EDITORIAL

Visão do Correio: Taxa de juros muito além da inflação

A economia dá sinais de desaquecimento e já provoca redução de preços no atacado, com os indicadores registrando deflação e apontando para o arrefecimento dos reajustes de preços. Em abril, o Índice Geral de Preços — 10 (IGP-10) teve deflação de 0,58% puxada pela queda de preços ao produtor. O Índice Geral de Preços — Mercado (IGP-M), que serve de base para o reajuste dos aluguéis, variou 0,05% em março, acumulando alta de 0,20% no ano e de 0,17% em 12 meses. Para mostrar o recuo forte dos preços, basta lembrar que em março do ano passado o indicador registrava alta de 1,74%, com aumento de 14,77%. Mesmo com esse sinal claro de desaceleração da inflação e os preços das commodities agrícolas recuando, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central deve manter a taxa básica de juros (Selic) em 13,75% na reunião de 2 e 3 de maio.

Isso porque a expectativa é de que os preços voltem a ser pressionados no segundo semestre. Entidades do comércio e da indústria avaliam que a redução nas taxas de juros já deveria ocorrer nesta reunião, mas economistas e empresários de outros setores entendem que o Copom iniciará a redução das taxas a partir de agosto, havendo convergência para que a expectativa chegue a 12,50% no fim do ano. Isso significa que a taxa de 13,75% será mantida também na reunião de 20 e 21 de junho, podendo cair 0,25 ponto porcentual no encontro seguinte, em 1 e 2 de agosto. O recuo para o patamar de 12,50% pode ser feito com dois cortes de 0,5 ponto porcentual nas três reuniões restantes até dezembro.

A aprovação do novo arcabouço fiscal no Congresso pode ampliar a expectativa de corte da taxa de juros, principalmente se o mercado financeiro projetar taxas menores em prazos mais longos. O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, frisa não saber a partir de quando os juros vão cair, mas observa que a economia não gira em torno da Selic. Em sabatina no Congresso, Campos Neto observou que o núcleo da inflação (excluindo efeitos de desoneração e oneração de preços) ainda é muito alto, ficando em torno de 8% em 12 meses e caindo para 7% no primeiro trimestre deste ano, ainda longe da meta de inflação fixada em 3,25% para este ano. Na prática, é a inflação quem vai determinar o momento de redução dos juros.

É preciso lembrar ainda que as taxas de juros não são determinadas apenas pela inflação e sofrem os efeitos da dívida pública elevada e do volume de crédito subsidiado. Em sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, Campos Neto lembrou que o crédito direcionado no Brasil representa 42% do volume total, enquanto no México é 26%, na Colômbia, 3,8% e na China, 2,1%. São créditos com subsídios, como o rural, o imobiliário e os empréstimos do BNDES.

Ao governo cabe, em lugar de criticar a autoridade monetária, buscar medidas e mecanismos para permitir que as taxas de juros recuem, com a aprovação do arcabouço fiscal e a busca de medidas para assegurar a redução do déficit neste ano e o equilíbrio nas contas públicas no ano que vem, zerando o déficit primário. É essa percepção de que as metas fixadas nas novas regras de controle de gastos a serem votadas no Congresso serão cumpridas e evitarão a aceleração da dívida pública. Inflação em baixa e credibilidade e confiança na política econômica vão permitir a redução das taxas de juros, não de forma artificial como ocorreu no passado e sabemos bem as consequências.

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