuvas no bairro Itatinga, conhecido como Topolândia, em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo.
       -  (crédito:  Rovena Rosa/Agência Brasil)
Desmoronamento causado pelas chuvas no bairro Itatinga, conhecido como Topolândia, em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo. - (crédito: Rovena Rosa/Agência Brasil)
postado em 22/02/2023 06:00

Os dias alegres de carnaval foram marcados pela tragédia que atingiu o litoral norte de São Paulo. Como todos os anos, nesta época, os temporais causaram deslizamentos, soterramentos, alagaram as ruas, mataram e desalojaram famílias. Segundo o último levantamento da Defesa Civil, foram 48 mortos, 40 desaparecidos e 2.500 famílias que tiveram que deixar suas casas, seja para fugir do perigo, seja porque as casas não existem mais. Os números ainda podem aumentar.

Os primeiros meses do ano são sempre marcados pelos estragos da chuva. Em março do ano passado, o estado mais atingido foi o Rio de Janeiro. Em Petrópolis, 233 pessoas morreram. Ao longo do ano, foram 11 desastres causados por temporais, que mataram 478 pessoas pelo país. Chama atenção ainda que em julho de 2022 o número de mortes já havia superado o do ano anterior em 188, e que o ano passado concentrou mais de 27% das vítimas fatais da chuva da última década. As cidades e estados afetados mudam, mas há uma característica óbvia entre as pessoas que mais sofrem com os desastres: são de baixa renda e moram em locais de alto risco. Importante ainda lembrar que, no Brasil, onde há recorte de renda, também há recorte de cor.

Segundo levantamento da Organização das Nações Unidas (ONU), de 2016, 90% das mortes por desastres naturais ocorreram em países em desenvolvimento, de média ou baixa renda. Outro dado, da consultora indiana Climate Trends, mostra que moradores de regiões de baixa renda têm sete vezes mais chance de morrer nos desastres causados pelas mudanças climáticas e risco seis vezes maior de se ferirem ou ficarem desalojadas.

Por sinal, há alguma dúvida de que esses temporais são influenciados pelo clima? As cidades do litoral paulista ficaram embaixo do maior volume de água já registrado no país, 683 milímetros, superando o recorde anterior visto em Petrópolis no ano passado (534,4mm). Antes disso, o maior volume registrado era de Florianópolis, em 1991 (404,8mm).

Não é difícil entender o porquê das pessoas mais pobres serem as mais atingidas. Sem acesso a moradias em regiões seguras, elas constroem suas casas onde podem, sem apoio estatal, sem infraestrutura e, muitas vezes, em condições precárias. Não é por escolha que uma família vai morar embaixo de uma parede de lama que pode deslizar a qualquer momento. É falta de oportunidade e ação do poder público. Além disso, após o desastre, os mais abastados têm maior chance de se salvarem. Relatos da tragédia paulista contam que alguns moradores mais ricos foram resgatados em helicópteros. Dos bombeiros? Não, particulares.

É importante que o governo federal e autoridades locais atuem no resgate e reconstrução, como parece estar sendo feito de forma célere em São Paulo. Mas não dá para agir apenas depois do estrago. As populações vulneráveis devem ter acesso a programas de habitação, a possibilidade de sair dos locais de risco, infraestrutura para mitigar os danos nos locais habitados, educação e uma rede de apoio para a crise. E isso terá que ser feito com o menor orçamento federal em 14 anos para a prevenção de desastres, de R$ 1,2 bilhão.

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