Universo feminino

Brasília aposta nas mulheres na política

Temos, sim, um quadro parlamentar feminino de excelência, mas, em termos quantitativos, esse número é pequeno. Por inúmeras vezes, essa lacuna foi cobrada, e jamais preenchida

;. -  (crédito: Lúcio Bernardo Jr./Agência Brasília)
;. - (crédito: Lúcio Bernardo Jr./Agência Brasília)
postado em 09/04/2024 06:00

José Natal*

Ao que parece, nada está totalmente perdido para Jair Messias Bolsonaro. Apenas o futuro. Inelegível, indiciado, atolado em processos, mal assessorado e ainda acreditando naquela imagem tosca e patética de que um dia foi mito, o capitão. Que não é ingênuo, também já sabe disso. Por isso, atuando nas sombras, articula, apoia e convoca os seus a botarem fichas nas inúmeras e articuladas mulheres que sinalizaram competência e habilidade na condução desse processo — de certa forma, em mais uma possível consolidação do seu legado.

Bem avaliado eleitoralmente em Brasília, e no Entorno, por vontade dele ou não, o nome e o legado do ex-presidente deram ainda mais força ao universo político feminino da comunidade. E elas estão aí, prontas para arregaçar as mangas num gesto que se apresenta como pioneiro, corajoso e desafiador. Primeiro, porque sabem que o preconceito machista e conservador, de imediato, surge como adversário maior. E, depois, porque o cenário político da capital da República sempre foi dominado por uma histórica atuação predominantemente masculina, basta recorrer aos arquivos para se comprovar essa verdade.

Pelo que se sabe, até o momento, o maior número de mulheres que se apresentam como possíveis candidatas está ligado aos partidos bolsonaristas, mas o PT também anuncia Erika Kokay como provável candidata a cargo majoritário, abrindo, aí, o debate saudável que todos nós queremos e torcemos para que, assim, aconteça.

Ao leitor menos atento ao cenário político de Brasília, vale lembrar que, embora estejamos comemorando 64 anos de existência como capital da República, não há na nossa história um quadro representativo feminino com a dimensão que o DF merece. Ou seja, temos, sim, um quadro parlamentar feminino de excelência, mas, em termos quantitativos, esse número é pequeno. Por inúmeras vezes, essa lacuna foi cobrada, e jamais preenchida. Há sinais evidentes de que a hora da mudança chegou. Aqui mesmo no Correio Braziliense, a analista política Ana Maria Campos, dias atrás, comentava que, numa fotografia de momento, pelo menos seis parlamentares filiadas a partidos importantes se manifestaram interessadas em disputar cargos majoritários em 2026. São elas: Celina Leão, pelo PP; Michele Bolsonaro e Bia Kicis, pelo PL; Damares Alves, pelo Republicanos; Paula Belmonte, pelo Cidadania; e, como já citamos, Erika Kokay, pelo PT.

Evidente o predomínio bolsonarista nesse anunciado protagonismo, fato, ao meu ver, menos importante, uma vez que o relevante para a cidade é a possível presença das mulheres no cenário parlamentar, providência esperada há anos e que, agora, parece que vai acontecer. Estamos ainda distantes de um próximo pleito eleitoral, uma vez que Brasília não participa de eleições municipais. Surge no horizonte uma razoável expectativa de que esse número de mulheres aumente, ganhe corpo e vontade de ocupar o parlamento e cargos relevantes na vida política da cidade. O bom senso, a sensibilidade, o afeto e o afago que geralmente predominam no comportamento feminino seriam bem-vindos a esse universo masculino competitivo, muitas vezes exagerado.

Pelo aspecto político propriamente dito, essa nova perspectiva de competição política pode trazer benefícios à comunidade. A começar pela nova leitura do quadro político e seus personagens. No momento atual, a leitura está clara. O governador Ibaneis Rocha tem céu de brigadeiro para eleger seu sucessor, e, a julgar pelo que prega hoje, Celina Leão será a candidata abençoada, quer ser sua sucessora.

O PT, eterno rival, terá que buscar um palanque bem apoiado por Lula para respirar e competir. As candidaturas de Bia Kicis, Damares Alves e, quem sabe, Michele Bolsonaro a qualquer cargo em Brasília significam um calo dolorido no sapato da família de PT e PMDB, em qualquer circunstância. Paula Belmonte, também competitiva, trabalha com o tempo e até que uma possível aliança melhore seu futuro como candidata. Recursos financeiros e abertura para o diálogo podem ajudar, e vão. Desenha-se, para o próximo pleito, uma eleição que, desde já, se anuncia como renovadora. Há um desgaste evidente no cenário atual, clama-se por mudança. Políticos bastante rodados pouco podem apresentar atrações que encantam plateias acostumadas ao mais do mesmo.

A se confirmar o novo cenário político na cidade, a presença das mulheres candidatas talvez seja a grande novidade a comemorar, independentemente da bandeira partidária que elas carreguem. O importante é que a classe política masculina tenha e assuma, com dignidade, essa nova etapa de um processo e aceite o fato de que o novo tempo chegou. Envie flores às mulheres, que sejam bem-vindas. Que façam campanhas, subam em palanques, visitem comunidades, conversem com o povo, comam pastel de feira, tomem chuva e, principalmente, sejam votadas. Eleição é voto, é urna, discurso, povo, ideias, pregação e liberdade de expressão. Com ética.

*Jornalista

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