Opinião

Visão do Correio: Vacinar crianças é prioridade nacional

Segundo o relatório do Unicef, a cobertura vacinal diminuiu em 112 países pesquisados. Entre 2019 e 2021, um total de 67 milhões de crianças deixaram de ser imunizadas

A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) deu início, neste sábado (22/4), à Semana da Vacinação nas Américas 2023. Trata-se de uma iniciativa para reverter o quadro dramático que se formou no continente, duramente atingido pela pandemia de covid-19 e sob a ameaça de doenças que poderiam ter sido erradicadas, como a poliomelite. A campanha lançada pela Opas, com adesão do Ministério da Saúde, vem acompanhada de um estudo abrangente, conduzido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). E o Brasil, outrora referência em campanhas de vacinação, desponta com dados alarmantes nesse cenário.

Segundo o relatório do Unicef, a cobertura vacinal diminuiu em 112 países pesquisados. Entre 2019 e 2021, um total de 67 milhões de crianças deixaram de ser imunizadas, e o percentual de vacinadas chegou a 81%, o menor patamar desde 2008. No período pesquisado, 1,6 milhão de crianças brasileiras não recebeu nenhuma das três doses da vacina DTP, indicada para prevenir contra difteria, tétano e coqueluche. Esse mesmo contingente de crianças não-imunizadas ficou excluído da vacina contra a poliomelite, enfermidade que causou sofrimento a milhões de famílias no século passado.

O diagnóstico da ministra da Saúde, Nísia Trindade, não poderia ser mais cirúrgico. "Atualmente, o Brasil conta com uma cobertura vacinal das mais baixas da sua história desde a criação do Programa Nacional de Imunizações. Já tivemos 95% de cobertura em relação a vacinas como a da poliomielite, e agora não chegamos a 60% de crianças vacinadas. Esse quadro tem que mudar. Para isso, de uma maneira muito clara, temos de combater o negacionismo em relação a essa proteção dada pelas vacinas e às fake news que infelizmente têm sido veiculadas de uma forma irresponsável e criminosa", ressaltou Trindade.

As declarações da ministra indicam o tamanho do desafio que se apresenta ao poder público e da sociedade brasileira. Faz-se urgente a retomada das campanhas de vacinação, a fim de combater movimentos que desafiam a ciência, confundem as famílias e prejudicam as crianças, os cidadãos mais vulneráveis nessa cruzada irracional. Nunca é demais lembrar: o artigo 227 da Constituição Federal determina que "é dever da família, da sociedade e do Estado" assegurar à criança e ao adolescente o direito à saúde.

Não é preciso ser especialista em epidemiologia para perceber o benefício que a imunização proporciona à saúde pública. Ainda é recente e dolorosa a memória da tragédia que se abateu no Brasil com a pandemia de covid-19, doença que só recuou graças ao esforço de vacinação e após ceifar mais de 700 mil vidas. Registre-se que o governo anterior teve importante responsabilidade neste quadro, ao colocar em dúvida a eficácia de imunizantes aplicados em escala global e, assim, alimentar estultices em meio a uma calamidade sanitária.

O resultado da irresponsabilidade sanitária está aí. Segundo o relatório do Unicef, houve uma queda significativa da percepção sobre a importância da vacinação. Antes da pandemia, 99,1% dos brasileiros confiavam nas vacinas infantis. Após o choque da covid-19, essa taxa caiu para 88,8%. Não se trata, pois, de uma querela político-partidária. Defender a vacinação é assegurar a uma geração de brasileiros as melhores condições de saúde possíveis para exercerem seus direitos de brincar, de ir à escola, de conviver com amigos e familiares sem limitações na saúde. É garantir um futuro a quem não tem a maturidade para decidir sobre seu estado de saúde.

Considerando-se a desigualdade social brasileira, ainda há outro ponto a destacar. Os índices mais baixos de imunização verificam-se na parcela da população mais pobre, precisamente a que mais depende de serviços públicos de saúde. A vacinação, pois, constitui medida de natureza econômica, pois contribui para reduzir os custos inerentes a atendimento, internação e tratamento de crianças.

Espera-se, portanto, que o Brasil retome o quanto antes sua vocação de país exemplar na cobertura vacinal, particularmente em relação aos pequenos.

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