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Artigo: A incoerente acusação sul-africana na Corte Internacional de Justiça

Por mais que tente se firmar como um bastião dos direitos humanos em virtude de seu passado marcado pelo apartheid, a África do Sul tem um histórico recente de ignorar as decisões de tribunais internacionais

. -  (crédito: TPI/Divulgação)
. - (crédito: TPI/Divulgação)

»Igor Sabino, doutor em ciência política pela Universidade Federal de Pernambuco, gerente de conteúdo da StandWithUs Brasil e fellow do The Philos Project

» Isabella Buium, especialista em contraterrorismo e segurança nacional pela Universidade Reichman e analista de dados da StandWithUs Brasil


Recentemente, a África do Sul denunciou Israel na Corte Internacional de Justiça (CIJ) acusando o país de cometer genocídio contra os palestinos na Faixa de Gaza. A denúncia foi aceita pelo órgão da ONU e, lamentavelmente, contou com o apoio do Brasil, num abandono claro de sua tradição histórica de equidistância em relação ao conflito israelo-palestino, ao abraçar uma acusação anti-Israel meramente política e marcada por incoerências da própria conduta sul-africana.

Por mais que o país tente se firmar como um bastião dos direitos humanos no cenário internacional em virtude de seu passado marcado pelo apartheid, a África do Sul tem um histórico recente de ignorar as decisões de tribunais internacionais. Isso deveria, ao menos, levantar suspeitas sobre as motivações por trás da tentativa de imputar a Israel o crime de genocídio.

Em 2017, o Tribunal Penal Internacional (TPI), outro órgão sediado em Haia que julga crimes contra a humanidade, condenou a África do Sul por ter recebido, em 2015, Bashar al-Bashir, recusando-se a prendê-lo. Isso foi entendido como uma grave violação do Tratado de Roma, uma vez que o então presidente do Sudão havia sido internacionalmente condenado por genocídio por ter contribuído para a morte de cerca de 300 mil pessoas em Darfur.

Ano passado, durante a cúpula do BRICS, que foi sediada na África do Sul, o presidente do país também afirmou que não prenderia Vladimir Putin se ele decidisse participar do evento. Isso apesar de o autocrata russo também ter sido condenado pelo TPI por crimes contra a humanidade durante a atual guerra na Ucrânia. Ou seja, está claro que o país não tem um comprometimento real com os direitos humanos. Nesse sentido, o presidente brasileiro também exibe as próprias incoerências. Se, em 2003, Lula havia defendido o fortalecimento do TPI, meses atrás afirmou desconhecer o órgão e até mesmo considerar retirar o Brasil dele. Tudo isso para eximir o país da responsabilidade de prender Putin caso ele também decida vir ao país.

No caso sul-africano, o viés anti-Israel também é notório. O país demorou quase 10 dias para condenar o massacre do Hamas em 7 de outubro que resultou na morte de mais de 1.200 pessoas e no sequestro de outras 240, das quais cerca de 130 permanecem em cativeiro. Ainda assim, em 17 de outubro, a ministra das relações exteriores da África do Sul, Naledi Pandor, não teve problema em falar ao telefone com o líder do Hamas Ismail Haniyeh. Pretória mantém boas relações com o grupo terrorista há mais de duas décadas. Em 2015, parlamentares do país chegaram até mesmo a assinar um memorando de entendimento com o grupo terrorista.

Não é à toa que o Hamas agradeceu à África do Sul por ter levado a denúncia contra Israel à Corte Internacional de Justiça. Em nome de uma suposta luta contra a opressão, o que temos visto é uma verdadeira distorção do conceito de genocídio e o enfraquecimento das próprias instituições internacionais na tentativa de legitimar um grupo terrorista que não esconde seus intentos genocidas contra o povo judeu.

O termo genocídio foi formulado apenas em 1944 pelo judeu polonês Raphael Lemkin (1900-1959), a fim de descrever as atrocidades cometidas pelos nazistas durante o Holocausto. O objetivo, portanto, é descrever a destruição sistemática de parte ou todo um povo. Essa é a noção que guia a definição adotada pela Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio da ONU.

Um elemento central da definição não são os crimes em si que ela descreve, mas, sim, a intenção com a qual eles são cometidos. Para ser considerado como genocídio, é necessário que fique clara a "intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso". Levando esses critérios em consideração, portanto, não se pode afirmar que Israel cometa genocídio contra os palestinos, apesar das baixas civis. O que está em curso é uma guerra contra o Hamas, um grupo terrorista com objetivos abertamente genocidas e que representa uma ameaça para todos.

 


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postado em 19/01/2024 06:14 / atualizado em 19/01/2024 15:48
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