O Brasil vivia sob a opressão e a tirania da ditadura militar, à base de medidas discricionárias, após o golpe perpetrado em 31 de março de 1964. Nove meses depois, um grupo de artistas de diferentes gerações se junta para produzir e apresentar Opinião. O título do show iria dar nome ao teatro localizado no Shopping Copacabana — o primeiro inaugurado no Rio de Janeiro.
Nara Leão, cantora capixaba, da classe média alta, moradora da Avenida Atlântica, em Copacabana; Zé Kéti, cantor e compositor carioca, originário da periferia; João do Vale, cantor e compositor maranhense, radicado no Rio, eram os integrantes do elenco. Sob a direção de Augusto Boal, eles interpretavam canções de vários autores e faziam a narração de textos referentes à problemática social do país, assinados por Armando Costa, Oduvaldo Vianna Filho e Paulo Pontes.
Ao estrear em 11 de dezembro daquele ano, o Opinião conquistou enorme sucesso — com casa lotada durante vários meses —, tornou-se uma referência da chamada música de protesto e ganhou registro em álbum homônimo. Lançado em 1965, o LP passou a ser considerado um dos mais importantes da história da MPB. O repertório reúne 24 faixas, entre ritmos nordestinos, sambas, e composições que se caracterizavam pelo teor crítico das letras.
O xote Peba na pimenta é ouvido inicialmente. Seguem-se Partido alto, Desafio, Missa Agrária, O Favelado, Incelença, Deus e o Diabo na Terra do Sol (canção-tema do filme homônimo de Glauber Rocha), Cicatriz,Tiradentes, Guantanamera e Marcha da Quarta-Feira de Cinzas.
Mas a que passou a fazer parte do imaginário das pessoas foi Carcará, com letra cheia de significados, cujo refrão diz: "Carcará pega mata e come/Carcará não vai morrer de fome/ Carcará pega ,mata e come/ Carcará mais coragem do homem". Composta por João do Vale e José Cândido, virou um clássico instântaneo na voz de Maria Bethânia.
Jovem cantora baiana de Santo Amaro da Purificação, Bethânia dava início à trajetória de sucesso, ao substituir Nara Leão, que a descobrira, em Salvador, no musical Nós por exemplo, em que dividia o espaço cênico do icônico Teatro Vila Velha com o irmão Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Tom Zé.
Sessenta anos depois, a ditadura militar, de triste memória, voltará a ser fustigada pela recriação do Opinião, em nova montagem que, quinta e sexta-feira próximas, ocupará o palco do Sesc Vila Mariana, em São Paulo. Com direção de Jé Oliveira e dramaturgia de Mariana Nayor e Julian Boal, terá no elenco Paulo Tó, Xeina Barros, Xis, Alessandra Leão e a brasiliense Ellen Oléria.
Na torcida para que o Opinião saia em turnê e chegue a Brasília, ficamos na expectativa de que algo parecido com o nefasto movimento der 1964, fruto da conspiração de reacionários, não volte a ocorrer. Mas, mantenhamo-nos atentos, uma vez que, recentemente, uma tentativa de golpe militar foi esboçada e prontamente repudiada e contida — ainda bem, por decisiva ação do Supremo Tribunal Federal.
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